sábado, 28 de março de 2020

A NOVA ERA - Erasto, Discípulo de São Paulo


A NOVA ERA[1]
Erasto, Discípulo de São Paulo
Paris, 1863
Santo Agostinho é um dos maiores divulgadores do Espiritismo. Ele se manifesta por quase toda parte, e a razão disso a encontramos na vida desse grande filósofo cristão.
Pertence a essa vigorosa falange dos Pais da Igreja, a que a Cristandade deve as suas mais sólidas bases. Como muitos, ele foi arrancado ao paganismo, ou melhor, diremos, a mais profunda impiedade, pelo clarão da verdade.
Quando, em meio de seus desregramentos, ele sentiu na própria alma a estranha vibração que o chamava para si mesmo e lhe fez compreender que a felicidade não estava nos prazeres enervantes e fugidios; quando, enfim, na sua Estrada de Damasco, ele também ouviu a santa voz que lhe clamava: "Saulo, Saulo, por que me persegues?"
Exclamou: "Meu Deus! Meu Deus perdoa-me, eu creio, sou cristão!"
E desde então se tornou um dos mais firmes pilares do Evangelho.
Podemos ler, nas notáveis confissões desse eminente Espírito, as palavras características e proféticas, ao mesmo tempo, que ele pronunciou ao ter perdido Santa Mônica: "Estou certo de que minha mãe virá visitar-me e dar-me os seus conselhos, revelando-me o que nos espera na vida futura".
Que lição nestas palavras, e que brilhante previsão da futura doutrina!
É por isso que hoje, vendo chegada a hora de divulgação da verdade, que ele já havia pressentido, faz-se o seu ardente propagador, e se multiplica, por assim dizer para atender a todos os que o chamam.














NOTA - Santo Agostinho vem, por acaso, modificar aquilo que ensinou? Não, seguramente, mas como tantos outros, ele vê com os olhos do espírito o que não podia ver como homem. Sua alma liberta percebe claridades novas, e compreende-o que antes não compreendia. Novas idéias lhe revelaram o verdadeiro sentido de certas palavras. Quando na terra, julgava as coisas segundo os conhecimentos que possuía; mas, quando uma nova luz se fez para ele, pode julgá-las com maior clareza. É assim que ele deve revisar sua crença referente aos espíritos íncubos súcubos, bem como o anátema que havia lançado contra a teoria dos antípodas. Agora, que o Cristianismo lhe aparece em toda a sua pureza, ele pode, sobre certos pontos, pensar de maneira diversa de quando vivia, sem deixar de ser o apóstolo: cristão. Pode, sem renegar a sua fé, fazer-se o propagador do Espiritismo, porque nele vê o cumprimento das predições. Ao proclamá-lo, hoje, nada mais faz do que conduzir-nos a uma interpretação mais sã e mais lógica dos textos. Assim também acontece com outros Espíritos, que se encontram numa posição semelhante.


[1] Fonte: Livro – Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec, Tradução de J. Herculano Pires, LAKE - Livraria Allan Kardec Editora, Cap. 1 item 11

