A vaidade é filha
legítima do egoísmo, pois o vaidoso é um “cego”
que somente sabe ver a si próprio.
A vaidade é um desejo superlativo de chamar a atenção, ou a presunção de
ser aplaudido e reverenciado perante os outros. É a ostentação dos que procuram
elogios, ou a ilusão dos que querem ter êxito diante do mundo e não dentro de
si mesmo.
Importante não
olvidarmos que a vaidade atinge toda e
qualquer classe social, desde as paupérrimas até as que atingiram o cume da
independência econômica.
Francisco VI, duque de La Rochefoucauld, escritor francês do século
XVII, dizia que “ficaríamos envergonhados de nossas melhores ações, se o mundo
soubesse o que as motivou”.
A afirmativa é válida porque se refere às criaturas que fazem
filantropia a fim de alimentar sua vaidade pessoal, impressionando o mundo para
que os inclua no rol dos generosos e de grandes altruístas.
O orgulho está
incluído entre os tradicionais pecados
capitais do catolicismo. Como a vaidade é uma idéia justaposta ao orgulho, ela
também se destaca como um dos mais antigos defeitos a serem combatidos na
humanidade. No entanto, somente poderemos nos transformar se conseguirmos ver e
perceber, em nós mesmos, as raízes da vaidade, visto que negá-la de modo obstinado
é ficar estritamente vinculado a ela.
É oportuno dizer que não estamos nos referindo aqui ao esmero na maneira
de andar, falar, vestir ou se enfeitar, que, em realidade, são saudáveis e
naturais, mas a uma causa mais complexa e profunda. O motivo de nossas análises
e observações é o estado íntimo do indivíduo vaidoso, ou seja, o que está por
baixo do interesse dessa exibição e dessa necessidade de ser visto, a ponto de falsificar
a si mesmo para chamar a atenção.
Na fase infantil, a conduta dos pais e sua filosofia de vida
agem sobre as crianças, plasmando-lhes uma nova matriz à sua, já existente,
bagagem espiritual. Ao produto de suas vidas passadas é anexada a visão dos
adultos, membros de sua família atual. Portanto, através dos pais, verdadeiros “espelhos
vivos”, as crianças assimilam suas primeiras noções de comportamento e modo de
viver.
Filhos de pais
orgulhosos podem-se tomar crianças
exibicionistas, carregando uma grave dependência psíquica de destaque.
Comportam-se para ser socialmente aceitas e para aparentar-se pessoas
brilhantes.
Os vaidosos colocam máscaras de criaturas impecáveis e,
evidentemente, transmitem aos filhos toda uma forma de pensar e agir alicerçada
na preocupação com os rótulos e com a escala de valores pela qual foram
moldados.
Outra causa do desenvolvimento da vaidade nas criaturas é a
importância desmedida que dão às posses e propriedades. Na atualidade, por
menor que seja a classe social em que se encontra constituída uma família,
ainda é o dinheiro uma fonte absoluta de poder. Quem ganha mais reivindica no
lar a autoridade, a atenção e o amor. A riqueza amoedada é conceituada como um
dos instrumentos com o qual podemos manipular as pessoas e nos tomar um ponto
de atração. Dessa forma, processa-se na criança uma educação do “tipo
inintencional”, transmitida pelos adultos de forma involuntária, automática e
despercebida, através do somatório dos gestos, das conversas, das atitudes ou
dos comportamentos do dia-a-dia.
A presunção leva os indivíduos a se casar não por amor, mas
a se unir a alguém que lhes proporcione um melhor “status” social, uma roda de
amigos de projeção e um nome importante.
Enfim, as uniões matrimoniais acontecem, quase sempre, por interesse
pessoal, sem se levarem em conta os reais sentimentos da alma.
A supervalorização social e econômica de determinada profissão ou
emprego influencia as escolhas de conformidade com a realização externa, em
detrimento das inclinações e vocações internas. Há profissões tradicionalmente
ambicionadas, como medicina, engenharia e outras tantas de mais recente
valorização nos dias atuais, que os pais almejam para os filhos, tentando assim
solucionar suas próprias frustrações e evidenciar sua própria pessoa com o “brilho
profissional” de seus familiares. Condicionando-os a viver uma existência
estereotipada, justificam-se com a representação de uma dedicação e proteção ao
ambiente doméstico, quando, na realidade, o que cultivam é o “prazer da
notoriedade”.
