sábado, 22 de fevereiro de 2020

Estudando Missionário da Luz - Vampirismo


VAMPIRISMO[1]
A sessão de desenvolvimento mediúnico, segundo deduzi da palestra entre os amigos encarnados; fora muito escassa em realizações para eles. Todavia, não se verificava o mesmo em nosso ambiente, onde se podia ver enorme satisfação em todas as fisionomias, a começar de Alexandre, que se mostrava jubiloso.
Os trabalhos haviam tomado mais de duas horas e, com efeito, embora me conservasse retraído, ponderando os ensinamentos da noite, minúcia a minúcia, observei o esforço intenso despendido pelos servidores de nossa esfera. Muitos deles, em grande número, não somente assistiam os companheiros terrestres, senão também atendiam a longas filas de entidades sofredoras de nosso plano.
Alexandre, o instrutor devotado, movimentara-se de mil modos.
E tocando a tecla que mais me impressionara, no círculo de observações do nobre concerto de serviços, acentuou satisfeito, em se reaproximando de mim:
- Graças ao Senhor, tivemos uma noite feliz. Muito trabalho contra o vampirismo.
Oh! Era o vampirismo a tese que me preocupava. Vira os mais estranhos bacilos de natureza psíquica, completamente desconhecidos na microbiologia mais avançada. Não guardavam a forma esférica das cocáceas[2], nem o tipo de bastonete das bacteriáceas diversas. Entretanto, formavam também colônias densas e terríveis. Reconhecera-lhes o ataque aos elementos vitais do corpo físico, atuando com maior potencial destrutivo sobre as células mais delicadas.
Que significava aquele mundo novo?
Que agentes seriam aqueles, caracterizados por indefinível e pernicioso poder?
Estariam todos os homens sujeitos à sua influenciação?
Não me contive. Expus ao orientador, francamente, minhas dúvidas e temores.
Alexandre sorriu e considerou:
- Muito bem! Muito bem! Você veio observar trabalhos de mediunidade e está procurando seu lugar de médico. É natural. Se estivesse especializado noutra profissão, teria identificado outros aspectos do assunto em análise.
E a encorajar-me, fraternalmente, acrescentou: - Você demonstra boa preparação, diante da medicina espiritual que lhe aguarda os estudos. Depois de longa pausa, prosseguiu explicando:
- Sem nos referirmos aos morcegos sugadores, o vampiro, entre os homens, é o fantasma dos mortos, que se retira do sepulcro, alta noite, para alimentar-se do sangue dos vivos. Não sei quem é o autor de semelhante definição, mas, no fundo, não está errada.
Apenas cumpre considerar que, entre nós, vampiro é toda entidade ociosa que se vale, indebitamente, das possibilidades alheias e, em se tratando de vampiros que visitam os encarnados, é necessário reconhecer que eles atendem aos sinistros propósitos a qualquer hora, desde que encontrem guarida no estojo de carne dos homens.
Alexandre fez ligeiro intervalo na conversação, dando a entender que expusera a preliminar de mais sérios esclarecimentos, e continuou:
- Você não ignora que, no círculo das enfermidades terrestres, cada espécie de micróbio tem o seu ambiente preferido. O pneumococo aloja-se habitualmente nos pulmões; o bacilo de Eberth 1ocaliza-se nos intestinos onde produz a febre tifóide; o bacilo de Klebs-Löffler situa-se nas mucosas onde provoca a difteria. Em condições especiais do organismo, proliferam os bacilos de Hansen ou de Koch.
Acredita você que semelhantes formações microscópicas se circunscrevem à carne transitória?
Não sabe que o macrocosmo está repleto de surpresas em suas formas variadas?
No campo infinitesimal, as revelações obedecem à mesma ordem surpreendente. André, meu amigo, as doenças psíquicas são muito mais deploráveis. A patogênese da alma está dividida em quadros dolorosos. A cólera, a intemperança, os desvarios do sexo, as viciações de vários matizes, formam criações inferiores que afetam profundamente a vida íntima. Quase sempre o corpo doente assinala a mente enfermiça. A organização fisiológica, segundo conhecemos no campo de cogitações terrestres, não vai além do vaso de barro, dentro do mol de preexistente do corpo espiritual. Atingido o molde em sua estrutura pelos golpes das vibrações inferiores, o vaso refletira imediatamente.
Compreendi onde o instrutor desejava chegar. Entretanto, as suas considerações relativas às novas expressões microbianas davam ensejo a certas indagações.
Como encarar o problema das formações iniciais?
Enquadrava-se a afecção psíquica no mesmo quadro sintomatológico que conhecera, até então, para as enfermidades orgânicas em geral?
Haveria contágio de moléstias da alma?
E seria razoável que assim fosse; na esfera onde os fenômenos patológicos da carne não mais deveriam existir?
Afirmara Virchow que o corpo humano “é um país celular, onde cada célula é um cidadão, constituindo a doença um atrito dos cidadãos, provocado pela invasão de elementos externos”. De fato, a criatura humana desde o berço deve lutar contra diversas flagelações climáticas, entre venenos e bactérias de variadas origens.
Como explicar, agora, o quadro novo que me defrontava os escassos conhecimentos?
Não sopitei a curiosidade. Recorrendo à admirável experiência de Alexandre, perguntei:
- Ouça, meu amigo.
Como se verificam os processos mórbidos de ascendência psíquica?
Não resulta a afecção do assédio de forças exteriores?
Em nosso domínio, como explicar a questão?
É a viciação da personalidade espiritual que produz as criações vampirísticas ou estas que avassalam a alma, impondo-lhe certas enfermidades?
Nesta última hipótese, poderíamos considerar a possibilidade do contágio?
O orientador ouviu-me, atencioso, e esclareceu:
- Primeiramente a semeadura, depois a colheita; e, tanto as sem entes de trigo como de escalracho[3], encontrando terra propícia, produzirão a seu modo e na mesma pauta de multiplicação. Nessa resposta da Natureza ao esforço do lavrador, temos simplesmente a lei. Você está observando o setor das larvas com justificável admiração.
Não tenha dúvida. Nas moléstias da alma, como nas enfermidades do corpo físico, antes da afecção existe o ambiente.
As ações produzem efeitos, os sentimentos geram criações, os pensamentos dão origem a formas e conseqüências de infinitas expressões. E, em virtude de cada Espírito representar um universo por si, cada um de nós é responsável pela emissão das forças que lançamos em circulação nas correntes da vida. A cólera, a desesperação, o ódio e o vício oferecem campo a perigosos germens psíquicos na esfera da alma.