A NOVA ERA - Fenelon


A NOVA ERA[1]
Fénelon
Poitiers, 1861
Um dia, Deus em sua inesgotável caridade, permitiu ao homem ver a verdade através das trevas.
Esse dia foi o do advento de Cristo. Depois do vivo clarão, porém, as trevas se fecharam de novo.
O mundo, após alternativas de verdade e obscuridade, novamente se perdia. Então, semelhantes aos profetas do Antigo Testamento, os Espíritos começaram a falar e a vos advertir. O mundo foi abalado nas suas bases: o trovão ribombará; sede firmes!
O Espiritismo é de ordem divina, pois repousa sobre as próprias leis da natureza. E crede que tudo o que é de ordem divina tem um objetivo elevado e útil.
Vosso mundo se perdia. A ciência, desenvolvida com o sacrifício dos interesses morais, vos conduzia unicamente ao bem-estar material, revertendo-se em proveito do espírito das trevas. Vós o sabeis cristão: o coração e o amor devem marchar unidos à ciência. O Reino do Cristo, ai de nós!
Após dezoito séculos, e apesar do sangue de tantos mártires, ainda não chegou. Cristãos, voltai para o Mestre que vos quer salvar. Tudo é fácil para aquele que crê e que ama: o amor o enche de gozo inefável. Sim, meus filhos, o mundo está abalado.
Os bons Espíritos vo-lo dizem sempre. Curvai-vos sob o sopro precursor da tempestade, para não serdes derrubados. Quero dizer: preparai-vos e não vos assemelheis às virgens loucas, que foram apanhadas desprevenidas à chegada do esposo.
A revolução que se prepara é mais moral do que material.
Os grandes Espíritos, mensageiros divinos, insuflam a fé, para que todos vós, obreiros esclarecidos e ardentes, façais ouvir vossa humilde voz. Porque vós sois o grão de areia, mas sem os grãos de areia não haveria montanhas.
Assim, portanto, que estas palavras: "Nós somos pequenos", não tenha sentido para vós. A cada um a sua missão, a cada um o seu trabalho.
A formiga não constrói o seu formigueiro, e animaizinhos insignificantes não formam continentes?
A nova cruzada começou: apóstolos da paz universal, e não da guerra, modernos São Bernardo, olhai para frente e marchai!
A lei dos mundos é a lei do progresso.


[1] Fonte: Livro – Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec, Tradução de J. Herculano Pires, LAKE - Livraria Allan Kardec Editora, Cap. 1 item 10

A NOVA ERA - Um Espírito Israelita


A NOVA ERA[1]
Um Espírito Israelita
Mulhouse, 1861
Deus é único, e Moisés o Espírito que Deus enviou com a missão de fazê-lo conhecer, não somente pelos hebreus, mas também pelos povos pagãos. O povo hebreu foi o instrumento de que Deus se serviu para fazer sua revelação, através de Moisés e dos Profetas, e as vicissitudes da vida desse povo foram feitas para chocar os homens e arrancar-lhes dos olhos o véu que lhes ocultava a divindade.
Os mandamentos de Deus, dados por Moisés, trazem o germe da mais ampla moral cristã. Os comentários da Bíblia reduziam-lhes: o sentido, porque, postos em ação em toda a sua pureza, não seriam então compreendidos. Mas os Dez Mandamentos de Deus nem por isso deixaram de ser o brilhante frontispício da obra, como um farol que devia iluminar para a humanidade o caminho a percorrer.
A moral ensinada por Moisés era apropriada ao estado de adiantamento em que se encontram os povos chamados à regeneração. E esses povos, semi-selvagens quanto ao aperfeiçoamento espiritual, não teriam compreendido a adoração de Deus sem os holocaustos ou sacrifícios, nem que se pudesse perdoar a um inimigo.
Sua inteligência, notável no tocante às coisas materiais, e mesmo em relação às artes e às ciências, estava muito atrasada em moralidade, e eles não se submeteriam ao domínio de uma religião inteiramente espiritual. Necessitavam de uma representação semi-material, como a que então lhes oferecia a religião hebraica. Os sacrifícios, pois, lhes falavam aos sentidos, enquanto a ideia de Deus lhes falava ao espírito.
O Cristo foi o iniciador da mais pura moral, a mais sublime: a moral evangélica, cristã, que deve renovar o mundo, aproximar os homens e torná-los fraternos; que deve fazer jorrar de todos os corações humanos a caridade e o amor do próximo, e criar entre todos os homens uma solidariedade comum. Uma moral, enfim, que deve transformar a terra, fazê-la morada de Espíritos superiores aos que hoje a habitam. É a lei do progresso, a que a natureza está sujeita que se cumpre, e o Espiritismo é a alavanca de que Deus se serve para elevar a humanidade.
São chegados os tempos em que suas idéias morais devem desenvolver-se, para que se realizem os progressos que estão nos desígnios de Deus. Elas devem seguir o mesmo roteiro que as idéias de liberdade seguiram como suas precursoras. Mas não se pense que esse desenvolvimento se fará sem lutas. Não, porque elas necessitam, para chegar ao amadurecimento, de agitações e discussões, a fim de atraírem a atenção das massas.
Uma vez despertada a atenção, a beleza e a santidade da moral tocarão os Espíritos, e eles se dedicarão a uma ciência que lhes traz a chave da vida futura e lhe abre a porta da felicidade eterna.
Foi Moisés quem abriu o caminho; Jesus continuou a obra; o Espiritismo a concluirá.



