quinta-feira, 21 de abril de 2016

DOAÇÕES ESPIRITUAIS

DOAÇÕES ESPIRITUAIS
 Feliz daquele que destaca uma parcela do que possui, a benefício dos semelhantes!
Bem-aventurado aquele que dá de si próprio!
Através de todos os filtros do bem, o amor é sempre o mesmo,mas, enquanto as dádivas materiais, invariavelmente benditas, suprimem as exigências exteriores, as doações de espírito interferem no íntimo, dissipando as trevas que se acumulam no reino da alma.
Dolorosa a tortura da fome, terrível a calamidade moral.
Divide o teu pão com as vítimas da penúria, mas estende fraternas mãos aos que vagueiam mendigando o esclarecimento e o consolo que desconhecem. Não precisas procurá-los, de vez que te cercam em todos os ângulos do caminho... São amigos e por vezes te ferem com supostas atitudes de crueldade, quando apenas te esmolam conforto, comunicando-te, em forma de intemperança mental, as chamas de sofrimento que lhes calcinam os corações; categorizam-se por adversários e criam-te problemas, não por serem perversos, mas porque lhes faltam ainda as luzes do entendimento; aparecem por pessoas entediadas, que dispõem de todas as vantagens humanas para serem felizes, mas a quem falta uma voz verdadeiramente amiga, capaz de induzi-las a descobrir a tranquilidade e a alegria, através da sementeira das boas obras; surgem na figura de criaturas consideradas indesejáveis e viciosas, cujo desequilíbrio nada mais é que a expectativa frustrada do amparo afetivo que suplicaram em vão!...
Para atender aos que carecem de apoio físico, é preciso bondade; no entanto, para arrimar os que sofrem necessidades da alma, é preciso bondade com madureza.
Se já percebes que nem todos estão no mesmo degrau evolutivo, auxilia com a tua palavra ou com o teu silêncio, ou com o teu gesto ou com a tua decisão no plantio da união e da concórdia, da esperança e do otimismo, no terreno em que vives!...
Compreender e compreender para a sustentação da lavoura do bem que se cobrirá de frutos para a felicidade geral.
Não te digas em solidão para fazer tanto... Refletindo em nossos deveres, antes as doações espirituais, lembremo-nos de Jesus. Nos dias de fome da turba inquieta, reunia-se o Divino mestre com os amigos para beneficiar a milhares; entretanto, na hora do extremo sacrifício, quando lhe cabia socorrer as vítimas da ignorância e do ódio, da violência e do fanatismo, ele sozinho fez o donativo de si mesmo, em favor de milhões.
DESPORTOS
Se há esportes que auxiliam o corpo, há esportes que ajudam a alma...
A marcha do dever retamente cumprido.
A regata do suor no trabalho.
O exercício do devotamento ao estudo.
O salto do esforço, acima dos obstáculos.
A maratona das boas obras.
O torneio da gentileza.
O mergulho no silêncio, diante da injúria.
O nado da paciência nas horas difíceis.
A ginástica da tolerância perante as ofensas.
O Voo do pensamento às esferas superiores.
A demonstração de resistência moral nas provas de cada dia.
Todos esses desportos do espírito podem ser praticados em todas as idades e condições.
E creia que qualquer campeonato num deles será prêmio de luz em seu coração, a brilhar para sempre.


E – Cap. IX – Item 7
L – Questão 893

Temas Estudados:
Aparência e realidade
Bondade e madureza de espírito
Caridade material e caridade moral
Compreensão e felicidade
Dádivas
Esporte da alma



Livro Estude e Viva, Psicografia Francisco C. Xavier e Waldo Vieira, ditado pelos Espíritos André Luiz e Emmanuel, Ed FEB.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