E, qual acontece no terreno das enfermidades do corpo, o contágio aqui é fato consumado, desde que a imprevidência ou a necessidade de luta estabeleça ambiente propício, entre companheiros do mesmo nível. Naturalmente, no campo da matéria mais grosseira, essa lei funciona com violência, enquanto, entre nós, se desenvolve com as modificações naturais.
Aliás, não pode ser de outro modo, mesmo porque você não ignora que muita gente cultiva a vocação para o abismo. Cada viciação particular da personalidade produz as formas sombrias que lhe são conseqüentes, e estas, como as plantas inferiores que se alastram no solo, por relaxamento do responsável, são extensivas às regiões próximas, onde não prevalece o espírito de vigilância e defesa.
Evidenciando extrema prudência no exame dos fatos e prevenindo-me contra qualquer concepção menos digna, no círculo de apreciações da Obra Divina, acrescentou:
- Sei que a sua perplexidade é enorme; no entanto, você não pode esquecer a nossa condição de velhos reincidentes no abuso da lei.
Desde o primeiro dia de razão na mente humana, a idéia de Deus criou princípios religiosos, sugerindo-nos as regras de bem viver.
Contudo, à medida que se refinam conhecimentos intelectuais, parece que há menor respeito no homem para com as dádivas sagradas. Os pais terrestres, com raríssimas exceções, são as primeiras sentinelas viciadas, agindo em prejuízo dos filhinhos.
Comumente, aos vinte anos, em virtude da inércia dos vigias do lar, a mulher é uma boneca e o homem um manequim de futilidades doentias, muito mais interessados no serviço dos alfaiates que no esclarecimento dos professores; alcançando o monte do casamento, muitas vezes são pessoas excessivamente ignorantes ou demasiadamente desviadas. Cumpre, ainda, reconhecer que nós mesmos, em todo o curso das experiências terrestres, na maioria das ocasiões fomos campeões do endurecimento e da perversidade contra as nossas próprias forças vitais.
Entre abusos do sexo e da alimentação, desde os anos mais tenros, nada mais fazíamos que; desenvolver as tendências inferiores, cristalizando hábitos malignos.
Seria, pois, de admirar tantas moléstias do corpo e degenerescências psíquicas?
O Plano Superior jamais nega recursos aos necessitados de toda ordem e, valendo-se dos mínimos ensejos, auxilia os irmãos de humanidade na restauração de seus patrimônios, seja cooperando com a Natureza ou inspirando a descoberta de novas fontes medicamentosas e reparadoras. Por nossa vez, em nos despojando dos fluidos mais grosseiros, através da morte física, à proporção que nos elevamos em compreensão e competência, transformamo-nos em auxiliares diretos das criaturas.
Apesar disso, porém, o cipoal da ignorância é ainda muito espesso.
E o vampirismo mantém considerável expressão, porque, se o Pai é sumamente misericordioso, é também infinitamente justo.
Ninguém lhe confundirá os desígnios, e a morte do corpo quase sempre surpreende a alma em terrível condição parasitária. Desse modo, a promiscuidade entre os encarnados indiferentes à Lei Divina e os desencarnados que a ela têm sido indiferentes, é muito grande na crosta da Terra.
Absolutamente sem preparo e tendo vivido muito mais de sensações animalizadas que de sentimentos e pensamentos puros, as criaturas humanas, além do túmulo, em muitíssimos casos prosseguem imantadas aos ambientes domésticos que lhes alimentavam o campo emocional. Dolorosa ignorância prende-lhes os corações, repletos de particularismos, encarceradas no magnetismo terrestre; enganando a si próprias e fortificando suas antigas ilusões.
Aos infelizes que caíram em semelhante condição de parasitismo, as larvas que você observou servem de alimento habitual.
- Deus meu! - exclamei sob forte espanto.
Alexandre, porém, acrescentou:
- Semelhantes larvas são portadoras de vigoroso magnetismo animal. Observando talvez que muitas e torturantes indagações se me entrechocavam no cérebro, o instrutor considerou:
- Naturalmente que a fauna microbiana, em análise, não será servida em pratos; bastará ao desencarnado agarrar-se aos companheiros de ignorância, ainda encarnados, qual erva daninha aos galhos das árvores, e sugar-lhes a substância vital.
Não conseguia dissimular o assombro que me dominava.
- Porque tamanha estranheza? - perguntou o cuidadoso orientador - e nós outros, quando nas esferas da carne?
Nossas mesas não se mantinham a custa das vísceras dos touros e das aves?
O pretexto de buscar recursos, protéicos exterminava frangos e carneiros, leitões e cabritos incontáveis. Sugávamos os tecidos musculares, roíamos os ossos. Não contentes em matar os pobres seres que nos pediam roteiros de progresso e valores educativos, para melhor atenderem a Obra do Pai, dilatávamos os requintes da exploração milenária e infligíamos a muitos deles determinadas moléstias para que nos servissem ao paladar, com a máxima eficiência.
O suíno comum era localizado por nós, em regime de ceva, e o pobre animal, muita vez à custa de resíduos, devia criar para nosso uso, certas reservas de gordura, até que se prostrasse, de todo, ao peso de banhas doentias e abundantes. Colocávamos gansos nas engordadeiras para que hipertrofiassem o fígado, de modo a obtermos pastas substanciosas destinadas a quitutes que ficaram famosos, despreocupados das faltas cometidas com a suposta vantagem de enriquecer os valores culinários. Em nada nos doía o quadro comovente das vacas-mães, em direção ao matadouro, para que nossas panelas transpirassem agradavelmente.
Encarecíamos, com toda a responsabilidade da Ciência, a necessidade de proteínas e gorduras diversas, mas esquecíamos de que a nossa inteligência, tão fértil na descoberta de comodidade e conforto, teria recursos de encontrar novos elementos e meios de incentivar os suprimentos protéicos ao organismo, sem recorrer às indústrias da morte. Esquecíamo-nos de que ° aumento dos laticínios, para enriquecimento da alimentação, constitui elevada tarefa, porque tempos virão, para a Humanidade terrestre, em que o estábulo, como o lar, será também sagrado.