[1] Fonte: Livro – Evangelho Segundo o Espiritismo, Allan Kardec, Tradução de J. Herculano Pires, LAKE - Livraria Allan Kardec Editora, Cap. 1 item 9,

Estudando Missionário da Luz - A oração


A  ORAÇÃO[1]
Após separar-se da genitora e da irmã, dispôs-se o rapaz a tomar o caminho da residência que lhe era própria.
Seguimo-lo de perto. Doía-me identificar-lhe a posição de vítima, cercado pelas duas formas escuras.
As observações referentes à microbiologia psíquica impressionavam-me fortemente.
Conhecia, de perto, as alterações circulatórias, determinando a embolia, o infarto, à gangrena. Tratara, noutro tempo, inúmeros casos de infecção, através de artrites e miosites, úlceras gástricas e abscessos miliares. Examinara, atenciosamente, no campo médico, as manifestações do câncer, dos tumores malignos, em complicados processos patológicos. Vira múltiplas expressões microbianas, no tratamento da lepra, da sífilis, da tuberculose. Muitas vezes, na qualidade de defensor da vida, permaneceram longos dias em duelo com a morte, sentindo a inutilidade de minha técnica profissional no ataque aos vírus estranhos que apressavam a destruição orgânica, zombando-me dos esforços. Na qualidade de médico, entretanto, na maioria dos casos, quando podia contar ainda com a prodigiosa intervenção da Natureza, mantinha a presunção de conhecer variadas normas de combate, em diversas direções. No diagnóstico da difteria, não vacilava na aplicação do soro de Roux e conhecia o valor da operação de traqueotomia no crupe declarado.
Nas congestões, não me esqueceria de intensificar a circulação.
Nos eczemas, lembraria, sem dúvida, os banhos de amido, as pomadas à base de bismuto e a medicação arsenical e sulfurosa.
Positivando o edema, recordaria a veratrina, o calomelano, a cafeína e a teobromina, depois de analisar, detalhadamente, os sintomas. No câncer, praticaria a intervenção cirúrgica, se os raios X não demonstrassem a eficiência precisa. Para todos os sintomas, saberia utilizar regimes e dietas, aplicações diversas, isolamentos e intervenções, mas... E ali?
À nossa frente, caminhava um enfermo diverso. Sua diagnose era diferente. Escapava ao meu conhecimento dos sintomas e aos meus antigos métodos de curar. No entanto, era paciente em condições muito graves. Viam-se-lhe os parasitos escuros. Observava-se-lhe a desesperação intima, em face do assédio incessante.
Não haveria remédio para ele? Estaria abandonado e era mais infeliz que os doentes do mundo? Que fazer para aliviar-lhe as dores terríveis, a se manifestarem à maneira de angustiosas e permanentes inquietações? Já havia atendido a entidades perturbadas e sofredoras, balsamizando-lhes padecimentos atrozes. Não ignorava os esforços constantes de nossa colônia espiritual, a fim de atenuar sofrimentos dos desencarnados de ordem inferior, mas, ali, em virtude da contribuição magnética de Alexandre, o grande e generoso instrutor que me seguia, observava um companheiro encarnado, presa de singulares viciações.
Por que fatores ministrar o socorro indispensável?
E, naturalmente, novas reflexões ocorriam-me céleres.
Semelhantes expressões microbianas acompanhariam os desencarnados?
Atacariam a alma, fora da carne? Quando me debatia em amarguras inexprimíveis, nas zonas inferiores, certo havia sido vítima das mesmas influenciações cruéis.
Todavia, onde o remédio salutar?
Onde o alívio para tamanhas angústias?
Revelando paternal interesse, Alexandre veio em meu socorro, esclarecendo:
- Estas interrogações íntimas, André, são portadoras de grande bem para o seu coração. Começa a observar as manifestações do vampirismo, as quais não se circunscrevem ao ambiente dos encarnados. Quase que a totalidade de sofrimentos nas zonas inferiores, deve a ela sua dolorosa origem. Criaturas desviadas da verdade e do bem, nos longos caminhos evolutivos, reúnem-se umas às outras, para a continuidade das permutas magnéticas de baixa classe. Os criminosos de vários matizes, os fracos da vontade, os aleijados do caráter, os doentes voluntários, os teimosos e recalcitrantes de todas as situações e de todos os tempos integram comunidades de sofredores e penitentes do mesmo padrão, arrastando-se, pesadamente, nas regiões invisíveis ao olhar humano.
Todos eles segregam forças detestáveis e criam formas horripilantes, porque toda matéria mental está revestida de força plasmadora e exteriorizante.
- Mas - objetei - sinto que o campo médico é muito maior, depois da morte do corpo.
- Sem dúvida - redargüiu meu interlocutor, sereno -, quando compreendermos a extensão dos ascendentes morais em todos os acontecimentos da vida.
- Entretanto - considerei - horrorizam-me as novas descobertas na região microbiana. Que fazer contra o vampirismo?
Como lutar com as forças mentais degradantes?
No mundo, temos a clínica especializada, a técnica cirúrgica, os antídotos de vários sistemas curativos. Mas aqui?
Alexandre sorriu pensativo, e falou, depois de pausa mais longa:
- Conforme verificamos, André, o tratamento remoto nos templos, a ascendência da fé nos processos de Medicina, nos séculos passados, e a concepção de que as entidades diabólicas provocam as mais estranhas enfermidades no homem, não são integralmente destituídas de razão. Indubitavelmente, entre os Espíritos encarnados, as expressões mentais dependem do equilíbrio do corpo, assim como a boa e perfeita música depende do instrumento fiel. Mas a ciência médica atingirá culminâncias sublimes quando verificar no corpo transitório a sombra da alma eterna. Cada célula física é instrumento de determinada vibração mental. Todos somos herdeiros do Pai que cria, conserva, aperfeiçoa, transforma ou destrói e, diariamente, como nosso potencial gerador de energias latentes, estamos criando, renovando, aprimorando ou destruindo alguma coisa. Justifico a surpresa de seus raciocínios ante a paisagem nova que se desdobra à sua vista. A luta do aperfeiçoamento é vastíssima. Quanto ao combate sistemático ao vampirismo, nas múltiplas moléstias da alma, aqui também, no plano de nossas atividades, não faltam processos saneadores e curativos de natureza exterior; no entanto, examinando o assunto na essência, somos compelidos a reconhecer que cada filho de Deus deve ser o médico de si mesmo e, até à plena aceitação desta verdade com as aplicações de seus princípios, a criatura estará sujeita a incessantes desequilíbrios.
Entendendo-me a estranheza, Alexandre indicou o rapaz que se dispunha a penetrar o reduto doméstico, depois de pequeno percurso a pé, e falou:
- Há diversos processos de medicação espiritual contra o vampirismo, os quais poderemos desenvolver em direções diversas; mas, para fornecer a você uma demonstração prática, visitemos o lar de nosso amigo. Conhecerá o mais poderoso antídoto.
Curioso, observei que as entidades infelizes mostravam-se, agora, terrivelmente contrafeitas. Alguma coisa impedia-lhes acompanhar a vítima ao interior.
- Naturalmente - acentuou meu generoso companheiro – você já sabe que a prece traça fronteiras vibratórias.
Sim, já observara experiências dessa ordem.
- Aqui - prosseguiu ele - reside uma irmã que tem a felicidade de cultivar a oração fervorosa e reta.
Entramos. E, enquanto o amigo encarnado se preparava a recolher, Alexandre explicava-me o motivo da sublime paz reinante entre as paredes humildes.