SÉRIE BOA NOVA - AMOR E RENÚNCIA



AMOR E RENÚNCIA
O manto da noite caía de leve sobre a paisagem de Cafarnaum e Jesus, depois de uma das grandes assembleias populares do lago, se recolhia à casa de Pedro em companhia do apóstolo. Com a sua palavra divina havia tecido luminosos comentários em torno dos mandamentos de Moisés; Simão, no entanto, ia pensativo como se guardasse uma dúvida no coração.
Inquirido com bondade pelo Mestre, o apóstolo esclareceu:
— Senhor, em face dos vossos ensinamentos; como deveremos interpretar a vossa primeira manifestação, transformando a água em vinho, nas bodas de Caná?  Não se tratava de uma festa mundana?  O vinho não iria cooperar para o desenvolvimento da embriaguez e da gula?
Jesus compreendeu o alcance da interpelação e sorriu.
— Simão — disse ele — conheces a alegria de servir a um amigo?
Pedro não respondeu pelo que o Mestre continuou:
— As bodas de Caná foram um símbolo da nossa união na Terra. O vinho, ali, foi bem o da alegria com que desejo selar a existência do Reino de Deus nos corações. Estou com os meus amigos e amo-os a todos. Os afetos d’alma, Simão, são laços misteriosos que nos conduzem a Deus. Saibamos santificar a nossa afeição, proporcionando aos nossos amigos o máximo da alegria; seja o nosso coração uma sala iluminada onde eles se sintam tranquilos e ditosos. Tenhamos sempre júbilos novos que os reconfortem, nunca contaminemos a fonte de sua simpatia com a sombra dos pesares! As mais belas horas da vida são as que empregamos em amá-los, enriquecendo- lhes as satisfações íntimas.
Contudo, Simão Pedro, manifestando a estranheza que aquelas advertências lhe causavam, interpelou ainda o Mestre, com certa timidez:
— E como deveremos proceder quando os amigos não nos entendam, ou quando nos retribuam com ingratidão? Jesus pôs nele o olhar lúcido e respondeu:
— Pedro, o amor verdadeiro e sincero nunca espera recompensas. A renúncia é o seu ponto de apoio, como o ato de dar é a essência de sua vida. A capacidade de sentir grandes afeições já é em si mesma um tesouro. A compreensão de um amigo deve ser para nós a maior recompensa. Todavia, quando a luz do entendimento tardar no espírito daqueles a quem amamos, deveremos lembrar-nos de que temos a sagrada compreensão de Deus, que nos conhece os propósitos mais puros. Ainda que todos os nossos amigos do mundo se convertessem, um dia, em nossos adversários, ou mesmo em nossos algozes, jamais nos poderiam privar da alegria infinita de lhes haver dado alguma coisa!...
E com o olhar absorto na paisagem crepuscular, onde vibravam sutis harmonias, Jesus ponderou, profeticamente:
- O vinho de Caná poderá, um dia, transformar-se no vinagre da amargura; contudo, sentirei, mesmo assim, júbilo em absorvê-lo, por minha dedicação aos que vim buscar para o amor do Todo-Poderoso.
Simão Pedro, ante a argumentação consoladora e amiga do Mestre, dissipou as suas derradeiras dúvidas, enquanto a noite se apoderava do ambiente, ocultando o conjunto das coisas no seu leque imenso de sombras.
***
Muito tempo ainda não decorrera sobre essa conversação, quando o Mestre, em seus ensinos, deixou perceber que todos os homens, que não estivessem decididos a colocar o Reino de Deus acima de país, mães e irmãos terrestres, não podiam ser seus discípulos.
No dia desses novos ensinamentos, terminados os labores evangélicos, o mesmo apóstolo interpelou o Senhor, na penumbra de suas expressões indecisas:
– Mestre, como conciliar estas palavras tão duras com as vossas anteriores observações, relativamente aos laços sagrados entre os que se estimam?!
Sem deixar transparecer nenhuma surpresa Jesus esclareceu:
– Simão, a minha palavra não determina que o homem quebre os elos santos de sua vida; antes exalta os que tiverem a verdadeira fé para colocar o poder de Deus acima de todas as coisas e de todos os seres da criação infinita.
Não constitui o amor dos pais uma lembrança da bondade permanente de Deus?
Não representa o afeto dos filhos um suave perfume do coração?!
Tenho dado aos meus discípulos o título de amigos, por ser o maior de todos.
“O Evangelho – continuou o Mestre, estando o apóstolo a ouvi-la, atentamente – não pode condenar os laços de família, mas coloca acima deles o laço indestrutível da paternidade de Deus. O reino do céu no coração deve ser o tema central de nossa vida.” Tudo mais é acessório. A família, no mundo, está igualmente subordinada aos imperativos dessa, edificação.
Já pensaste Pedro, no supremo sacrifício de renunciar?
Todos os homens sabem conservar, são raros os que sabem privar-se. Na construção do reino de Deus, chega um instante de separação, que é necessário se saiba suportar com sincero, desprendimento. E essa separação não é apenas a que se verifica pela morte do corpo, muitas vezes proveitosa e providencial, mas também a das posições estimáveis no mundo, a da família terrestre, a do viver nas paisagens queridas, ou, então, a de uma alma bem-amada que preferiu ficar a distância, entre as flores venenosas de um dia!...
“Ah! Simão, quão poucos sabem partir, por algum tempo, do lar tranquilo, ou dos braços adorados de uma afeição, por amor ao reino que é o tabernáculo da vida eterna!! Quão poucos saberão suportar a calunia, o apodo, a indiferença, por desejarem permanecer dentro de suas criações individuais, cerrando ouvidos à advertência do céu para que se afastem tranquilamente!... Como são raros os que sabem ceder e partir em silêncio, por amor ao reino, esperando o instante em que Deus se pronuncia! Entretanto, Pedro, ninguém se edificará, sem conhecer cada virtude de saber renunciar com alegria, em obediência à vontade de Deus, no momento oportuno, compreendendo a sublimidade de seus desígnios. Por essa razão, os discípulos necessitam aprender a partir e a esperar onde as determinações de Deus os conduzam, porque a edificação do reino do céu no coração dos homens deve constituir a preocupação primeira, a aspiração mais nobre da alma, as esperanças centrais do espírito!..
Ainda não havia anoitecido. Jesus, porém, deu por concluídas as suas explicações, enquanto as mãos calosas do apóstolo passavam, de leve, sobre os seus olhos úmidos.
***
Dando o testemunho real de seus ensinamentos, o Cristo soube ser, em todas as circunstâncias, o amigo fiel e dedicado. Nas elucidações de João, vemo-lo a exclamar: – “Já não vos chamo servos, porque o servo não sabe o que faz o seu senhor; tenho-vos chamado amigos, porque vos revelei tudo quanto ouvi de meu Pai!” E, na narrativa de Lucas, ouvimo-lo dizer, antes da hora extrema: – “Tenho desejado anuías ente comer convosco esta Páscoa, antes da minha paixão”.
Ninguém no mundo já conseguiu elevar à altura em que o Senhor as colocou a beleza e a amplitude doe elos afetivos, mesmo porque a sua obra inteira é a de reunir, pelo amor, todas as nações e todos os homens, no círculo divino da família universal. Mas, também, por demonstrar que o reino de Deus deve constituir a preocupação primeira das almas, ninguém. como ele soube retirar-se das posições, no instante oportuno em que obedecia aos desígnios divinos. Depois da magnífica vitória da entrada em Jerusalém, é traído por um dos discípulos amados; negam-no os seus seguidores e companheiros; suas ideias são tidas como perversoras e revolucionárias; é acusado como bandido e feiticeiro; sua morte passa por ser a de um ladrão.
Jesus, entretanto, ensina às criaturas, nessa hora suprema, a excelsa virtude de retirar-se com a solidão dos homens, mas com a proteção de Deus. Ele, que transformara toda a Galiléia numa fonte divina; que se levantara com desassombro contra as hipocrisias do farisaísmo do tempo; que desapoiara os cambistas, no próprio templo de Jerusalém, como advogado enérgico e superior de todas as grandes causas da verdade e do bem, passa, no dia do Calvário, em espetáculo para o povo, com a alma num maravilhoso e profundo silêncio.
Sem proferir a mais leve acusação, caminha humilde, coroado de espinhos, sustendo nas mãos uma cana imunda à guisa de cetro, vestindo a túnica da ironia, sob as cusparadas dos populares exaltados, de faces sangrentas e passas vacilantes, sob o peso da cruz, vilipendiado, sem articular uma queixa.
No momento do Calvário, Jesus atravessa as ruas de Jerusalém, como se estivesse diante da humanidade inteira, ensinando a virtude da renuncia por amor do reino de Deus, revelando ser essa a sua derradeira lição.