- Contudo, meu amigo - propus-me a considerar -, a idéia de que muita gente na Terra vive à mercê de vampiros invisíveis é francamente desagradável e inquietante. E a proteção das esferas mais altas? E o amparo das entidades angélicas, a amorosa defesa de nossos superiores?
- André, meu caro - falou Alexandre, benevolente -, devemos afirmar a verdade, embora contra nós mesmos. Em todos os setores da Criação, Deus, nosso Pai, colocou os superiores e os inferiores para o trabalho de evolução, através da colaboração e do amor, da administração e da obediência.
Atrever-nos-íamos a declarar, porventura, que fomos bons para os seres que nos eram inferiores?
Não lhes devastávamos a vida, personificando diabólicas figuras em seus caminhos? Claro que não desejamos criar um princípio de falsa proteção aos irracionais, obrigados, como nós outros, a cooperar com a melhor parte de suas forças e possibilidades no engrandecimento e na harmonia da vida, nem sugerimos a perigosa conservação dos elementos reconhecidamente daninhos.
Todavia, devemos esclarecer que, no capítulo da indiferença para com a sorte dos animais, da qual participamos no quadro das atividades humanas, nenhum de nós poderia, em sã consciência, atirar a primeira pedra. Os seres inferiores e necessitados do Planeta não nos encaram como superiores generosos e inteligentes, mas como verdugos cruéis. Confiam na tempestade furiosa que perturba as forças da Natureza, mas fogem desesperados, à aproximação do homem de qualquer condição, excetuando-se os animais domésticos que, por confiar em nossas palavras e atitudes, aceitam o cutelo no matadouro, quase sempre com lágrimas de aflição, incapazes de discernir com o raciocínio embrionário onde começa a nossa perversidade e onde termina a nossa compreensão.
Se não protegemos e nem educamos aqueles que o Pai nos confiou, como germens frágeis de racionalidade nos pesados vasos do instinto; se abusarmos largamente de sua incapacidade de defesa e conservação: como exigir o amparo de superiores benevolentes e sábios, cujas instruções mais simples são para nós difíceis de suportar, pela nossa lastimável condição de infratores da lei de auxílios mútuos?
Na qualidade de médico, você não pode ignorar que o embriologista, contemplando o feto humano em seus primeiros dias, a distância do veículo natural, não poderá afirmar, com certeza, se tem sob os olhos o gérmen dum homem ou de um cavalo. O médico legista encontra dificuldades para determinar se a mancha de sangue encontrada eventualmente provém de um homem, dum cão ou dum macaco. O animal possui igualmente o seu sistema endocrínico, suas reservas de hormônios, seus processos particulares de reprodução em cada espécie e, por isso mesmo, tem sido auxiliar precioso e fiel da Ciência na descoberta dos mais eficientes serviços de cura das moléstias humanas, colaborando ativamente na defesa da Civilização. Entretanto...
Interrompera-se o instrutor e, considerando a gravidade do assunto, perguntei com emoção:
- Como solucionar tão dolorosos problemas?
- Os problemas são nossos - esclareceu o generoso amigo tranqüilamente -, não nos cabe condenar a ninguém.
Abandonando as faixas de nosso primitivismo, devemos acordar a própria consciência para a responsabilidade coletiva. A missão do superior é a de amparar o inferior e educá-lo. E os nossos abusos para com a Natureza estão cristalizados em todos os países, há muitos séculos. Não podemos renovar os sistemas econômicos dos povos, dum momento para outro, nem substituir os hábitos arraigados e viciosos de alimentação imprópria, de maneira repentina. Refletem eles, igualmente, nossos erros multimilenares. Mas, na qualidade de filhos endividados para com Deus e a Natureza, devemos prosseguir no trabalho educativo, acordando os companheiros encarnados, mais experientes e esclarecidos, para a nova era em que os homens cultivarão o solo da Terra por amor e utilizar-se-ão dos animais, com espírito de respeito, educação e entendimento.
Depois de ligeiro intervalo, o instrutor observou:
- Semelhante realização é de importância essencial na vida humana, porque, sem amor para com os nossos inferiores, não podemos aguardar a proteção dos superiores; sem respeito para com os outros, não devemos esperar o respeito alheio. Se temos sido vampiros insaciáveis dos seres frágeis que nos cercam, entre as formas terrenas, abusando de nosso poder racional ante a fraqueza da inteligência deles, não é demais que, por força da animalidade que conserva desveladamente, venha a cair à maioria das criaturas em situações enfermiças pelo vampirismo das entidades que lhes são afins, na esfera invisível.
Os esclarecimentos de Alexandre, ministrados sem presunção e sem crítica, penetravam-me fundo. Algo de novo despertava-me o ser. Era o espírito de veneração por todas as coisas, o reconhecimento efetivo do Paternal Poder do Senhor do Universo. O delicado orientador interrompeu-me o transporte de íntima adoração ao Pai, acentuando:
- Segundo observa, o legítimo desenvolvimento mediúnico é problema de ascensão espiritual' dos candidatos às percepções sublimes. Entretanto. André, não importa que os nossos amigos, ansiosos pelos altos valores psíquicos, tenham vindo até aqui sem a devida preparação. Embora incipientes no assunto, lucraram muitíssimo, porque foram auxiliados contra o vampirismo venenoso e destruidor.
Surpreendeu-se você com as larvas que lhes avassalam as energias espirituais; agora ver a as entidades exploradoras que permanecem fora do recinto, esperando-lhes o regresso.
- Lá fora? - perguntei, alarmado.
- Sim - respondeu Alexandre -, se os nossos irmãos conseguissem de fato estabelecer sobre si mesmos os desejáveis golpes de disciplina, muito ganhariam em força contra a influenciação dos infelizes que os seguem; lamentavelmente, no entanto, são raros os que mantêm a necessária resolução, no terreno da aplicação viva da luz que recebem. A maioria, rompido o nosso círculo magnético, organizado no curso de cada reunião, esquece as bênçãos recebidas e volta-se, novamente, para as mesmas condições deploráveis de horas antes; subjugada pelos vampiros renitentes e cruéis.
- Oh! Que lições! - exclamei.
Notando que os nossos amigos encarnados se dispunham a sair, o instrutor convidou: - Venha comigo à via pública e observe por si mesmo.