- O lar - disse - não é somente a moradia' dos corpos, mas, acima de tudo, a residência das almas. O santuário doméstico que encontre criaturas amantes da oração e dos sentimentos elevados converte-se em campo sublime das mais belas florações e colheitas espirituais. Nosso amigo não se equilibrou ainda nas bases legítimas da vida, depois de extremas vacilações e levianas experiências da primeira mocidade; no entanto, sua companheira, mulher jovem e cristã, garante-Lhe a casa tranqüila, com a sua presença, pela abundante e permanente emissão de forças purificadoras e luminosas, de que o seu Espírito se nutre.
Achava-me eminentemente surpreendido. De fato, a tranqüilidade interior era grande e confortadora. Em cada ângulo das paredes e em cada objeto isolado havia vibrações de paz inalterável.
O rapaz, agora, penetrava o aposento modesto, naturalmente disposto ao descanso noturno.
Alexandre tomou-me a destra, paternalmente, encaminhou-se até a porta, que se fechara sem estrépito, e bateu, de leve, como se estivéssemos ante um santuário que não devíamos penetrar sem religioso respeito.
Uma senhora muito jovem, em quem percebi imediatamente a esposa de nosso companheiro, desligada do corpo físico, em momentos de sono, veio atender e saudou o instrutor afetuosamente.
Após cumprimentar-me, graças à apresentação de Alexandre, exclamou jovial:
- Agradeço a Deus a possibilidade de orarmos juntos. Entrem.
Desejo transformar nossa casa no templo vivo de Nosso Senhor.
Ingressamos no aposento íntimo e, de minha parte, mal continha a surpresa da situação. Nesse mesmo instante, punha-se o rapaz entre os lençóis, com evidente cuidado para não despertar a esposa adormecida. Contemplei o quadro formoso e santificante.
Rodeava-se o leito de intensa luminosidade. Observei os fios tenuíssimos de energia magnética, ligando a alma de nossa nobre amiga à sua forma física, placidamente recostada.
- Desculpem-me - disse bondosa, fixando o olhar no instrutor -, preciso atender agora aos meus deveres imediatos.
- Esteja à vontade, Cecília! - falou o orientador com a ternura dum pai que abençoa - passamos aqui tão-só para visitá-la.
Cecília beijou-lhe as mãos e rogou:
- Não se esqueça de deixar-nos os seus benefícios.
Alexandre sorriu em silêncio e, por alguns minutos, manteve-se em meditação mais profunda.
E enquanto ele se mantinha insulado em si mesmo, eu observava a delicada cena: A esposa, desligada do corpo, sentou-se à cabeceira e, no mesmo instante, o rapaz como se estivesse ajeitando os travesseiros descansou a cabeça em seu regaço espiritual.
Cecília, acariciando-lhe a cabeleira com as mãos, elevava os olhos ao Alto, revelando-se em fervorosa prece. Luzes sublimes cercavam-na toda; e eu podia sintonizar com as suas expressões mais íntimas, ouvindo-lhe a rogativa pela iluminação do companheiro a quem parecia amar infinitamente. Comovido com a beleza de suas súplicas, reparei com assombro que o coração se lhe transformava num foco ardente de luz, do qual saíam inúmeras partículas resplandecentes, projetando-se sobre o corpo e sobre a alma do esposo com a celeridade de minúsculos raios. Os corpúsculos radiosos penetravam-Lhe o organismo em todas as direções e, muito particularmente, na zona do sexo, onde identificara tão grandes anomalias psíquicas, concentravam-se em massa, destruindo as pequenas formas escuras e horripilantes do vampirismo devorador.
Os elementos mortíferos, no entanto, não permaneciam inativos.
Lutavam desesperados, com os agentes da luz. O rapaz, como se houvera atingido um oásis, perdera a expressão de angustioso cansaço. Demonstrava-se calmo e, gradativamente, cada vez mais forte e feliz, no momento em curso. Restaurado em suas energias essenciais, enlaçou devagarzinho a esposa amorosa que se conservava maternalmente ao seu lado e adormeceu jubiloso.
