REUNIÕES ESPÍRITAS (1/2)
As reuniões
espíritas* podem oferecer grandes vantagens, pois permitem o
esclarecimento, pela permuta de pensamentos, pelas perguntas e pelas observações
feitas por qualquer um, de que todos podem aproveitar-se.
Mas para obterem-se resultados desejáveis requerem condições especiais
que vamos examinar, porque seria errôneo tratá-las como reuniões das sociedades
comuns.
Aliás,
constituindo-se as reuniões em verdadeiros todos coletivos o que a elas
concerne é uma consequência natural das instruções individuais dadas
anteriormente. Devem elas tomar as mesmas precauções e
preservar-se das mesmas dificuldades referentes aos indivíduos. Foi por isso que deixamos este capítulo por último.
As reuniões
espíritas diferem muito quanto às suas características segundo os seus
propósitos. E por isso mesmo a sua constituição deve também diferir.
Segundo sua
natureza elas podem ser frívolas, experimentais ou instrutivas.
As reuniões frívolas constituem-se de pessoas que só
se interessam pelo aspecto de passatempo que elas podem oferecer através das
manifestações de Espíritos levianos, que gostam de se divertir nessas espécies
de reunião, pois nelas gozam de inteira liberdade. É nessas reuniões que se
costumam pedir as coisas mais banais, que se pedem aos Espíritos a predição do
futuro, que se experimentam a sua perspicácia para adivinhar a idade das
pessoas, o que elas trazem nos bolsos, revelar pequenos segredos e mil outras
coisas dessa importância. Essas
reuniões são inconsequentes, mas como os Espíritos levianos são às vezes
bastante inteligentes, e em geral bem humorados e joviais, acontecem
frequentemente coisas bastante curiosas, de que o observador pode tirar
proveito. Aquele que só tivesse presenciando essas sessões e julgasse o mundo
dos Espíritos segundo essa amostra teria dele uma ideia muito falsa, como a de
alguém que julgasse toda a população de uma grande cidade pela de alguns dos
seus bairros. O simples bom senso nos diz que os Espíritos elevados não podem
comparecer a reuniões dessa espécie, em que as pessoas presentes são tão
inconsequentes como as entidades manifestantes. Quem quiser se ocupar de coisas
fúteis deve naturalmente evocar Espíritos levianos, como numa reunião social chamariam
comediantes para se divertirem. Mas haveria profanação em convidar pessoas de
nomes veneráveis, misturando assim o sagrado com o profano.
As reuniões
experimentais têm mais particularmente por
finalidade a produção de manifestações físicas. Para muitas pessoas representam
um espetáculo mais curioso do que instrutivo. Os incrédulos saem delas mais
espantados do que convencidos, quando não tenham visto outra coisa, e se voltam
inteiramente para a procura de possíveis artifícios, porquanto, nada entendendo
do que viram supõem naturalmente a existência de truques. Acontece inteiramente
o contrário com os que estudaram o assunto. Estes compreendem de antemão a
possibilidade das ocorrências e os fatos positivos determinam assim a
consolidação de suas convicções. Por outro lado, se houvessem truques, eles
estariam em condições de descobri-los. Apesar
disso, essas espécies de experimentação têm uma utilidade que ninguém poderia
negar, pois foram elas que levaram à descoberta das leis que regem o mundo invisível,
e para muitas pessoas são ainda um poderoso motivo de convicção. Mas
sustentamos que elas não são suficientes para iniciar alguém na Ciência
espírita, pois que o simples fato de ver um mecanismo engenhoso não pode
dar o conhecimento da mecânica para quem não esteja informado das suas leis.
Contudo, se essas experiências fossem dirigidas com método e prudência
poderiam obter-se resultados bem melhores. Voltaremos logo a tratar deste
assunto.
As reuniões
instrutivas têm características
inteiramente diversas, e como é nelas que podemos obter o verdadeiro
ensinamento, insistiremos particularmente
nas condições em que devem realizar-se.