[1] Fonte: Missionário da Luz, Ditado pelo Espírito André Luiz, psicografia de Francisco Cândido Xavier, Editora FEB, Capitulo 4
[2] [Bacteriologia] Em algumas classificações, família (Coccaceae) de bactérias que compreende as com forma mais ou menos esférica, agora raras vezes consideradas um grupo natural. - https://www.dicio.com.br/cocaceas/
[3] [Botânica] Gramínea, vivaz, infestante . - https://www.dicio.com.br/escalracho/

sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

Estudando Missionário da Luz - Desenvolvimento mediúnico


DESENVOLVIMENTO MEDIÚNICO[1]
Os serviços particulares não proporcionavam ensejo a excursões dilatadas e freqüentes, em companhia de Alexandre; entretanto, valia-me de todas as folgas nos trabalhos comuns.
Havia sempre o que aprender. E constituía enorme satisfação seguir o ativo missionário das atividades de comunicação.
- Hoje, à noite - disse-me o devotado amigo -, observará algumas demonstrações de desenvolvimento mediúnico.
Aguardei as instruções com interesse.
No instante indicado, compareci ao grupo.
Antes do ingresso dos companheiros encarnados, já era muito grande a movimentação. Número considerável de trabalhadores. Muito serviço de natureza espiritual.
Admirava as características dos socorros magnéticos, dispensados às entidades sofredoras, quando Alexandre acentuou:
- Por enquanto, nossos esforços são mais frutíferos ao círculo dos desencarnados infelizes. As atividades beneficentes da casa concentram-se deles, em maior porção, porque os encarnados, mesmo aqueles que já se interessam pela prática espiritista, muito raramente se dispõem, com sinceridade, ao aproveitamento real dos valores legítimos de nossa cooperação.
E, depois de longa pausa, prosseguiu:
- É muito lenta e difícil à transição, entre a animalidade grosseira e a espiritualidade superior. Nesse sentido, há sempre, entre os homens, um oceano de palavras e algumas gotas de ação.
Nesse instante, os primeiros amigos do plano carnal deram entrada no recinto.
- Veremos hoje - exclamava um senhor de espessos bigodes -, veremos hoje se temos boa sorte.
- Não tenho vindo com assiduidade às experiências – comentou um rapaz -, porque vivo desanimado... Há quanto tempo mantenho o lápis na mão, sem resultado algum?
- É pena! - respondia outro senhor; a dificuldade desencoraja, de fato.
- Parece-me que nada merecemos, no setor do estímulo, por parte dos benfeitores invisíveis! - Acrescentava uma senhora de boa idade - há quantos meses procuro em vão desenvolver-me? Em certos momentos, sinto vibrações espirituais intensas, junto de mim, contudo, não passo das manifestações iniciais.
A palestra continuou interessante e pitoresca. Decorridos alguns minutos, com a presença de outros pequenos grupos de experimentadores que chegavam solícitos, foi iniciada a sessão de desenvolvimento.
O diretor proferiu tocante prece, no que foi acompanhado por todos os presentes.
Dezoito pessoas mantinham-se em expectativa.
- Alguns - explicou Alexandre - pretendem a psicografia, outros tentam a mediunidade de incorporação. Infelizmente, porém, quase todos confundem poderes psíquicos com funções fisiológicas.
Acreditam no mecanismo absoluto da realização e esperam o progresso eventual e problemático, esquecidos de que toda edificação da alma requer disciplina, educação, esforço e perseverança.
Mediunidade construtiva é a língua de fogo do Espírito Santo, luz divina para a qual é preciso conservar o pavio do amor cristão, o azeite da boa vontade pura.
Sem a preparação necessária, a excursão dos que provocam o ingresso no reino invisível é, quase sempre, uma viagem nos círculos de sombra.
Alcançam grandes sensações e esbarram nas perplexidades dolorosas. Fazem descobertas surpreendentes e acabam nas ansiedades e dúvidas sem fim.
Ninguém pode trair a lei Impunemente, e, para subir, Espírito algum dispensará o esforço de si mesmo, no aprimoramento íntimo...
Dirigindo-se, de maneira especial, para os circunstantes, o instrutor recomendou:
- Observemos.
Postara-se ao lado de um rapaz que esperava de lápis em punho, mergulhado em fundo silêncio. Ofereceu-me Alexandre o seu vigoroso auxílio magnético e contemplei-o, com atenção. Os núcleos glandulares emitiam pálidas irradiações. A epífise principalmente semelhava-se à reduzida semente algo luminosa.
- Repare no aparelho genital - aconselhou-me o instrutor, gravemente.
Fiquei estupefato.
As glândulas geradoras emitiam fraquíssima luminosidade, que parecia abafada por aluviões de corpúsculos negros, a se caracterizarem por espantosa mobilidade. Começavam as movimentações sob a bexiga urinária e vibravam ao longo de todo o cordão espermático, formando colônias compactas, nas vesículas seminais, na próstata, nas massas mucosas uretrais, invadiam os canais seminíferos e lutavam com as células sexuais, aniquilando-as. As mais vigorosas daquelas feras microscópicas situavam-se no epidídimo[2], onde absorviam famélicos, os embriões delicados da vida orgânica. Estava assombrado.
Que significava aquele acervo de pequeninos seres escuros?
Pareciam imantados uns aos outros, na mesma faina de destruição.
Seriam expressões mal conhecidas da sífilis?
Enunciando semelhante indagação íntima, explicou-me Alexandre, sem que eu lhe dirigisse a palavra falada:
- Não, André. Não temos sob os olhos o espiroqueta[3] de Schaudinn, nem qualquer nova forma suscetível de análise material por bacteriologistas humanos. São bacilos psíquicos das torturas sexuais, produzidos pela sede febril de prazeres inferiores. O dicionário médico do mundo não os conhece e, na ausência de terminologia adequada aos seus conhecimentos, chamemos-lhes larvas, simplesmente. Têm sido cultivados por este companheiro, não só pela incontinência no domínio das emoções próprias, através de experiências sexuais variadas, senão também pelo contacto com entidades grosseiras, que se afina com as predileções dele, entidades que o visitam com freqüência, à maneira de imperceptíveis vampiros. O pobrezinho ainda não pôde compreender que o corpo físico é apenas leve sombra do corpo perispiritual, não se capacitou de que a prudência, em matéria de sexo, é equilíbrio da vida e, recebendo as nossas advertências sobre a temperança, acredita ouvir remotas lições de aspecto dogmático, exclusivo, no exame da fé religiosa.
A pretexto de aceitar o império da razão pura na esfera da lógica admite que o sexo nada tenha que ver com a espiritualidade; como se esta não fosse a existência em si.
Esquece-se de que tudo é espírito; manifestação divina e energia eterna.
O erro de nosso amigo é o de todos os religiosos que supõem a alma absolutamente separada do corpo físico, quando todas as manifestações psicofísicas se derivam da influenciação espiritual.
Novos mundos de pensamento raiavam-me no ser. Começava a sentir definições mais francas do que havia sido terríveis incógnitas para mim, no capítulo da patogenia em geral.
Não saíra do meu intraduzível espanto, quando o instrutor me chamou a atenção para um cavalheiro maduro que tentava a psicografia.
- Observe este amigo - disse-me, com autoridade -, não sente um odor característico?
Efetivamente, em derredor daquele rosto pálido, assinalava-se à existência de atmosfera menos agradável.
Semelhava-se-lhe o corpo a um tonel de configuração caprichosa, de cujo interior escapavam certos vapores muito leves, mas incessantes.