A cena íntima era maravilhosamente bela aos meus olhos.
Dispunha-me a pedir explicações, quando o instrutor me chamou delicadamente, encaminhando-me ao exterior. Fora do quarto, falou-me paternalmente:
- Já observou quanto devia. Agora, poderá extrair as próprias ilações.
- Sim - retruquei -; estou assombrado com o que vi; no entanto, estimaria ouvi-lo em considerações esclarecedoras.
- Não tenha dúvida - prosseguiu o orientador -, a oração é o mais eficiente antídoto do vampirismo. A prece não é movimento mecânico de lábios, nem disco de fácil repetição no aparelho da mente. É vibração, energia, poder. A criatura que ora, mobilizando as próprias forças, realiza trabalhos de inexprimível significação.
Semelhante estado psíquico descortina forças ignoradas, revela a nossa origem divina e coloca-nos em contacto com as fontes superiores. Dentro dessa realização, o Espírito, em qual quer forma, pode emitir raios de espantoso poder.
Após breve intervalo, Alexandre considerou, imprimindo mais força ao ensinamento:
- E você não pode ignorar que as próprias formas inferiores da Terra se alimentam quase que integralmente de raios.
Descem sobre a fronte humana, em cada minuto, bilhões de raios cósmicos, oriundos de estrelas e planetas amplamente distanciados da Terra, sem nos referirmos aos raios solares, caloríficos e luminosos, que a ciência terrestre mal começa a conhecer.
Os raios gama, provenientes do elemento rádio que se desintegra incessantemente no solo, e os de várias expressões emitidos pela água e pelos metais, alcançam os habitantes da Terra pelos pés, determinando consideráveis influenciações.
E, em sentido horizontal, experimenta o homem a atuação dos raios magnéticos exteriorizados pelos vegetais, pelos irracionais e pelos próprios semelhantes.
A admiração impusera-me silêncio, mas o orientador prosseguiu, após ligeiro intervalo:
- E as emanações de natureza psíquica que envolve a Humanidade, provenientes das colônias de seres desencarnados que rodeiam a Terra?
Em cada segundo, André, cada um de nós recebe trilhões de raios de vária ordem e emitimos forças que nos são peculiares e que vão atuar no plano da vida, por vezes em regiões muitíssimo afastadas de nós. Nesse círculo de permuta incessante, os raios divinos, expedidos pela oração santificadora, convertem-se em fatores adiantados de cooperação eficiente e definitiva na cura do corpo, na renovação da alma e iluminação da consciência.
Toda prece elevada é manancial de magnetismo criador e vivificante e toda criatura que cultiva a oração, como devido equilíbrio do sentimento, transforma-se, gradativamente, em foco irradiante de energias da Divindade.
As elucidações do instrutor calaram-me profundamente no ser. Desejando, contudo, certificar-me quanto a outro pormenor da sublime experiência, interroguei:
- Bastará, porém, o recurso da esposa para que o nosso doente restaure o equilíbrio psíquico?
Alexandre sorriu e respondeu:
- O socorro de Cecília é valioso para o companheiro, mas o potencial de emissão divina pertence a ela, como fruto incorruptível dos seus esforços individuais. Significa para ele o “acréscimo de misericórdia” que deverá anexar, em definitivo, ao patrimônio de sua personalidade, através do trabalho próprio.
Receber o auxílio do bem não quer dizer que o beneficiado seja bom.
Nosso amigo precisa devotar-se, com fervor, ao aproveitamento das bênçãos que recebe, porque, inegavelmente, toda cooperação exterior pode ser interrompida e cada filho de Deus é herdeiro de possibilidades sublimes e deve funcionar como médico vigilante de si mesmo.




