Nossa autonomia, tanto física, emocional, mental como espiritual, está
diretamente ligada às nossas conquistas e descobertas íntimas.
As dificuldades de nosso desenvolvimento e crescimento espiritual se
devem ao fato de que nem sempre conseguimos encontrar com facilidade nossa
própria maneira de viver e evoluir. Cada um de nós está destinado a participar
de uma maneira específica e peculiar na obra da criação.
Entretanto, é imprescindível compreendermos nosso valor pessoal como
seres originais, ou seja, criados por Deus “sob medida”, percorrendo,
particularmente, nosso caminho e assumindo por completo a responsabilidade pelo
nosso próprio crescimento espiritual.
Ser nós mesmos é tomar decisões, não para agradar os outros que nos
observam, mas porque estamos usando, consciente e responsavelmente, nossa
capacidade de ser, sentir, pensar e agir.
Ser nós mesmos é eliminar os traços de dependência que nos atam às
outras pessoas. Não nos esquecendo, porém, de respeitar-lhes a liberdade e a
individualidade e de defender também a nossa, sem o medo de ficar só e
desamparado.
Ser nós mesmos é viver na própria “simplicidade de ser”, “libertos da
vaidosa e dissimulada auto-satisfação, que consiste em fazer gênero de “diferente”
perante os outros, a fim de ostentar uma aparência de “personalidade marcante”.
Ser nós mesmos é acreditar em nosso poder pessoal, elaborando um mapa
para nossos objetivos e percorrendo os caminhos necessários para atingi-los. No Novo Testamento, capítulo 7:13, assim escreveu Mateus em seus apontamentos: “Entrai pela porta estreita, porque larga
é a porta e espaçoso o caminho que leva a perdição...”
Pelo fato de a porta ser estreita, deveremos atravessá-la — uns de cada
vez — completamente sozinhos, acompanhados apenas pelo mundo de nossos
pensamentos e conquistas íntimas.
A “porta é estreita”, porque ainda não entendemos que, mesmo vivendo em
comunidade, estaremos vivendo, essencialmente, com nós mesmos, pois para
transpor essa porta é preciso aprender a arte de “ser”.
Efetivamente, atingiremos nossa independência quando percebermos a
inutilidade dos passatempos, das viagens, do convencionalismo da etiqueta, do
consumismo que fazemos somente para conquistar a aprovação dos outros, e não
porque decorrem de nossa livre vontade.
Eliminar o domínio, a autoridade ou a influência das idéias, das
pessoas, das diversões, dos instintos, do trabalho e dos lugares não significa
que precisamos extirpar ou abandonar completamente todas essas coisas, mas
somente a dependência. Podemos nos ocupar desses assuntos quando bem quisermos,
conforme nossas necessidades e conveniências, sem a escravidão do
condicionamento doentio.
Passar por esse “trajeto restrito” é ter a coragem de romper as amarras
internas e externas que nos impedem a conquista da liberdade.
Perguntemo-nos: quantos dos nossos atos e atitudes são subprodutos de
nossas dependências estruturadas na subordinação da sociedade?
A submissão social tem sua base inicial na busca de aprovação dos
outros, colocando os indivíduos na posição de permanentes escravos e pedintes
do aplauso hipócrita e do verniz da lisonja.
A travessia desse “longo caminho ermo” nos levará ao Reino dos Céus,
estruturado e localizado na essência de nós mesmos. Para tanto, devemos
recordar-nos de que as Leis Divinas estão escritas na nossa consciência,
cabendo-nos aprender a interpretá-las em nós e por nós mesmos.
Jesus Cristo, constantemente, referia-se a esse Reino Interior como
sendo a morada de Deus em nós. Por voltarmos costumeiramente nossos olhos para
fora, e não para dentro de nós mesmos, é que nunca conseguimos vislumbrar as
riquezas de nosso mundo interior.
Mateus prossegue em seus comentários dizendo: “... apertado é o caminho que leva à vida, e poucos há que o encontrem.”
Por “vida” devemos entender não apenas a manutenção da vida biológica na Terra,
que é passageira e fugaz, mas a plenitude da Vida Superior, iniciada, sobretudo
na vivência do mundo interior.
Nossa autonomia, tanto física, emocional, mental como espiritual, está
diretamente ligada às nossas conquistas e descobertas íntimas. Nossa tão
almejada realização interior está relacionada com o conhecimento de nós mesmos.
“Apertado é o caminho”, porque exige esforços importantes para que
possamos eliminar nossos laços de dependência neurótica, os quais nos
condicionam a viver sem usufruir nossa liberdade interior, aceitando ser
manipulados pelos juízos e opiniões alheias. A liberdade se inicia no
pensamento para, posteriormente, materializar-se na exterioridade, quebrando,
então, os grilhões da dependência. Os Espíritos Amigos enfocaram o assunto com
muita sabedoria, afirmando: “No pensamento goza o homem de ilimitada
liberdade, pois que não há como pôr-lhe peias. Pode-se-lhe deter o vôo, porém,
não aniquilá-lo.” (59)
X.X.X
A capacidade de amar está presente na alma humana, mas, para que
floresça, exige maturação da consciência, isto é, “aprimoramento dos
sentimentos”.