Quando o eminente educador Allan Kardec indagou aos Semeadores da
Era Nova qual a maneira de extirpar inteiramente do coração humano o egoísmo,
fundado no sentimento do interesse pessoal, ele recebeu a seguinte orientação: “...o
egoísmo é a mais difícil de desenraizar-se porque deriva da influência da
matéria, influência de que o homem, ainda muito próximo de sua origem, não pôde
libertar-se e para cujo entretenimento tudo concorre: suas leis, sua
organização social, sua educação. (...) O egoísmo assenta na importância
da personalidade. Ora, o Espiritismo, bem compreendido, repito, mostra as
coisas de tão alto que o sentimento da personalidade desaparece, de certo modo,
diante da imensidade...” (33)
A vaidade é
filha legítima do egoísmo, pois o
vaidoso é um “cego” que somente sabe ver a si próprio. Ora, essa importância ao
“sentimento de personalidade”, da qual os Espíritos de Escol se reportam nada
mais é do que a vaidade.
Além da educação
familiar, os jornais, as revistas, os
telejornais — ou seja, a mídia — cria todo um “mercado de personalidades”
prósperas, mostrando suas fotos superproduzidas e seu modo de vida na
opulência.
Novelas e filmes exibem os padrões a serem atingidos. As
criaturas imaturas, que receberam uma educação voltada para esses valores
superficiais, tentam se comparar e competir com os modelos da televisão ou com
as estrelas e astros do cinema, gastando tempo e energia, porque se esquecem de
que são incomparáveis.
As almas não são clichês umas das outras; todos têm
características individuais e próprias.
Os ingredientes do sucesso do
ser humano se encontram em sua intimidade.
Não há razão para nos compararmos com os demais, pois cada
indivíduo tem sua razão de ser no Universo. Se a Natureza nos criou para sermos
mangueiras, não devemos querer produzir como as laranjeiras. Lembremo-nos,
contudo, de que, tal como a semente, que contém todos os elementos vitais para
a formação de uma árvore, também nós possuímos, em essência, todos os componentes
de que necessitamos para ser criativos, originais e bem-sucedidos.
Paulo de Tarso
assim se reportava aos moradores da Galácia: “Porque,
se alguém cuida ser alguma coisa, não sendo nada, engana-se a si mesmo”. (34)
À medida que os homens tomarem consciência do seu
próprio mundo interior; reconhecerem-se filhos do Poder do Universo e instruir-se
sobre as infinitas possibilidades da vida eterna, deixará a doentia preocupação
com as aparências, a frustração crônica que possuem por imitar os outros e a “atitude
de camaleão” que cultivam com uma autoimagem para agradar o mundo em seu redor.
X.X.X.X
A mesquinhez pode manifestar-se ou não com a acumulação de
posses materiais, como também pode aparecer como um “refreamento de sentimentos”
ou um “auto distanciamento do mundo.”
Kardec, o sistematizador dos ensinos espíritas na Terra, comenta: “... a
propriedade que resulta do trabalho é um direito natural, tão sagrado quanto o
de trabalhar e de viver.” E as Vozes do Céu, sob a direção do Espírito de
Verdade, afirmam: “Não disse Deus: 'Não roubarás? ' E Jesus não disse: 'Dai a César o
que é de César?” (35)
A avareza não deve ser entendida apenas como um “defeito”
ou uma “falha” humana a ser corrigida de modo compulsório, mas precisa,
naturalmente, ser compreendida em sua origem mais profunda.
A falta de
generosidade e a insensibilidade em relação às necessidades dos outros têm raízes numa defesa psicológica
que desencadeia nos indivíduos uma ruptura na conexão entre o seu conteúdo
emocional e o seu conteúdo intelectual.
A criatura
sovina isola-se em si mesma. Nada
tem importância para ela, a não ser a contenção doentia e generalizada em
relação à sua própria vida interior, e não só em relação aos outros, como se
pensa habitualmente. A mesquinhez pode manifestar-se ou não com a acumulação de
posses materiais, como também pode aparecer como um “refreamento de sentimentos”
ou um “auto distanciamento do mundo”. Como a matriz interior se fundamenta numa
necessidade reprimida da pessoa que não consegue se relacionar com outras, nem
mesmo delas se aproximar para permuta de experiências e afetividade, ela se sente
solitária e, assim, compensa-se, acumulando bens. Constrói torres e muralhas
imensas para se proteger do empobrecimento que ela mesma vivencia,
inconscientemente, há muito tempo — a escassez e a inibição da aproximação
social e afetiva.