[1] Fonte: Missionário da Luz, Ditado pelo Espírito André Luiz, psicografia de Francisco Cândido Xavier, Editora FEB, Capitulo 6

sábado, 21 de março de 2020

AMOR E CONCILIAÇÃO


AMOR E CONCILIAÇÃO[1]
(Re)conciliação é momento de amor no desenvolvimento dos elevados valores da vida.
 A existência física de todos os indivíduos é assinalada por sofrimentos e lutas que não cessam. Sai-se de um estágio difícil e inicia-se outro, defrontando-se novas formas de experiências, nas quais o desalento e a dificuldade parecem unir-se para obstaculizar a marcha do viandante.
Aqui é alguém que deserta da companhia, ali é a trama da ignorância travestida de perversidade, conspirando contra a paz, mais adiante é a infâmia urdindo dissabores sem conto. E o viajante do carreiro carnal, também desestruturado emocionalmente e sem os requisitos espirituais para compreender as ocorrências necessárias, acumula amarguras e decepções, que se transformam em ressentimentos e ódios perturbadores.
Ignorando a legitimidade do amor, por não o haver ainda vivenciado, acredita que qualquer tentativa de insculpi-lo no íntimo redundará inútil, senão perniciosa, em razão de, aparentemente, não haver campo para a sua vigência.
Acumulando fel e desar, quem assim se comporta recua ante as possibilidades de expressar afeto, desconfiando das manifestações dessa natureza que lhe são direcionadas.
Sem dar-se conta torna-se pessimista, em relação às demais pessoas, à sociedade, à vida, tornando-se amargo e desinteressado de relacionamentos mais profundos, receando experimentar sofrimentos mais graves.
O amor, no entanto, é poderoso elixir de longa vida, que restitui as energias gastas e as esperanças fanadas.
Os acontecimentos nefastos que são relacionados, de forma alguma defluem da sua natureza, sendo antes fruto do primarismo do sentimento humano que se apresenta em forma inicial de crescimento, direcionando-se no rumo da afetividade.
Porque ainda asselvajado, não possui uma ética de comportamento que estabeleça o código de como proceder em relação ao outro, àquele a quem se dirige, permanecendo instável, interesseiro, amorfo, não definido. A me-dida que conquista as paisagens do sentimento, altera a constituição e passa a expressar-se de maneira diferente, propiciadora de confiança, estabelecendo elos de legitimidade com que se aformoseia e se encanta.
O amor jamais causa dissabor, nunca decepciona nem se desaponta.
Isso porque nada espera em resposta, evitando impor-se como manifestação egoísta ou tornando-se cediço em nome da afeição, quando a sua deva ser a atitude de coerência com a realidade.
Eis por que, no amor, uma das maneiras mais graves de manifestar-se será quando convidado a negar algo que não corresponde à legitimidade dos acontecimentos ou simplesmente não deva ser concedido. Pode chocar; jamais iludir, não temendo a reação daquele a quem se dirige e que, talvez, não lhe compreenda a atitude veraz, dignificadora.
O amor, também, mesmo nos momentos mais ásperos, jamais interrompe a sua ação, permanecendo integral, embora não manifesto de maneira objetiva, sensorial.
Nessa atitude silenciosa e quase desconhecida emite energias de alta potência que vitalizam o ser amado, que lhe ignora a procedência.
O amor é conciliador, no entanto não se acumplicia com aquilo que é incorreto.
Possui o dom de perdoar, olvidando todo o mal apenas para recordar-se de todo o bem que pode vislumbrar em qualquer ação ou pessoa.