Via-se-lhe a dificuldade para sustentar o pensamento com relativa calma. Não tive qualquer dúvida. Deveria ele usar alcoólicos em quantidade regular.
Vali-me do ensejo para notar-lhe às singularidades orgânicas.
O aparelho gastrintestinal parecia totalmente ensopado em aguardente, porquanto essa substância invadia todos os escaninhos do estômago e, começando a fazer-se sentir nas paredes do esôfago, manifestava a sua influência até no bolo fecal. Espantava-me o fígado enorme. Pequeninas figuras horripilantes postavam-se, vorazes, ao longo da veia porta, lutando desesperadamente com os elementos sanguíneos mais novos. Toda a estrutura do órgão se mantinha alterada. Terrível ingurgitamento. Os lóbulos cilíndricos, modificados, abrigavam células doentes e empobrecidas.
O baço apresentava anomalias estranhas.
- Os alcoólicos - esclareceu Alexandre, com grave entonação - aniquilavam-no vagarosamente. Você está examinando as anormalidades menores. Este companheiro permanece completamente desviado em seus centros de equilíbrio vital. Todo o sistema endocrínico foi atingido pela atuação tóxica. Inutilmente trabalha a medula para melhorar os valores da circulação. Em vão, esforçam-se os centros genitais para ordenar as funções que lhes são peculiares, porque o álcool excessivo determina modificações deprimentes sobre a própria cromatina[4]. Debalde trabalham os rins na excreção dos elementos corrosivos, porque a ação perniciosa da substância em estudo anula diariamente grande número de nefrons.
O pâncreas, viciado, não atende com exatidão ao serviço de desintegração dos alimentos. Larvas destruidoras exterminam as células hepáticas. Profundas alterações modificam-lhe as disposições do sistema nervoso vegetativo e, não fosse às glândulas sudoríparas, tornar-se-lhe-ia talvez impossível à continuação da vida física.
Não conseguia dissimular minha admiração. Alexandre indicava os pontos enfermiços e esclarecia os assuntos com sabedoria e simplicidade tão grandes que não pude ocultar o assombro que se apoderara de mim.
O instrutor colocou-me, em seguida, ao lado de uma dama simpática e idosa. Após examiná-la, atencioso, acrescentou:
- Repare nesta nossa irmã. É candidata ao desenvolvimento da mediunidade de incorporação. Fraquíssima luz emanava de sua organização mental e, desde o primeiro instante, notara-lhe as deformações físicas.
O estômago dilatara-se-lhe horrivelmente e os intestinos pareciam sofrer estranhas alterações.
O fígado, consideravelmente aumentado, demonstrava indefinível agitação.
Desde o duodeno ao sigmóide, notavam-se anomalias de vulto.
Guardava a idéia de presenciar, não o trabalho de um aparelho digestivo usual, e, sim, de vasto alambique, cheio de pastas de carne e caldos gordurosos, cheirando a vinagre de condimentação ativa. Em grande zona do ventre superlotado de alimentação, viam-se muitos parasitos conhecidos, mas, além deles, divisava outros corpúsculos semelhantes a lesmas voracíssimas, que se agrupavam em grandes colônias, desde os músculos e as fibras do estômago até a válvula ileocecal. Semelhantes parasitos atacavam os sucos nutritivos, com assombroso potencial de destruição.
Observando-me a estranheza, o orientador falou em meu socorro:
- Temos aqui uma pobre amiga desviada nos excessos de alimentação.
Todas as suas glândulas e centros nervosos trabalham para atender as exigências do sistema digestivo. Descuidada de si mesma, caiu na glutonaria crassa, tornando-se presa de seres de baixa condição.
E porque me conservasse em silêncio, incapacitado de argumentar, ante os ensinamentos tão novos, o instrutor considerou:
- Perante estes quadros, pode você avaliar a extensão das necessidades educativas na esfera da Crosta. A mente encarnada engalanou-se com os valores intelectuais e fez o culto da razão pura, esquecendo-se de que a razão humana precisa de luz divina.
O homem comum percebe muito pouco e sente muito menos.
Ante a eclosão de conhecimentos novos, em face da onda regeneradora do Espiritualismo que banha as nações mais cultas da Terra angustiadas por longos sofrimentos coletivos, necessitamos acionar as melhores possibilidades de colaboração, para que os companheiros terrestres valorizem as suas oportunidades benditas de serviço e redenção.
Compreendi que Alexandre se referia, veladamente, ao grande movimento espiritista, em virtude de nos encontrarmos nas tarefas de uma casa doutrinária, e não me enganava, porque o bondoso mentor continuou a dizer, gravemente:
- O Espiritismo cristão é a revivescência do Evangelho de Nosso Senhor Jesus Cristo, e a mediunidade constitui um de seus fundamentos vivos. A mediunidade, porém, não é exclusiva dos chamados “médiuns”. Todas as criaturas a possuem, porquanto significa percepção espiritual, que deve ser incentivada em nós mesmos. Não bastará, entretanto, perceber. É imprescindível santificar essa faculdade, convertendo-a no ministério ativo do bem. A maioria dos candidatos ao desenvolvimento dessa natureza, contudo, não se dispõe aos serviços preliminares de limpeza do vaso receptivo. Dividem, inexoravelmente, a matéria e o espírito, localizando-os em campos opostos, quando nós, estudantes da Verdade, ainda não conseguimos identificar rigorosamente as fronteiras entre uma e outro, integrados na certeza de que toda a organização universal se baseia em vibrações puras. Inegavelmente, meu amigo - e sorriu -, não desejamos transformar o mundo em cemitério de tristeza e desolação. Atender a santificada missão do sexo, no seu plano respeitável, usar um aperitivo comum, fazer a boa refeição, de modo algum significa desvios espirituais; no entanto, os excessos representam desperdícios lamentáveis de força, os quais retêm a alma nos círculos inferiores.
Ora, para os que se trancafiam nos cárceres de sombra, não é fácil desenvolver percepções avançadas. Não se pode cogitar de mediunidade construtiva, sem o equilíbrio construtivo dos aprendizes, na sublime ciência do bem-viver.
- Oh! - exclamei - e por que motivo não dizer tudo isto aos nossos irmãos congregados aqui? Porque não adverti-los austeramente?
Alexandre sorriu benévolo, e acentuou:
- Não, André. Tenhamos calma. Estamos no serviço de evolução e adestramento. Nossos amigos não são rebeldes ou maus, em sentido voluntário. Estão espiritualmente desorientados e enfermos. Não podem transformar-se, dum momento para outro.
Compete-nos, portanto, ajudá-los no caminho educativo.
O orientador deixou de sorrir e acrescentou:
- É verdade que sonham edificar maravilhosos castelos, sem base; alcançar imensas descobertas exteriores, sem estudarem a si próprios; mas, gradativamente, compreenderão que mediunidade elevada ou percepção edificante não constituem atividades mecânicas da personalidade e sim conquistas do Espírito, para cuja consecução não se pode prescindir das iniciações dolorosas, dos trabalhos necessários, com a auto-educação sistemática e perseverante.
Excetuando-se, porém, essas ilusões infantis, são boas companheiras de luta, aos quais estimamos carinhosamente, não só como nossos irmãos mais jovens, mas também por serem credores de reconhecimento pela cooperação que nos prestam, muitas vezes inconscientemente.
Os tenros embriões vegetais de hoje serão as árvores robustas de amanhã o as tribos ignorantes de ontem constituem a Humanidade de agora.
Por isso mesmo, todas as nossas reuniões são proveitosas, e, ainda que os seus passos sejam vacilantes na senda, tudo faremos por defendê-los contra as perigosas malhas do vampirismo.