A maioria das criaturas foi educada ouvindo fábulas e mitos do amor
romântico. Os tabus sexuais, as velhas estruturas familiares, as normas
tradicionais do matrimônio, consideradas “virtudes femininas”, estabeleceram,
na formação educacional das mulheres, todo um comportamento de dependência em
relação aos homens. Elas centraram suas vidas em outros indivíduos, preocupadas
em receber proteção e cuidados, e destruíram, com o tempo, suas vocações e
aptidões mais íntimas.
“São iguais perante Deus o homem e a mulher (...) outorgou Deus a ambos a inteligência do
bem e do mal e a faculdade de progredir.” (60)
Muitos acreditaram que o amor seria somente despertado por uma “varinha
de condão” ou por uma “flecha do cupido” que, ao tocá-los, acordasse das
profundezas de seu inconsciente um sentimento há muito tempo adormecido.
Existem aqueles que, ingênuos, passam uma encarnação inteira esperando que essa
“dádiva mágica” desabroche de repente, entre a procura e a espera do ser amado,
pagando desesperadamente qualquer preço.
Na atualidade, muitos educadores, psicólogos, antropólogos e psiquiatras
afirmam que a forma como usamos nossos sentimentos é uma “resposta aprendida”.
A capacidade de amar está presente na alma humana, mas, para que floresça,
exige maturação da consciência, Isto e, “aprimoramento dos sentimentos”.
Explicam, ainda, que a criatura aprende a utilizar o amor através de um
processo que está diretamente relacionado com o ambiente em que viveu na
infância e com o em que vive hoje, somando-se a tudo isso a capacidade íntima
de aprendizagem. Portanto, estamos constantemente “aprendendo a amar”.
Paralelamente, sabemos que as diversas vivências reencarnatórias
sedimentam na alma humana; certas predisposições singulares no entendimento do
amor. Os costumes, as tradições e os hábitos que envolvem o namoro, o
casamento, o sexo e a família, completamente diferentes de nação para nação, de
continente para continente, estabelecem noções diversificadas sobre a afetividade
nos espíritos em sua longa marcha evolutiva.
Existem aqueles que colocaram o amor dentro de uma estrutura romântica,
ou seja, fazem prevalecer um sentimentalismo exagerado e uma imaginação irreal,
desprezando o significado dos sentimentos autênticos. Eles acreditam que o
casamento extingue por completo todas as adversidades e infortúnios
existenciais e que as ansiedades do cotidiano acabariam, terminantemente,
quando a cerimônia sacramentasse num abraço de ternura os “felizes para toda a eternidade”.
A necessidade recíproca de controle, as promessas de que renunciariam à
própria individualidade e teriam os mesmos objetivos para todo o sempre são os
primeiros indícios de uma enorme desilusão na vida a dois. Compromissos de amor
são válidos, desde que aprendamos que nossa vida está em constante renovação.
Assim como as pessoas passam por diversas transformações, também o amor que
sentem pelos outros se transforma. Quanto mais observarmos os ciclos da vida,
mais entenderemos as transformações que ocorrem em nossa intimidade, porque nós
também somos vida. Apenas desse modo, ficaremos mais seguros e estáveis em
relação ao nosso desenvolvimento e amadurecimento afetivos.
A diferença fundamental entre
amor e dependência é observada com clareza nas ações e comportamentos das
criaturas. A dependência prende possessivamente, uma
pessoa à outra, enquanto o amor de fato incentiva a liberdade, a sinceridade
e a naturalidade.
O dependente é caracterizado
por demonstrar necessidade constante e por reclamar sistematicamente a atenção
do outro.
O indivíduo
dependente padece dos recursos psíquicos de alguém para viver. Ele dirá “eu o amo”, mas, em realidade, quer
dizer “eu preciso de você”, ou mesmo, “eu não vivo sem você”. O amor real
baseia-se no sentimento compartilhado entre duas pessoas maduras, ao passo que
o amor dependente implora consideração e carinho, infantilmente.
Os legítimos sentimentos da alma nunca se sujeitam a ordenações e
imposições, mas sim a uma completa espontaneidade de atitudes e emoções.
Dependência gera dores na alma; já a liberdade para amar é um direito natural
de todos os filhos de Deus.
Referencias:
59 LE 833 – Haverá no homem alguma coisa
que escape a todo constrangimento e pela qual goze ele de absoluta liberdade?
“No pensamento goza o homem de ilimitada liberdade, pois que não há como
pôr-lhe pejas. Pode-se-lhe deter o voo, porém, não aniquilá-lo.”
60 LE 817 – São iguais perante Deus o homem e a mulher e têm os mesmos direitos?
“Não outorgou Deus a ambos a inteligência do bem e do mal e a faculdade
de progredir?”