Reconcilia-se com o adversário, aquele que se fez inimigo e se comprazia em manter uma atitude hostil, responsável por situações desagradáveis e prejudiciais. Não cobra estipêndios morais, a fim de estabelecer a paz.
Expressa a verdadeira conciliação, auxiliando o incompreendido ou malsinado a conviver em harmonia com aquele que o infelicitou ou lhe gerou problemas, não os recordando, tampouco solicitando esclarecimentos e justificações, aliás, muito do agrado do egoísmo doentio.
A conciliação, que é filha direta do perdão e da compaixão, faculta inusual júbilo do sentimento, que tudo apaga e esquece, compreendendo que aqueles comportamentos anteriores eram resultado da ignorância e das experiências iniciais do processo evolutivo.
Reconciliado no mundo interior, aquele que ama esparge jovialidade, modificando a aparência física que retrata o estado emocional interno, assim catalisando simpatia e saúde espiritual.
Essa conquista de reconciliação não espera, necessariamente, o ressarcimento, e porque nada aguarda nunca se decepciona quando ainda permanece incompreendida ou não é aceita pelo outro, o seu opositor.
Não é importante que aquele a quem seja dirigida agasalhe-a, considerando-a oportunidade adequada para o estabelecimento da paz. O seu valor consiste no que significa para quem a desenvolve, pouco lhe importando os resultados que disso advenham.
O amor é rico de conciliação, porque sabe que essa é a atitude melhor, que somente pode produzir frutos sazonados, e que um dia esplenderá em um hino de solidariedade e de paz entre todos os seres.
Por extensão, confia no poder dessa força intangível, mas que movimenta o Universo, sabendo inconscientemente que, cedo ou tarde, a sua doação retornará pelos movimentos especiais de fraternidade, entendimento e amizade.
Não seja estranhável se a pessoa que deseja realmente amar envolve-se em problemas e conflitos. Por não saber ainda os mecanismos sutis do amor, procura expressá-lo nas ocasiões inadequadas às pessoas imaturas e despreparadas, recebendo de volta complicações e dúvidas ultrajantes.
É compreensível que tal aconteça se for considerado que o amor exterioriza-se no emaranhado dos relacionamentos, interligando pessoas de temperamentos diversos, de diferentes culturas e condutas, não as julgando ou as condenando, não concordando ou deixando de anuir com a sua forma de ser.
Aprende-se a amar. O sentimento surge espontâneo, porém desenvolve-se pela experiência, mediante a sabedoria e convivência com os demais seres humanos.
Os relacionamentos não são muito fáceis, porque cada um tem a sua própria historiografia escrita na sua maneira de ser.
Dificilmente dois indivíduos respondem da mesma forma aos apelos do amor, seguindo, não poucas vezes, veredas diferentes.
O amor os entende e avança ao seu lado até onde é possível, prosseguindo não conforme agradaria, porém consoante lhe convém.
Esse é um dos momentos mágicos do amor e da conciliação: saber onde parar, quando prosseguir e como fazê-lo
O Mestre do amor referiu-se com imensa propriedade: Reconcilia-te com o teu adversário, enquanto estás no caminho com ele.
Para que haja essa (re)conciliação é necessário que o amor impere no país dos sentimentos, oferecendo paz e perdão ao ofensor, sem o que o gesto de busca e encontro perderia o seu significado, por manter apenas uma posição exterior.

(Re)conciliação é momento de amor em pleno estágio de desenvolvimento dos elevados valores da vida.


[1] Fonte: Livro – Garimpo de Amor – ditado do Espírito Joana de Ângelis, psicografia de Divaldo Pereira Franco, Ed LEAL,