[1] Fonte: Missionário da Luz, Ditado pelo Espírito André Luiz, psicografia de Francisco Cândido Xavier, Editora FEB, Capitulo 3
[2] epidídimo é um pequeno ducto que coleta e armazena os espermatozóides produzidos pelo testículo e está presente em todos os Amniotas do sexo masculino. Localiza-se posteriormente ao testículo, no saco escrotal, e desemboca na base do ducto deferente, o canal que conduz os espermatozóides até à próstata. https://pt.wikipedia.org/wiki/Epididimo
[3] Micróbio do grupo das bactérias, em forma de longos filamentos, freqüentemente espiralados: espiroqueta ou treponema da sífilis. https://www.dicio.com.br/espiroqueta/
[4] Em citologiacromatina é o complexo de DNA (RNA) e proteínas que se encontra dentro do núcleo celular nas células eucarióticas. Os ácidos nucléicos encontram-se geralmente na forma de dupla-hélice. As principais proteínas da cromatina são as histonas. As histonas H2A, H2B, H3 e H4 unem-se, formando um octâmero denominado nucleossoma.  https://pt.wikipedia.org/wiki/Cromatina

terça-feira, 18 de fevereiro de 2020

Por amor a Jesus


POR AMOR A JESUS[1]

O dia fora estafante.
As atividades da Casa tiveram início pela Alva com a leva de enfermos, que chegaram, suplicando ajuda, e terminaram, noite adentro, com alguns obsidiados que renteavam com a loucura e foram deixados à porta, ao relento...
Aquela era a quadra ardente do verão e a temperatura morna; amolentava mesmo as resistências mais vigorosas.
Conhecida na cidade e nos arredores como o albergue do amor e o recinto da esperança, para a “Casa do Caminho” afluíam os desafortunados de todos os matizes.
Não obstante a escassez de cooperadores, as pessoas não tinham pejo em descarregar sobre os ombros cansados dos operários de Jesus todas as cruzes e problemas que encontravam, encaminhando-lhes os aflitos e necessitados em grupos que se sucediam como ondas contínuas do mar.. .
Sempre haverá esse comportamento entre os homens.
Os desobrigados com os compromissos da solidariedade encaminharão para os lidadores da ação extenuantes novas contribuições de sofrimentos, indiferentes à angústia e ao cansaço dos que se empenham em minimizar a problemática humana.
Aquela temporada se assinalava pelas dores gerais: criancinhas órfãs e velhinhos desvalidos, enfermos e alienados de vário porte chegavam a cada hora, valendo-se dos recursos do amor, da caridade e da abnegação de Pedro, que jamais se escusava.
Somando penas aos trabalhos exaustivos, sem repouso, medravam, aqui e ali, suspeitas infundadas, incompreensões injustificáveis se instalavam entre os poucos colaboradores do “velho pescador”.
Não raro, o amigo dos infelizes sentia-se quase a sós, para atender ao grande número de necessitados ali albergados e aos sucessivos grupos que diariamente rogavam apoio e recolhimento.
Este companheiro admoestava o discípulo, acusando-o de abuso da caridade; aquele o censurava às claras pelo tempo aplicado na assistência aos leprosos, que, segundo ele, deveriam ser liminarmente arrojados à morte, no “vale dos imundos”, em Jerusalém; outros queixavam-se da falta de oportunidade para os largos diálogos evangélicos porque Simão estava sempre a braços com os trabalhos cansativos; por fim, afirmavam diversos, que a Casa não sobreviveria, naquelas condições, considerando a possibilidade de as autoridades do Cinéreo mandarem fechá-la, por albergar mulheres de vida equivocada, publicamente conhecidas , . .
Simão ouvia as insinuações malevas, as ingratidões e os sarcasmos indisfarçados em silêncio.
Alguns o tinham na conta de covarde e demonstravam conhecer-lhe a fraqueza das negações.
Pessoas amigas não ocultavam o desagrado ante a programação pesada que o companheiro de Jesus se impunha, convidando sem palavras os demais obreiros à dilatação das forças e da ação na caridade.
Era como se a inconsciência e a irresponsabilidade conspirassem contra o bem, na Casa dedicada ao bem geral.
O apóstolo abnegado, todavia, não se deixava contaminar pelos vapores tóxicos da intriga nem das conversações malsãs.
À medida, porém, que o desgaste físico e mental lhe minava as forças, foi acolhendo, sem o perceber, o vírus do desânimo.
Anotava, aqui e ali, mal-estar, e percebia-se imensamente saudoso da companhia do Mestre, que muito anelava por voltar a fruir.
Quando se fez silêncio nos largos pavilhões humildes onde a dor encontrava lenitivo e as vozes do aturdimento obsessivo silenciaram, Simão assentou-se sob a sombra de vetusta figueira brava esparramada pelo pátio interno da “Casa do Caminho” e recolheu-se em meditação e prece.
A noite agradável fizera-se um álbum natural de recordações.
O discípulo dedicado repassou, mentalmente, as cenas da sua convivência com Jesus desde o primeiro encontro até ao último contato. . .
Parecia-lhe que as evocações se corporificavam, concedendo-lhe nítidas lembranças que lhe orvalhavam os olhos reiteradas vezes.
Constatava, na saudade e na emoção, o quanto amava àquele Amigo!
É certo que Lhe daria a vida.
Não saberia explicar ainda o motivo da fraqueza que o martirizava. . .
Não saíra das últimas recordações em torno do momento da ascensão, quando viu Jesus, transparente e belo, à sua frente.
Desejou traduzir a felicidade daquela hora, explodindo de júbilos, mas o suave e tranqüilo olhar do Amigo que o penetrou, dulcificou-o por dentro, harmonizando-o.
Passado o primeiro instante, e porque não desejasse malbaratar a oportunidade excepcional, Pedro recordou-se das últimas dificuldades experimentadas no trabalho e expô-las em breves palavras, concluindo, entristecido:
— Não são os estranhos, Senhor; a criarem-me impedimentos para o labor crescente, mas, os amigos, os cooperadores...
E desejando dar maior ênfase aos problemas, arrematou:
— Quando a perseguição vem de fora, dos que nos não conhecem, é mais fácil compreendê-los e desculpá-los, porém quando decorre daqueles que vivem conosco e participam da nossa fé, do nosso ideal...
Não conseguiu terminar a frase, porque a voz ficou estrangulada na garganta túrgida.
O Senhor, compreendendo as lutas do discípulo querido, interrogou:
— Pedro, que era o vaso delicado, antes de tomar forma?
— Argila comum, Senhor — respondeu, presto, o interlocutor.
— E a estátua perfeita, — volveu o Mestre — antes do esforço e da dedicação do artista?
— Pedra bruta, Mestre — apressou-se, Simão em responder.
— Tens razão, amigo — aduziu Jesus. — Sem o trabalho consciente nem a arte do oleiro o vaso não se teria formado, permanecendo perdido no barro úmido. . . Não fossem a paciência e a habilidade do escultor, a estátua que dormia na pedra grosseira lá permaneceria sem qualquer beleza ou utilidade.
Fazendo breve pausa, o Mestre prosseguiu:
— Os homens, à semelhança da argila sem forma ou pedra grosseira, aguardam que os cultores dos nobres ideais lhes plasmem beleza e forma, delicadeza e utilidade, vencendo as suas resistências a golpes de paciência, perseverança e fé, até que colimem os objetivos para os quais foram criados pelo Pai.
“Relegá-los à própria ignorância, seria condená-los à inutilidade. Cumpre-nos compreender-lhes a situação, o degrau em que estagiam, no processo da evolução, e ampará-los, mesmo que se neguem às nossas mãos plasmadoras de formas e cultivadoras de bênçãos.
“Além disso, convém considerar que eles são hoje, o que já foste ontem. O tempo e o amor divino cuidaram de ti, através de outros que te alcançaram, cabendo-te, agora, a tarefa de cuidar deles, a fim de que cheguem até onde te encontras...”
Dando margem a que o ouvinte penetrasse o conteúdo profundo das suas palavras, o Senhor silenciou, para logo concluir:
— Se não exercitamos o amor e a caridade com aqueles com quem convivemos, como provaremos os próprios valores, quando chamados a tolerar e a suportar os que nos são desconhecidos?
“Se não nos for possível perseverar com os que jazem no desânimo e nos dificultam a marcha, qual será o nosso comportamento em relação aos que se obstinam contra os nossos propósitos?
“É necessário modificar a visão, diante dos corações e mentes enfermos que constituem os nossos amigos, que gostaríamos se encontrassem em outra situação evolutiva, portanto, de entendimento.
“Auxiliemos, desse modo, aos ingratos ao nosso lado e aos difíceis para conosco, e treinar-nos-emos para os cometimentos mais graves, que nos aguardam no futuro, precedendo à nossa libertação gloriosa.”
Calou-se o Sublime Benfeitor e diluiu-se na noite varrida por leve, perfumada brisa do vale próximo, salpicada de astros fulgurantes.
Simão Pedro compreendeu a mensagem oportuna, levantou-se, e, a partir dali, jamais se permitiu desânimo ou queixa, compreendendo os companheiros da retaguarda da evolução, porém cumprindo com o seu dever até o momento da sua crucificação de cabeça para baixo, em Roma, anos mais tarde, por integral amor a Jesus.