Livro: Boa Nova, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Irmão X (Humberto de Campos) , Ed FEB.

domingo, 17 de abril de 2016

SERIE BOA NOVA - FAMÍLIA DE ZEBEDEU

A FAMÍLIA DE ZEBEDEU
Na manhã que se seguiu primeira manifestação da sua palavra defronte do Tiberíades, o Mestre se aproximou de dois jovens que pescavam nas margens e os convocou para o seu apostolado:
— Filhos de Zebedeu — disse, bondoso — desejais participar das alegrias da Boa-Nova?!
Tiago e João, que já conheciam as pregações do Batista e que o tinham ouvido na véspera, tomados de emoção, se lançaram para ele, transbordantes de alegria:
— Mestre! Mestre! — Exclamavam felizes.
Como se fossem irmãos bem-amados que se encontrassem depois de longa ausência, tocados pela farsa do amor que se irradiava do Cristo, fonte inspiradora das mais profundas dedicações, falaram largamente da Ventura de sua união perene, no futuro, das esperanças com que deveriam avançar para o porvir, proclamando as belezas do esforço pelo Evangelho do Reino. Os dois rapazes galileus eram de temperamento apaixonado. Profundamente generosos, tinham carinhosas e simples, ardentes e sinceras as almas. João tomou das mãos do Senhor e beijou-as afetuosamente, enquanto Jesus lhe acariciava os anais macios dos cabelos.
Tiago, como se quisesse hipotecar a sua solidariedade inteira, aproximou-se do Messias e lhe colocou a destra sobre os ombros, em amoroso transporte.
Os dois novos apóstolos, entretanto, eram ainda muito jovens e, em regressando casa com o espírito arrebatado por imensa alegria, relataram sua mãe o que se passara.
Salomé, a esposa de Zebedeu, apesar de bondosa e sensível, recebeu a noticia com certo cuidado. Também ela ouvira o profeta de Nazaré nas suas gloriosas afirmativas da véspera. Pôs-se então a ponderar consigo mesma: não estaria próximo aquele reino prometido por Jesus? Quem sabe se o filho de Maria não falava na cidade em nome de algum príncipe?
Ali! o Cristo deveria ser o intérprete de algum desconhecido ilustre que recrutava adeptos entre os homens trabalhadores e mais fortes. A quem seriam confiados os postos mais altos, dentro da nova fundação? Seus filhos queridos bem os mereciam. Precisava agir, enquanto era tempo. O povo, de há muito, falava em revolução contra os romanos e os comentadores mais indiscretos anteviam a queda próxima dos Antipas. O novo reinado estava próximo e, alucinada pelos sonhos maternais, Salomé procurou o Messias, no circulo dos seus primeiros discípulos.
— Senhor — disse, atenciosa — logo após a instituição do teu reino, eu desejaria que os meus filhos se sentassem um tua direita e outro à tua esquerda, como as duas figuras mais nobres do teu trono.
Jesus sorriu e obtemperou com gesto bondoso:
— Antes de tudo, preciso saber se eles quererão beber do meu cálice!...
A genitora dos dois jovens embaraçou-se. Além disso, o grupo que rodeava o Messias a observava com indiscrição e manifesta curiosidade. Reconhecendo que o instante não lhe permitia mais amplas explicações, retirou-se apressada, colocando o seu velho esposo ao corrente dos fatos.
Ao entardecer, cessado o labor do dia, Zebedeu acompanhado pelos dois filhos procurou o Mestre em casa de Simeão. Jesus lhes recebeu a visita com extremo carinho, enquanto o velho galileu expunha as suas razões, humilde e respeitoso.
— Zebedeu — respondeu-lhe Jesus — tu, que conheces a lei e lhe guardas os preceitos no coração, sabes de algum profeta de Deus que, no seu tempo, fosse amado pelos homens do mundo?
— Não, Senhor.
— Que fizeram de Moisés, de Jeremias, de Jonas? Todos os emissários da verdade divina foram maltratados e trucidados, ou banidos do berço em que nasceram. Na Terra, o preço do amor e da verdade tem sido o martírio e a morte.
O pai de Tiago e de João ouvia-o humilde e repetia: — Sim Senhor.
E Jesus, como se aproveitasse o momento para esclarecer todos os pontos em dúvida, continuou:
— O reino de Deus tem de ser fundado no coração das criaturas; o trabalho árduo e o meu gozo; o sofrimento o meu cálice; mas, o meu Espírito se ilumina da sagrada certeza da vitória.
— Então, Senhor — exclamou Zebedeu, respeitoso — o vosso reino é o da paz e da resignação que os crentes de Elias esperavam.
Jesus com um sorriso de benignidade acrescentou:
— A paz da consciência pura e a resignação suprema à vontade de meu Pai são do meu reino; mas os homens costumam falar de uma paz que é ociosidade de espírito e de uma resignação que é vício do sentimento. Trago comigo as armas para que o homem combata os inimigos que lhe subjugam o coração e não descansarei enquanto não tocarmos o porto da vitória. Eis por que o meu cálice, agora, tem de transbordar de fel, que são os esforços ingentes que a obra reclama.
E, como se quisesse pormenorizar os esclarecimentos, prosseguiu:
— Há homens poderosos no mundo que morrem comodamente em seus palácios, sem nenhuma paz no coração, transpondo em desespero e com a noite na consciência os umbrais da eternidade; há lutadores que morrem na batalha de todos os momentos, muita vez vencidos e humilhados, guardando, porém, completa serenidade de espírito, porque, em todo o bom combate, repousaram o pensamento no seio amoroso de Deus. Outros há que aplaudem o mal, numa falsa atitude de tolerância, para lhe sofrer amanhã os efeitos destruidores. Os verdadeiros discípulos das verdades do céu, esses não aprovam o erro, nem exterminam os que os sustentam. Trabalham pelo bem, porque sabem que Deus também está trabalhando. O Pai não tolera o mal e o combate, por muito amar a seus filhos. Vê, pois, Zebedeu, que o nosso reino é de trabalho perseverante pelo bem real da Humanidade inteira.
Enquanto os dois apóstolos fitavam em Jesus os olhos calmos e venturosos, Zebedeu o contemplava como se tivesse à sua frente o maior profeta do seu povo.
— Grande reino! — exclamou o velho pescador e, dando expansão ao entusiasmo que lhe enchia o coração, disse, ditoso:
- Senhor! Senhor! Trabalharemos convosco, prega o vosso Evangelho, aumentaremos o número dos seguidores!...
Ouvindo estas últimas palavras, o Mestre elucidou ênfase nas suas expressões:
Ouve Zebedeu! Nossa causa não é a do número; verdade e do bem. É certo que ela será um dia a do mundo inteiro, mas, até lá, precisamos esmagar do mal sob os nossos pés.
Por enquanto, o pertence aos movimentos da iniquidade. Á mentira e a tirania exigem exércitos e monarcas, espadas e riquezas imensas para dominarem as criaturas. O amor, porém, a de toda a glória e de toda a vida, pede um e sabe ser feliz. A impostura reclama intermináveis defensores, para espalhar a destruição; basta, no entanto, um homem bom para ensinar a verdade de exaltar-lhe as glórias eternas, confortando a infinita legião de seus filhos.
Quem será maior perante Deus? Dão que se congrega para entronizar a tirania, esmagando os pequeninos, ou um homem sozinho e bem-intencionado que com um simples sinal salva uma barca de pescadores?
Empolgado pela sabedoria daquelas considerações, Zebedeu perguntou:
Senhor, então o Evangelho não será bom para todos?
Em verdade — replicou o Mestre —, a mensagem Nova é excelente para todos; contudo, nem todos os homens são ainda bons e justos para com ela. É por isso que o Evangelho traz consigo o fermento da renovação e é ainda por isso que deixarei o júbilo e a energia como se as melhores armas aos meus discípulos. Exterminando o mal e cultivando o bem, a Terra será para nós um campo de batalha. Se um companheiro cair na luta, foi o mal que tombou nunca o irmão que, para nós outros, estará sempre de pé. Não repousaremos até ao dia da vitória final. Não nos deteremos numa falsa contemplação de Deus, à margem do caminho, porque o Pai nos falará através de todas as criaturas trazidas à boa estrada; estaremos juntos na tempestade, porque aí a sua voz se manifesta com mais retumbância.
Alegrar-nos-emos nos instantes transitórios da dor e da derrota, porque aí o seu coração amoroso nos dirá: "Vem, filho meu, estou nos teus sofrimentos com a luz dos meus ensinos!"
Combateremos os deuses dos triunfos fáceis, porque sabemos que a obra do mundo pertence a Deus, compreendendo que a sua sabedoria nos convoca para completá-la, edificando o seu reino de venturas sem-fim no íntimo dos corações.
Jesus guardou silêncio por instantes. João e Tiago se lhe aproximaram, magnetizados pelo seu olhar enérgico e carinhoso. Zebedeu, como se não pudesse resistir à própria emotividade, fechara os olhos, com o peito oprimido de júbilo. Diante de si, num vasto futuro espiritual, via o reino de Jesus desdobrar-se ao infinito. Parecia ouvir a voz de Abraão e o eco grandioso de sua posteridade numerosa. Todos abençoavam o Mestre num hino glorificador.
Até ali, seu velho coração conhecera a lei rígida e temera Jeová com a sua voz de trovão sobre as sarças de fogo; Jesus lhe revelara o Pai carinhoso e amigo de seus filhos, que acolhe os velhos, os humildes e os derrotados da sorte, com uma expressão de bondade sempre nova. O velho pescador de Cafarnaum soltou as lágrimas que lhe rebentavam do peito e ajoelhou-se.
Adiantando-se-lhe, Jesus exclamou:
— Levanta-te, Zebedeu! Os filhos de Deus vivem de pé para o bom combate!
Avançando, então, dentro da pequena sala, o pai dos apóstolos tomou a destra do Mestre e a umedeceu com as suas lágrimas de felicidade e de reconhecimento, murmurando:
— Senhor, meus filhos são vossos.
Jesus, atraindo-o docemente ao coração, lhe afagou os cabelos brancos, dizendo:
— Chora Zebedeu! Porque as tuas lágrimas de hoje são formosas e benditas!...
Temias a Deus; agora O ama; estavas perdido nos raciocínios humanos sobre a lei; agora, tens no coração a fonte da fé viva!