A primeira
de todas as condições é a de manterem a seriedade
em toda a acepção do termo. É necessário que todos estejam convencidos
de que os Espíritos a que desejam dirigir-se pertence a uma natureza especial,
que o sublime não podendo se misturar ao banal, nem o bem com o mal; se desejamos obter bons resultados é
necessário nos dirigirmos aos Espíritos bons.
Devemos,
como condição expressa, estar em situação favorável para que eles queiram
atender-nos. Ora, os Espíritos superiores não comparecem às reuniões de homens
levianos e superficiais, como não compareceriam quando estavam encarnados.
Uma sociedade não é verdadeiramente
séria se não se ocupar de assuntos úteis, com exclusão de todos os outros.
Se ela
deseja obter fenômenos extraordinários por curiosidade ou passatempo, os
Espíritos que os produzem poderão comparecer, mas os outros se afastarão. Numa
palavra, conforme o caráter da reunião ela sempre encontrará Espíritos
dispostos a atender às suas tendências. Uma reunião séria afasta-se da sua
finalidade se troca o ensinamento pelo divertimento. As manifestações físicas
têm a sua utilidade, como já dissemos.
Aqueles que desejam ver devem participar de reuniões experimentais, e
os que desejam compreender devem dirigir-se a reuniões de estudos.
É assim que
uns e outros poderão completar a sua instrução espírita, como no estudo da
medicina uns vão aos cursos e outros à clínica.
A instrução espírita não compreende somente o ensino moral dado pelos
Espíritos, mas também o estudo dos fatos. Abrange a teoria dos fenômenos, a pesquisa das
causas, e como consequência a constatação do que é possível e do que não é, ou
seja: a observação de tudo quanto possa fazer que a ciência se desenvolva.
Seria errôneo acreditar que os fatos estejam limitados aos fenômenos
extraordinários, que os que tocam principalmente os sentidos sejam os únicos
dignos de atenção. Encontram-se a cada passo fatos importantes nas comunicações
inteligentes, que as pessoas reunidas para o estudo não poderiam negligenciar.
Esses fatos, que seria impossível enumerar, surge de numerosas circunstâncias
fortuitas. Embora menos gritantes, não são, de menor interesse para o
observador que neles encontra a confirmação de um principio conhecido ou a
revelação de um novo princípio, que o leva a penetrar mais fundo nos mistérios
do mundo invisível. Nisso há também filosofia.
As reuniões
de estudo são ainda de grande utilidade para os médiuns de manifestações
inteligentes, sobretudo para os que desejam seriamente aperfeiçoar-se e por
isso mesmo não comparecem a elas com a tola presunção da infalibilidade.
Uma das grandes dificuldades da prática
mediúnica, como já dissemos, encontra-se na obsessão e na fascinação.
Eles
poderiam, pois, iludir-se de muito boa fé quanto ao mérito das comunicações
obtidas. Compreende-se que os Espíritos enganados rés encontram caminho aberto
quando lidam com a pessoa ignorara do assunto.
É por isso
que procura afastar o médium de todo o controle, chegando mesmo, quando
necessário, a fazê-lo tomar aversão quem quer que possa esclarecê-lo. Graças ao isolamento e à fascinação,
podem facilmente levá-lo a aceitar tudo o que quiserem.
Nunca
repetiríamos demasiado: aí está não somente uma dificuldade, mas um perigo.
Sim, podemos dizê-lo, um verdadeiro perigo. O único meio de escapar a ele é
submeter-se o médium ao controle de pessoas desinteressadas e bondosas que,
julgando as comunicações com frieza e imparcialidade, possam abrir-lhe os olhos
e levá-lo a perceber o que não pode ver por si mesmo.
Ora, todo
médium que teme esse julgamento já se encontra no caminho da obsessão. Aquele que pensa que a luz só foi feita para ele já
está completamente subjugo. Leva-se a mal as observações
e as repele, irritando-se com elas, há dúvida quanto à natureza má do Espírito
que o assiste.