[1] Fonte: Livro – Há flores no caminho – ditado do Espírito Amélia Rodrigues, psicografia de Divaldo Pereira Franco, Ed LEAL, 3.“ edição Capitulo 6

sábado, 8 de fevereiro de 2020

Estudando Missionário da Luz - A epífise

A EPÍFISE[1]
Enquanto o nosso companheiro se aproveitava da organização mediúnica, vali-me das forças magnéticas que o instrutor me fornecera, para fixar a máxima atenção no médium. Quanto mais lhe notava as singularidades do cérebro, mais admirava a luz crescente que a epífise deixava perceber. A glândula minúscula transformara-se em núcleo radiante e, em derredor, seus raios formavam um lótus de pétalas sublimes.
Examinei atentamente os demais encarnados. Em todos eles, a glândula apresentava notas de luminosidade, mas em nenhum brilhava como no intermediário em serviço.
Sobre o núcleo, semelhante agora a flor resplandecente, caía luzes suaves, de Mais Alto, reconhecendo eu que ali se encontravam em jogo vibrações delicadíssimas, imperceptíveis para mim.
Estudara a função da epífise nos meus apagados serviços de médico terrestre. Segundo os orientadores clássicos, circunscreviam-se suas atribuições ao controle sexual no período infantil. Não passava de velador dos instintos, até que as rodas da experiência sexual pudessem deslizar com regularidade, pelos caminhos da vida humana. Depois, decrescia em força, relaxava-se, quase desaparecia, para que as glândulas genitais a sucedessem no campo da energia plena.
Minhas observações, ali, entretanto, contrastavam com as definições dos círculos oficiais.
Como o recurso de quem ignora é esperar pelo conhecimento alheio; aguardei Alexandre para elucidar-me, findo o serviço ativo.
Passados alguns minutos, o generoso mentor acercava-se de mim.
Não esperou que me explicasse.
- Conheço-lhe a perplexidade - falou. Também passei pela mesma surpresa, noutro tempo. A epífise é agora uma revelação para você.
- Sem dúvida - acrescentei.
- Não se trata de órgão morto, segundo velhas suposições - prosseguiu ele. - É a glândula da vida mental. Ela acorda no organismo do homem, na puberdade, as forças criadoras e, em seguida, continua a funcionar como o mais avançado laboratório de elementos psíquicos da criatura terrestre. O neurologista comum não a conhece bem. O psiquiatra devassar-lhe-á, mais tarde, os segredos. Os psicólogos vulgares ignoram-na. Freud interpretou-lhe o desvio, quando exagerou a influenciação da “libido”, no estudo da indisciplina congênita da Humanidade. Enquanto no período do desenvolvimento infantil, fase de reajustamento desse centro importante do corpo perispiritual preexistente, a epífise parece constituir o freio às manifestações do sexo; entretanto, há que retificar observações.
Aos catorze anos, aproximadamente, de posição estacionária, quanto às suas atribuições essenciais, recomeça a funcionar no homem reencarnado. O que representava controle é; fonte criadora e válvula de escapamento. A glândula pineal reajusta-se ao concerto orgânico e reabre seus mundos maravilhosos de sensações e impressões na esfera emocional. Entrega-se a criatura à recapitulação da sexualidade, examina o inventário de suas paixões vividas noutra época, que reaparecem sob fortes impulsos.
Achava-me profundamente surpreendido.
Findo o intervalo que impusera à exposição do ensinamento, Alexandre continuou:
- Ela preside aos fenômenos nervosos da emotividade, como órgão de elevada expressão no corpo etéreo. Desata, de certo modo, os laços divinos da Natureza, os quais ligam as existências umas às outras, na seqüência de lutas, pelo aprimoramento da alma, e deixa entrever a grandeza das faculdades criadoras de que a criatura se acha investida.
- Deus meu! - exclamei - e as glândulas genitais, onde ficam?
O instrutor sorriu e esclareceu:
- São demasiadamente mecânicas, para guardarem os princípios sutis e quase imponderáveis da geração. Acham-se absolutamente controladas pelo potencial magnético de que a epífise é a fonte fundamental. As glândulas genitais segregam os hormônios do sexo, mas a glândula pineal, se me posso exprimir assim, segrega “hormônios psíquicos” ou “unidades-força” que vão atuar, de maneira positiva, nas energias geradoras. Os cromossomos da bolsa seminal não lhe escapam a influenciação absoluta e determinada.
Alexandre fez um gesto significativo e considerou:
- No entanto, não estamos examinando problemas de embriologia.
Limitemo-nos ao assunto inicial e analisemos a epífise, como glândula da vida espiritual do homem.
Dentro de meu espanto, guardei rigoroso silêncio, faminto de instruções novas.
- Segregando delicadas energias psíquicas - prosseguiu ele -, a glândula pineal conserva ascendência em todo o sistema endocrínico.
Ligada à mente, através de princípios eletromagnéticos do campo vital, que a ciência comum ainda não pode identificar, comanda as forças subconscientes sob a determinação direta da vontade. As redes nervosas constituem-lhe os fios telegráficos para ordens imediatas a todos os departamentos celulares, e sob sua direção efetuam-se os suprimentos de energias psíquicas a todos os armazéns autônomos dos órgãos. Manancial criador dos mais importantes, suas atribuições são extensas e fundamentais.
Na qualidade de controladora do mundo emotivo, sua posição na experiência sexual é básica e absoluta. De modo geral, todos nós, agora ou no pretérito, viciamos esse foco sagrado de forças criadoras, transformando-o num imã relaxado, entre as sensações inferiores de natureza animal. Quantas existências; temos despendido na canalização de nossas possibilidades espirituais para os campos mais baixos do prazer materialista?
Lamentavelmente divorciados da lei do uso, abraçamos os desregramentos emocionais, e daí, meu caro amigo, a nossa multimilenária viciação das energias geradoras, carregados de compromissos morais, com todos aqueles a quem ferimos com os nossos desvarios e irreflexões.
Do lastimável menosprezo a esse potencial sagrado, decorrem os dolorosos fenômenos da hereditariedade fisiológica, que deveria constituir, invariavelmente, um quadro de aquisições abençoadas e puras. A perversão do nosso plano mental consciente, em qualquer sentido da evolução, determina a perversão de nosso psiquismo inconsciente, encarregado da execução dos desejos e ordenações mais íntimas, na esfera das operações automáticas.