Livro: Boa Nova, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Irmão X (Humberto de Campos) , Ed FEB.

quinta-feira, 14 de abril de 2016

SERIE BOA NOVA - PRIMEIRAS PREGAÇÕES



PRIMEIRAS PREGAÇÕES
 Nos primeiros dias do ano 30, antes de suas gloriosas manifestações, avistou-se Jesus com o Batista, no deserto triste da Judeia, não muito longe das areias ardentes da Arábia. Ambos estiveram juntos, por alguns dias, em plena Natureza, no campo ríspido do jejum e da penitência do grande precursor, até que o Mestre Divino, despedindo-se do companheiro, demandou o oásis de Jericó, uma bênção de verdura e água, entre as inclemências da estrada agreste. De Jericó dirigiu-se então a Jerusalém, onde repousou, ao cair da noite.
Sentado como um peregrino, nas adjacências do templo, Jesus foi notado por um grupo de sacerdotes e pensadores ociosos, que se sentiram atraídos pelos seus traços de formosa originalidade e pelo seu olhar lúcido e profundo. Alguns deles se afastaram, sem maior interesse, mas Hanan, que seria, mais tarde, o juiz inclemente de sua causa, aproximou-se do desconhecido e dirigiu-se-lhe com orgulho:
– Galileu, que fazes na cidade?
– Passo por Jerusalém, buscando a fundação do Reino de Deus! – Exclamou o Cristo, com modesta nobreza.
– Reino de Deus? – tornou o sacerdote com acentuada ironia – E que pensas tu venha a ser isso?
– Êsse Reino é à obra divina no coração dos homens! – Esclareceu Jesus, com grande serenidade.
– Obra divina em tuas mãos? – Revidou Hanan, com uma gargalhada de desprezo.
E, continuando as suas observações irônicas, perguntou:
– Com que contas para levar avante essa difícil empresa? Quais são os teus seguidores e companheiros?... Acaso terás conquistado o apoio de algum príncipe desconhecido e ilustre, para auxiliar-te na execução de teus planos?
– Meus companheiros hão de chegar de todos os lugares. – Respondeu o Mestre com humildade.
– Sim – observou Hanan – os ignorantes e os tolos estão em toda parte da Terra.
Certamente que esse representará o material de tua edificarão. Entretanto, propões-te realizar uma obra, divina e já viste alguma estátua perfeita modelada em fragmentos de lama?
– Sacerdote – replicou-lhe Jesus, com energia serena – nenhum mármore existe mais puro e mais formoso do que o do sentimento, e nenhum cinzel é superior ao da boa vontade sincera.
Impressionado com a resposta firme e inteligente, o famoso juiz ainda interrogou:
– Conheces Roma ou Atenas '?
– Conheço o amor e a verdade. – Disse Jesus convictamente.
– Tens ciência dos códigos da Corte Provincial e das leis do Templo? – Inquiriu Hanan, inquieto.
– Sei qual é a vontade de meu Pai que está nos céus. – Respondeu o Mestre, brandamente.
O sacerdote o contemplou irritado e, dirigindo-lhe um sorriso de profundo desprezo, demandou a Torre Antônia, em atitude de orgulhosa superioridade.
No dia seguinte, pela manhã, o mesmo formoso peregrino foi ainda visto a contemplar as maravilhas do santuário, antes alguns minutos de internar-se pelas estradas banhadas de sol, a caminho de sua Galiléia distante.
Daí a alguma tempo, depois de haver passado por Nazaré, descasando igualmente em Caná, Jesus se encontrava nas circunvizinhanças da cidadezinha de Cafarnaum, como se procurasse, com viva atenção, algum amigo que estivesse à sua espera.
Em breves instantes, ganhou as margens do Tiberíades e se dirigiu; resolutamente, a um grupo alegre de pescadores, como se, de antemão, os conhecesse a todos.
A manhã era bela, no seu manto diáfano de radiosas neblinas. As águas transparentes vinham beijar os eloendros da praia, como se brincassem ao sopro das virações perfumadas da Natureza.
Os pescadores ecoavam- uma cantiga rude e, dispondo inteligentemente as barcaças móveis, deitavam as redes, em meio ele profunda alegria.
Jesus aproximou-se do grupo e, assim que dois deles desembarcaram em terra, falou-lhes com amizade :
– Simão e André, filhos de Jonas, venho da parte de Deus e vos convido a trabalhar pela instituição de seu reino na Terra!
André lembrou-se de já o ter visto, nas cercanias de Betsaida e do que lhe haviam dito a seu respeito, enquanto que Simão, embora agradavelmente surpreendido, o contemplava enleado. Mas, quase a um só tempo, dando expansão aos seus temperamentos acolhedores e sinceros, exclamaram, respeitosamente:
– Sede bem-vindo!...
Jesus então lhes falou docemente do Evangelho, com o olhar incendido de júbilos divinos.
Estando muitos outros companheiros do lago a observar de longe os três, André, manifestando a sua tocante ingenuidade, exclamou comovido:
– Um rei? Mas em Cafarnaum existem. Tão poucas casas...
Ao que Pedro obtemperou, como se a boa vontade devesse suprir todas as deficiências:
O lago é muito grande e há, várias aldeias circundando estas águas. O reino poderá abrangê-las todas!
-Isso dizendo, fixou em Jesus o olhar perquiridor, como se fora uma grande criança meiga, e sincera, desejosa de demonstrar, compreensão e bondade. O Senhor esboçou um sorriso sereno e, como se adiasse com prazer as suas explicações para mais tarde, inquiriu generosamente:
– Quereis ser meus discípulos?
André e Simão se interrogaram a si mesmos, permutando sentimentos de admiração embevecida. Refletia Pedro: que homem seria, aquele? Onde já lhe escutara o timbre carinhoso da voz íntima e familiar? Ambos os pescadores se esforçavam por dilatar o domínio de suas lembranças, de modo a encontrá-la nas recordações mais queridas. Não sabiam, porém, como explicar aquela fonte de confiança e de amor que lhes brotava no âmago do espírito e, sem hesitarem, sem uma sombra de dúvida, responderam simultaneamente:
– Senhor, seguiremos os teus passos.
Jesus os abraçou com imensa ternura e, como os demais companheiros se mostrassem admirados e trocassem entre aí ditérios ridicularizadores, o Mestre acompanhado de ambos e de grande grupo de curiosos, se encaminhou para o centro de Cafarnaum, onde se erguia a Intendência de Antipas. Entrou calmamente na coletoria e, avistando um funcionário culto, conhecido publicano da cidade, perguntou-lhe:
– Que fazes tu, Levi?
O interpelado fixou-o com surpresa; mas, seduzido pelo suave magnetismo de seu olhar, respondeu sem demora:
– Recolho os impostos do povo, devidos a Herodes.
– Queres vir comigo para recolher os bens do céu? – Perguntou-lhe Jesus, com firmeza e doçura.
Levi, que seria mais tarde o apóstolo Mateus, sem que pudesse definir as santas emoções que lhe dominaram a alma, atendeu comovido:
– Senhor; estou pronto!...
– Então, vamos. – Disse Jesus, abraçando-o.
Em seguida, o numeroso grupo se dirigiu para a casa de Simão Pedro, que oferecera ao Messias, acolhida sincera em sua residência humilde, onde o Cristo fez a primeira exposição de sua consoladora doutrina, esclarecendo que a adesão desejada era a do coração sincero e puro, para sempre, às claridades do seu reino. Iniciou-se naquele instante a eterna união dos inseparáveis companheiros.
***
Na tarde desse mesmo dia, o mestre fez a primeira pregação da Boa-Nova na praça ampla cercada de verdura e situada naturalmente junto às águas.
No céu, vibravam harmonias vespertinas, como se a tarde possuísse também uma alma sensível. As árvores vizinhas acenavam os ramos verdes ao vento do crepúsculo, como mãos da Natureza que convidassem os homens à celebração daquele primeiro ágape. As aves ariscas pousavam de leve nas alcaparreiras mais próximas, como se também desejassem senti-lo,
e na praia extensa se acotovelava a grande multidão de pescadores rústicos, de mulheres aflitas por continuadas flagelações, de crianças sujas e abandonadas, misturados publica-nos pecadores com homens analfabetos e simples que haviam acorrido, ansiosos por ouvi-lo.
Jesus contemplou a multidão e enviou-lhe um sorriso de satisfação. Contrariamente às ironias de Hanan, ele aproveitaria o sentimento como mármore precioso e a boa vontade como cinzel divino. Os ignorantes do mundo, os fracos, os sofredores, os desalentados, os doentes e os pecadores seriam em suas mãos o material de base para a sua construção eterna e sublime. Converteria toda miséria e toda dor num cântico de alegria e, tomado pelas inspirações sagradas de Deus, começou a falar da maravilhosa beleza do seu reino.
Magnetizado pelo seu amor, o povo o escutava num grande transporte de ventura. No céu, havia uma vibração de claridade desconhecida.
Ao longe, no firmamento de Cafarnaum, o horizonte se tornara um deslumbramento de luz e, bem no alto, na cúpula dourada e silenciosa, as nuvens delicadas e alvas tornavam a forma suave das flores e dos arcanjos do Paraíso.