Já dissemos
que um médium pode carecer dos conhecimentos necessários para compreender os
erros, que pode se deixar enganar pelas palavras bonitas e pela linguagem
pretensiosa, deixando-se seduzir pelos sofismas, tudo isso na maior boa fé. Eis
porque, na falta de suas próprias luzes, deve modestamente recorrer às luzes
dos outros, segundo os ditados populares de que quatro olhos veem melhor do que
dois e de que ninguém é um bom juiz em causa própria.
É desse
ponto de vista que as reuniões são de grande utilidade para o médium, se ele for bastante sensato para ouvir os
conselhos, porque nelas se encontram pessoas mais esclarecidas do que
ele, capazes de perceber os matizes frequentemente muito delicados, pelos quais
o Espírito revela a sua inferioridade.
Todo médium
que sinceramente não queira se transformar em instrumento da mentira deve
procurar produzir nas reuniões sérias, levando para elas o que tiver obtido em
particular. Deve aceitar com reconhecimento, e até mesmo solicitar o exame crítico das comunicações. Se estiver
assediado por Espíritos enganadores será esse o meio mais seguro de se livrar
deles, provando-lhes que não o podem enganar.
Aliás, o
médium que se irrita com a crítica, tanto menos razão tem para isso quanto o
seu amor-próprio não está envolvido no assunto, pois se o que escreve não é
dele, ao ler a má comunicação a sua responsabilidade é semelhante à de quem
lesse os versos de um mau poeta.
Insistimos nesse ponto porque se é ele um tropeço para os médiuns,
também o é para as reuniões que não devem confiar levianamente em todos os
intérpretes dos Espíritos.
O concurso
de qualquer médium obsedado ou fascinado lhes seria mais prejudicial do que
útil. Elas não devem aceitá-lo. Julgamos já haver desenvolvido o suficiente
para mostrar-lhes que não pode enganar-se quanto às características da
obsessão, se o médium não for capaz de reconhecê-la por si mesmo. Uma das mais evidentes é sem dúvida a
pretensão de estar sozinho com a razão, contra todos os demais. Os médiuns obsedados
que não querem reconhecer a sua situação assemelham-se a esses doentes que se
iludem quanto à saúde, perdendo-se por não se submeterem ao regime necessário.
O que uma reunião séria deve se propor como objetivo é
livrar-se dos Espíritos mentirosos. Ela estaria em erro ao considerar-se livre
deles tão somente pela sua finalidade e pela qualidade dos seus médiuns. Só o
conseguirá quando houver criado para si mesma as condições favoráveis.
Para bem
compreender o que se passa nestas circunstâncias remetemos o leitor ao que
dissemos atrás, no n° 231 (do livro dos
Médiuns), sobre a influência do meio. É necessário representar cada indivíduo como
cercado por certo número de companheiros invisíveis que se identificam com o
seu caráter, os seus gostos e as suas tendências. Assim, toda pessoa que
entra numa reunião leva consigo os Espíritos que lhe são simpáticos.
Segundo o
seu número e a sua natureza, esses companheiros podem exercer sobre a reunião e
sobre as comunicações uma influência boa ou má. Uma reunião perfeita seria
aquela em que todos os membros, animados do mesmo amor pelo bem, só levassem
consigo Espíritos bons. Na falta da perfeição, a melhor reunião será aquela em
que o bem supere o mal. Tudo isso é muito lógico para que seja necessário
insistir.
Uma reunião
é um ser coletivo cujas qualidades e propriedades são a soma de todas as dos
seus membros, formando uma espécie de feixe. Ora, esse feixe será tanto mais
forte quanto mais homogêneo. Se ficou bem compreendido o que foi dito no n° 282
pergunta 5 (do livro dos Médiuns) , sobre a maneira porque os Espíritos são avisados
quando os chamamos, será fácil entender o poder de associação de pensamento dos
assistentes. Se o Espírito for de qualquer maneira atingido pelo pensamento,
como nós somos pela voz, vinte pessoas unidas numa mesma intenção terão
necessariamente mais força que uma só. Mas para que todos os pensamentos
concorram para o mesmo fim é necessário que vibrem em uníssono, que se
confunda por assim dizerem um só, o que não pode se dar sem concentração.