À vontade desequilibrada desregula o foco de nossas possibilidades criadoras. Daí procede a necessidade de regras morais para quem, de fato, se interesse pelas aquisições eternas nos domínios do Espírito. Renúncia, abnegação, continência sexual e disciplina emotiva não representam meros preceitos de feição religiosa. São providências de teor científico, para enriquecimento efetivo da personalidade. Nunca fugiremos à lei, cujos artigos e parágrafos do Supremo Legislador abrangem o Universo.
Ninguém enganará a Natureza. Centros vitais desequilibrados obrigarão a alma à permanência nas situações de desequilíbrio.
Não adianta alcançar a morte física, exibindo gestos e palavras convencionais, se o homem não cogitou do burilamento próprio.
A Justiça que rege a Vida Eterna jamais se inclinou. É certo que os sentimentos profundos do extremo instante do Espírito encarnado cooperam decisivamente nas atividades de regeneração além do túmulo, mas não representam a realização precisa.
O instrutor falava em tom sublime, pelo menos para mim, que, pela primeira vez, ouvia comentários sobre consciência, virtude e santificação, dentro de conceitos estritamente lógicos e científicos no campo da razão.
Agora, aclaravam-se-me os raciocínios, de modo franco. Receber um corpo, nas concessões do reencarnacionismo, não é ganhar um barco para nova aventura, ao acaso das circunstâncias, mas significa responsabilidade definida nos serviços de aprendizagem, elevação ou reparação, nos esforços evolutivos ou redentores.
- Compreende, agora, as funções da epífise no crescimento mental do homem e no enriquecimento dos valores da alma? - indagou-me o orientador.
- Sim... - respondi sob impressão forte.
- Segregando “unidades-força” - continuou -, pode ser comparada a poderosa usina, que deve ser aproveitada e controlada, no serviço de iluminação, refinamento e benefício da personalidade e não relaxada em gasto excessivo do suprimento psíquico, nas emoções de baixa classe. Refocilar-se no charco das sensações inferiores, à maneira dos suínos, é retê-la nas correntes tóxicas dos desvarios de natureza animal, e, na despesa excessiva de energias sutis, muito dificilmente consegue o homem levantar-se do mergulho terrível nas sombras, mergulho que se prolonga, além da morte corporal. Em vista disso, é indispensável cuidar atentamente da economia de forças, em todo serviço honesto de desenvolvimento das faculdades superiores.
Os materialistas da razão pura, senhores de vastos patrimônios intelectuais, perceberam de longe semelhantes realidades e, no sentido de preservar a juventude, a plástica e a eugenia, fomentaram a prática do esporte, em todas as suas modalidades. Contra os perigos possíveis, na excessiva acumulação de forças nervosas, como são chamadas às secreções elétricas da epífise; aconselharam aos moços de todos os países o uso do remo, da bola, do salto, da barra, das corridas a pé. Desse modo, preservavam-se os valores orgânicos, legítimos e normais, para as funções da hereditariedade.
A medida, embora satisfaça em parte, é, contudo, incompleta e defeituosa. Incontestavelmente, a ginástica e o exercício controlados são fatores valiosos de saúde; a competição esportiva honesta é fundamento precioso de socialização; no entanto, podem circunscrever-se a meras providências, em benefício dos ossos, e, por vezes, degenera-se em elástico das paixões menos dignas.
São muito raros ainda, na Terra, os que reconhecem a necessidade de preservação das energias psíquicas para engrandecimento do Espírito eterno.
O homem vive esquecido de que Jesus ensinou a virtude como esporte da alma, e nem sempre se recorda de que, no problema do aprimoramento interior, não se trata de retificar a sombra da substância e sim a substância em si mesma.
Ouvia-lhe as instruções, entre a emotividade e o assombro.
- Entende, agora, como é importante renunciar? Percebe a grandeza da lei de elevação pelo sacrifício? A sangria estimula a produção de células vitais, na medula óssea; a poda oferece beleza, novidade e abundância nas árvores. O homem que pratica verdadeiramente o bem vive no seio de vibrações construtivas e santificantes da gratidão, da felicidade, da alegria. Não é fazer teoria de esperança. É princípio científico, sem cuja aplicação, na esfera comum, não se liberta a alma, descentralizada pela viciação nas zonas mais baixas da Natureza, E porque observasse que as instruções lhe tomavam demasiado tempo, Alexandre concluiu:
- De acordo com as nossas observações, a função da epífise na vida mental é muito importante.
- Sim - considerei -, compreendo agora a substancialidade de sua influenciação no sexo e entendo igualmente a dolorosa e longa tragédia sexual da Humanidade. Percebo, nitidamente, o porquê dos dramas que se sucedem ininterruptos, as aflições que parecem nunca chegar ao fim, as ansiedades que esbarram no crime, o cipoal do sofrimento, envolvendo lares e corações.
- E o homem sempre disposto a viciar os centros sagrados de sua personalidade - concluiu Alexandre, solenemente -, sempre inclinado a contrair novos débitos, mas dificilmente decidido a retificar ou pagar.
- Compreendo, compreendo...
E, asilando certas dúvidas, exclamei:
- Não seria então mais razoável...
O orientador cortou-me a palavra e esclareceu: - Já sei o que deseja indagar.
E, sorrindo:
- Você pergunta se não seria mais interessante encerrar todas as experiências do sexo, sepultar as possibilidades do renascimento carnal. Semelhante indagação, no entanto, é improcedente.
Ninguém deve agir contra a lei. O uso respeitável dos patrimônios da vida, a união enobrecedora, a aproximação digna, constituem o programa de elevação. É, portanto, indispensável distinguir entre harmonia e desequilíbrio, evitando o estacionamento em desfiladeiros fatais.
Ditas estas palavras, Alexandre calou-se, como orientador criterioso que deixa ao discípulo o tempo necessário para digerir a lição.


[1] Fonte: Missionário da Luz, Ditado pelo Espírito André Luiz, psicografia de Francisco Cândido Xavier, Editora FEB, Capitulo 2