Livro: Boa Nova, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Irmão X (Humberto de Campos) , Ed FEB.

TUA MENSAGEM


TUA MENSAGEM
 Tua mensagem não se constitui apenas do discurso ou do título de cerimônia com que te apresentas no plano convencional; é a essência de tuas próprias ações, a exteriorizar-se de ti, alcançando os outros.
Sem que percebas, quando te diriges aos companheiros para simples opiniões, em torno de sucessos triviais do cotidiano, estás colocando o teu modo de ser no que dizes; ao traçares ligeira frase, num bilhete aparentemente sem importância, derramas o conteúdo moral de teu coração naquilo que escreves; articulando referência determinada, posto que breve aponte o rumo de tuas inclinações; em adquirindo isso ou aquilo, entremostras o próprio senso de escolha; elegendo distrações, patenteia por elas os interesses que te regem a vida íntima...
Reflete na mensagem que expedes, diariamente, na direção da comunidade.
As tuas ideias e comentários, atos e diretrizes voam de ti, ao encontro do próximo, à feição das sementes que são transportadas para longe das árvores que as produzem.
Cultivemos amor e justiça, compreensão e bondade, no campo do espírito.
Guarda a certeza de que tudo quanto sintas e penses, fales e realizes é substância real de tua mensagem às criaturas e é claramente pelo que fazes às criaturas que a lei de causa e efeito, na Terra ou noutros mundos, te responde, em zelando por ti.
CONSCIÊNCIA E CONVENIÊNCIA
As boas soluções nem sempre são as mais fáceis e as manifestações corretas nem sempre as mais agradáveis.
A trilha do acerto exige muito mais as normas do esforço maior que as saídas circunstanciais ou os atalhos do oportunismo.
Nos mínimos atos, negócios, resoluções ou empreendimentos que você faça, busquem primeiro a substância "post-mortem" de que se reveste, porquanto, sem ela, seu tentame será superficial e sem consequências produtivas para o seu espírito.
Hoje como ontem, a criatura supõe-se em caminho tedioso tão só quando lhe falta alimento espiritual aos hábitos.
Alegria que dependa das ocorrências da terra a terra não tem duração.
Alegria real dimana da intimidade do ser.
Não há espetáculo externo de floração sem base na seiva oculta.
Meditação elevada; culto à prece, leitura superior e conversação edificante constituem adubo precioso nas raízes da vida.
Ninguém respira sem os recursos da alma.
Todos, carecemos de espiritualidade para transitar no cotidiano, ainda que a espiritualidade surja para muitos, sob outros nomes, nas ciências psicológicas de hoje que se colocam fora dos conceitos religiosos para a construção de edifícios morais.
À vista disso, criar costumes de melhoria interior significa segurança, equilíbrio, saúde e estabilidade à própria existência.
Debaixo de semelhante orientação, realmente não mais nos será possível manter ambiguidade nas atitudes.
Em cada ambiente, a cada hora, para cada um de nós, existe a conduta reta, a visão mais alta, o esforço mais expressivo, a porta mais adequada.
Atingido esse nível de entendimento, não mais é lícita para nós a menor iniciativa que imponha distinção indevida ou segregação lamentável, porque a noção de justiça nos regerá o comportamento, apontando-nos o dever para com todos na edificação da harmonia comum.
Estabelecidos por nós, em nós mesmos, os limites de consciência e conveniência, aprendemos que felicidade, para ser verdadeira, há de guardar essência eterna.
Constrangidos a encontrar a repercussão de nossas obras, além do plano físico, de que nos servirá qualquer euforia alicerçada na ilusão?
De que nos vale o compromisso com as exterioridades humanas, quando essas exterioridades não se fundamentam em nossas obrigações para com o bem dos outros, se a desencarnação
não poupa a ninguém? Cogitemos de felicidade, paz e vitória, mas escolhamos a estrada que nos conduza a elas sob a luz das realidades que norteiam a vida do Espírito, de vez que receberemos de retorno, na aduana da morte, todo o material que despachamos com destino aos outros, durante a jornada terrestre.
Não basta para nenhum de nós o contentamento de apenas hoje.
É preciso saber se estamos pensando, sentindo, falando e agindo para que o nosso regozijo de agora seja também regozijo depois.



ESE - Cap.V - Item 24
LE- Questão 918

Temas Estudados
Ação
Alegria real
Caminhos retos
Consciência além da Terra
Imperativo do discernimento
Influência pessoal



Livro Estude e Viva, Psicografia Francisco C. Xavier e Waldo Vieira, ditado pelos Espíritos André Luiz e Emmanuel, Ed FEB.