Por outro lado,
o Espírito, chegando a um meio que lhe é inteiramente simpático, sente-se mais
à vontade. Só encontrando amigos, comparece de boa vontade e mais disposto a
responder. Quem quer que tenha seguido com alguma atenção as manifestações
espíritas inteligentes pode certamente se convencer desta verdade. Se os
pensamentos forem divergentes, provocam um entrechoque de ideias desagradam
para o Espírito e, portanto prejudicial à manifestação. Acontece o mesmo com um
homem que deve falar numa reunião. Se sentir que todos os pensamentos lhe são
simpáticos e favoráveis, a impressão que recebe age sobre as suas ideias e lhe
dá maior vivacidade. A unanimidade dessa influência exerce sobre ele uma
espécie de ação magnética que decuplica os recursos, enquanto a indiferença ou
a hostilidade o perturbam e paralisam. É assim que os afores sentem-se
eletrizados pelos aplausos. Ora, sendo os Espíritos bem mais impressionáveis
que os homens, devem sofrer muito mais a influência do meio.
Toda reunião espírita deve, pois procurar a maior homogeneidade
possível. Falamos bem entendido, das que desejam chegara resultados sérios e
verdadeiramente úteis. Se simplesmente se quer obter quaisquer comunicações,
não se importando com a qualidade, é evidente que todas essas precauções não são
necessárias. Mas então não e deve lamentar a qualidade do produto.
A
concentração e a comunhão de pensamentos sendo as condições necessárias de toda
reunião séria, compreende-se que o grande número de assistentes é uma das
causas mais contrárias à homogeneidade. Não há, é certo, nenhum limite absoluto
para esse número. Compreende-se que cem pessoas, suficientemente concentradas e
atentas, estarão em melhores condições do que dez pessoas distraídas e
barulhentas. Mas é também evidente que quanto maior os números mais
dificilmente se preenchem essas condições. É, aliás, um fato provado pela
experiência que os pequenos círculos íntimos são
sempre mais favoráveis às boas comunicações, e isso pelos motivos que
expusemos.
Outra
exigência não menos necessária é a da regularidade das sessões. Em todas sempre
encontramos Espíritos que poderíamos chamar de frequentadores habituais, mas não nos referimos a esses
Espíritos que estão por toda parte e em tudo se intrometem. Falamos dos
Espíritos protetores ou dos que são mais frequentemente evocados. Não se pense
que esses Espíritos nada mais tenham a fazer do que nos dar atenção. Eles têm
as suas ocupações e podem às vezes encontrar-se em condições desfavoráveis à
evocação.
Quando as
reuniões se realizam em dias e horas fixos, eles se colocam à disposição nesses
momentos e raramente faltam. Há mesmo os que levam a pontualidade ao excesso.
Ofendem-se com o atraso de um quarto de hora, e se foram eles que marcaram uma
reunião será inútil iniciá-la alguns minutos antes.
Mas
acentuemos que embora os Espíritos pretiram a regularidade, os verdadeiramente
superiores não são tão meticulosos. A exigência de rigorosa pontualidade é
sinal de inferioridade, como tudo o que é pueril. Mesmo fora das horas marcadas
eles podem comparecer, e na verdade comparecem espontaneamente quando a
finalidade é útil. Nada, entretanto, é mais prejudicial à recepção de boas
comunicações do que evocá-los a torto e a direito, por simples capricho ou sem
um motivo sério. Como não estão sujeitos aos nossos caprichos, poderiam não nos
atender. Sobretudo nessas ocasiões que outros podem tornar-lhes o lugar e o
nome.
Livro dos
Médiuns, Allan Kardec. Editora LAKE -
Cap. 29 itens 324 até 333
* Hoje
são denominadas no Movimento Espírita como – Reunião Mediúnica – Nota do customizador.