Cria toda uma atmosfera de autonomia por possuir valiosos objetos
exteriores destinados a suprir a sensação de vulnerabilidade que sente ao lidar
com as pessoas.
Na atualidade, tenta-se resgatar essa sensação do vácuo
interior, existente na intimidade da alma humana, com uma reivindicação do
desejo, cada vez maior, de possuir bens materiais. O grande fluxo de indivíduos
que buscam os consultórios de psiquiatria e as clínicas das mais diversas especialidades
médicas se deve a esse clima de insatisfação e de vazio existencial, que nada
mais é que a colheita dos frutos do egoísmo — incapacidade de se relacionar,
repressão dos sentimentos de amor e de fraternidade e a inconsciência de uma
vida interna e eterna.
A indiferença e
a frieza emocional, a apatia e o apego
patológico, bem como o distanciamento das privações dos outros, são
características marcantes das criaturas que alimentam uma paixão egoística
pelos bens materiais. São conhecidas como sovinas, mesquinhas ou usurárias.
O trabalho
interior sempre melhora a qualidade de
nossa vida, pois passamos a conhecer a nós mesmos e o Universo como um todo,
visto que somos levados também por um propósito precípuo cuja função é a de
aprender a amar incondicionalmente.
Procuremos então
viver, não como proprietários
definitivos de nossas posses, mas apenas como usufrutuários delas.
A técnica para aprendermos a amar, usando de generosidade e desprendimento, é empregarmos
nossos sentimentos e emoções com equanimidade, o que quer dizer, dar-lhes igual
importância ou utilizá-los com imparcialidade. A seguir, faremos breves anotações,
cuja observação acurada poderá nos fornecer dados importantes para
comportamo-nos com racionalidade:
·
Caridade sem salvacionismo;
·
Humildade sem baixa estima;
·
Determinação sem atrevimento;
·
Obediência sem submissão;
·
Bondade sem anulação da personalidade;
·
Compaixão sem sentimentalismo;
·
Segurança sem impulsividade;
·
Perseverança sem obstinação.
A avareza é o produto de uma necessidade que se encontra
na intimidade da psique humana.
Ela tenta enfeitar ou distrair o conflito com a busca de bens perecíveis,
mas nunca consegue suprir a sensação de carência íntima.
Em síntese, o altruísmo é o
amor desinteressado, resultado do “enriquecimento da vida interior”, enquanto a
avareza é filha da “pobreza do mundo interior”, acarretando uma desumanização e
uma obstrução da capacidade de amar.
Referencias:
33 LE - 917– Qual o meio de destruir-se o egoísmo?
De todas as imperfeições humanas, o egoísmo é a mais
difícil de desenraizar-se porque deriva da influência da matéria, influência de
que o homem, ainda muito próximo de sua origem, não pôde libertar-se e para
cujo entretenimento tudo concorre: suas leis, sua organização social, sua
educação. O egoísmo se enfraquecerá à proporção que a vida moral for
predominando sobre a vida material e, sobretudo, com a compreensão, que o
Espiritismo vos faculta, do vosso estado futuro, real e não desfigurado por
ficções alegóricas. Quando, bem compreendido, se houver identificado com os
costumes e as crenças, o Espiritismo transformará os hábitos, os usos, as
relações sociais. O egoísmo assenta na importância da personalidade. Ora, o
Espiritismo, bem compreendido, repito, mostra as coisas de tão alto que o
sentimento da personalidade desaparece, de certo modo, diante da imensidade.
Destruindo essa importância, ou, pelo menos, reduzindo-a às suas legítimas
proporções, ele necessariamente combate o egoísmo. (...)”
34 Gálatas 6:3
35 LE - 882 – Tem o homem o direito de
defender os bens que haja conseguido juntar pelo seu trabalho?
“Não disse Deus: Não roubarás?
' E Jesus não disse: Dai a César o que é de César?”
Nota – O que, por meio do trabalho honesto, o homem junta
constitui legítima propriedade sua, que ele tem o direito de defender; porque a
propriedade que resulta do trabalho é um direito natural, tão sagrado quanto o
de trabalhar e de viver.