quarta-feira, 13 de abril de 2016

A RECEITA OPORTUNA

A RECEITA OPORTUNA
Anacleto, o alegre orientador de uma reunião evangélica, recebeu a visita da Dona Clotilde Serra, que se banhava nas irradiações da fé, plenamente rejuvenescida em seus ideais novos e, ouvindo-lhe a palavra amiga, quanto à provável admissão dela nos serviços do bem, aconselhou bondoso:
- Irmã Clotilde, comece a tarefa nas obras simples da oração. Encontrará precioso acesso à luz espiritual. Abrindo nossas almas às correntes sublimes que dimanam da prece, surgem para nós oportunidades mil de alegria e paz, sob a inspiração do Cristo.
A companheira reconhecida agradeceu e partiu entusiasta; mas, depois de um mês, informava a amigo invisível:
- Infelizmente, não pude atender à sugestão. Iniciando o trabalho, fui ferida pelo sarcasmo de muitos. Fui severamente criticada e muita gente considerou-me hipócrita...
-o-
-Minha amiga – obtemperou o benfeitor paciente – por que não ensaia a visitação dos enfermos? Há grande vantagem na sementeira de amizade e simpatia.
A consulente ausentou-se conformada, entretanto, alegava, depois de alguns dias:
-  Irmão Anacleto, não consegui obedecer-lhe a orientação. Junto aos doentes, recolhi chagas sem número. Não faltou quem me interpretasse por bajuladora na pista de legados e remunerações...
- Não esmoreça! – observou o instrutor – o trabalho útil é o nosso caminho para a luz. Auxilie as crianças! Há tanta promessa desamparada no reino infantil!... Jesus lhe abençoará o devotamento.
Dona Clotilde saiu encorajada, contudo, quando correram dois meses sobre a nova experiência, regressou clamando desalentada:
- Irmão, não me foi possível seguir adiante... Tentando socorrer os meninos abandonados, não faltou quem me designasse por sanguessuga da caridade e alguns vizinhos chegaram a caluniar-me, afirmando, de público, que meu apego Às criancinhas significava a reparação de crimes que não cometi...
Anotando as grossas lágrimas que lhe rolavam das faces, Anacleto afagou-a e ponderou calmo:
- Não se entristeça! Volte-se para as nossas irmãs desventuradas. Ampare, sem alarde, as mulheres infelizes que a necessidade arrastou aos despenhadeiros de ilusão!... Quem sabe? Talvez encontre uma lavoura preciosa de amor.
A sensível senhora ausentou-se, consolada, mas quando duas semanas se escoaram sobre o novo trabalho, tornou à reunião, choramingando:
-  Anacleto, não posso! Não posso!... a maldade, desta vez, foi excessivamente rude comigo... Imagine que, em me derramando no socorro fraternal, fui nomeada por mulher indigna do nome que me gabo de sustentar!...
- Doem-me fundamente semelhantes insultos!...
-o-
Registrando-lhe os soluços convulsivos, o prestimoso orientador sugeriu compadecidamente:
- Clotilde, tente a mediunidade no auxílio ao próximo. A enfermidade e a ignorância campeiam em quase todos os setores da luta humana. Faça alguma cousa. A grande questão é começar. Não dê entrada ao desânimo! Sigamos na vanguarda luminosa do bem! Mais vale uma candeia brilhante palidamente sobre o óleo da boa vontade que um milhão de comovedores discursos contra  domínio das trevas!...
-o-
Retirou-se a irmã tranquilizada e confiante, mas, após o transcurso de algumas semanas, voltou a grupo e reclamou:
-  Ah! Que tarefa ingrata nos impõe o ministério mediúnico! O médium é um joguete desventurado entre a curiosidade e a suspeição!  Por mais se esforce não encontra a segurança do apoio e da fé naqueles que o rodeiam, e acaba sempre qual me sinto, sucumbindo de dor entre a desconfiança e a malícia de quase todos os companheiros... Anacleto, Anacleto! Que será de mim?
-o-
Desta vez, porém, o mentor recolheu-se ao silêncio com visível tristeza e porque tardasse a resposta à servidora complicada inquiriu ansiosa:
- Que fazer, meu amigo? Como proceder? Auxilia-me com uma receita oportuna!...
Anacleto, contudo, razoavelmente desencantado, mas, ainda otimista, respondeu sereno:
-  Irmã Clotilde, compreendo agora o seu caso com mais clareza! O seu problema, por enquanto, é de medicina. Procure um especialista em moléstias de pele, com a presteza possível, e provavelmente, muito em breve poderá recomeçar...





Livro Histórias e anotações - Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito X, Ed FEB

terça-feira, 12 de abril de 2016

ESPEREMOS


ESPEREMOS

 “Não esmagará a cana quebrada e não apagará o morrão que fumega, até que faça triunfar o juízo.”
MATEUS,
Capítulo 12, versículo 20

Evita as sentenças definitivas, em face dos quadros formados pelo mal.
Da lama do pântano, o Supremo Senhor aproveita a fertilidade.
Da pedra áspera, vale-se da solidez.
Da areia seca, retira utilidades valiosas. Da substância amarga, extrai remédio salutar. O criminoso de hoje pode ser prestimoso companheiro amanhã.
O malfeitor, em certas circunstâncias, apresenta qualidades nobres, até então ignoradas, de que a vida se aproveita para gravar poemas de amor e luz.
Deus não é autor de esmagamento.
É Pai de misericórdia.
Não destrói a cana quebrada, nem apaga o morrão que fumega.
Suas mãos reparam estragos, seu hálito divino recompõe e renova sempre.
Não desprezes, pois, as luzes vacilantes e as virtudes imprecisas. Não abandones a terra pantanosa, nem desampares o arvoredo sufocado pela erva daninha.
Trabalha pelo bem e ajuda incessantemente.
Se Deus, Senhor Absoluto da Eternidade, espera com paciência, por que motivo, nós outros, servos imperfeitos do trabalho relativo, não poderemos esperar?



Livro Caminho Verdade e Vida, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Emmanuel, Ed FEB