sexta-feira, 29 de julho de 2016

JOANA DE CUZA

JOANA DE CUZA
Entre a multidão que invariavelmente acompanhava a Jesus nas pregações do lago, achava-se sempre uma mulher de rara dedicação e nobre caráter, das mais altamente colocadas na sociedade de Cafarnaum. Tratava-se de Joana, consorte de Cuza, intendente de Antipas, na cidade onde se conjugavam interesses vitais de comerciantes e de pescadores.
Joana possuía verdadeira fé; entretanto, não conseguiu forrar-se às amarguras domésticas, porque seu companheiro de lutas não aceitava as claridades do Evangelho.
Considerando seus dissabores íntimos, a nobre dama procurou o Messias, numa ocasião em que ele descansava em casa de Simão e lhe expôs a longa série de suas contrariedades e padecimentos. O esposo não tolerava a doutrina do Mestre. Alto funcionário de Herodes, em perene contato com os representantes do Império, repartia as suas preferências religiosas, ora com os interesses da comunidade judaica, ora com os deuses romanos, o que lhe permitia viver em tranquilidade fácil e rendosa. Joana confessou ao Mestre os seus temores, suas lutas e desgostos no ambiente doméstico, expondo suas amarguras em face das divergências religiosas existentes entre ela e o companheiro.
Após ouvir-lhe a longa exposição, Jesus lhe ponderou:
– Joana, só há um Deus, que é o Nosso Pai, e só existe uma fé para as nossas relações com o seu amor. Certas manifestações religiosas, no mundo, muitas vezes não passam de vícios populares nos hábitos exteriores. Todos os templos da Terra são de pedra; eu venho, em nome de Deus, abrir o templo da fé viva no coração dos homens. Entre o sincero discípulo do Evangelho e os erros milenários do mundo, começa a travar-se o combate sem sangue da redenção espiritual. Agradece ao Pai o haver-te julgado digna do bom trabalho, desde agora. Teu esposo não te compreende a alma sensível? Compreender-te-á um dia. É leviano e indiferente? Ama-o, mesmo assim. Não te acharias ligada a ele se não houvesse para isso razão justa. Servindo-o com amorosa dedicação, estarás cumprindo a vontade de Deus.
Falas-me de teus receios e de tuas dúvidas. Deves, pelo Evangelho, amá-la ainda mais. Os sãos não precisam de médico. Além disso, não poderemos colher uvas nos abrolhos, mas podemos amanhar o solo que produziu cardos envenenados, a fim de cultivarmos nele mesmo a videira maravilhosa do amor e da vida.
Joana deixava entrever no brilho suave dos olhos a íntima satisfação que aqueles esclarecimentos lhe causavam; mas, patenteando todo o seu estado d’alma, interrogou:
– Mestre, vossa palavra me alivia o espírito atormentado; entretanto, sinto dificuldade extrema para um entendimento recíproco no ambiente do meu lar. Não julgais acertado que lute por impor os vossos princípios? Agindo assim, não estarei reformando o meu esposo para o céu e para o vosso reino?
O Cristo sorriu serenamente e retrucou:
– Quem sentirá mais dificuldade em estender as mãos fraternas, será o que atingiu as margens seguras do conhecimento com o Pai, ou aquele que ainda se debate entre as ondas da ignorância ou da desolação, da inconstância ou da indolência do espírito? Quanto à imposição das ideias – continuou Jesus, acentuando a importância de suas palavras – por que motivo Deus não impõe a sua verdade e o seu amor aos tiranos da Terra? Por que não fulmina com um raio o conquistador desalmado que espalha a miséria e a destruição, com as forças sinistras da guerra? A sabedoria celeste não extermina as paixões: transforma-as. Aquele que semeou o mundo de cadáveres desperta, às vezes, para Deu, apenas com uma lágrima. O Pai não impõe a reforma a seus filhos: esclarece-os no momento oportuno. Joana, o apostolado do Evangelho é o de colaboração com o céu, nos grandes princípios da redenção. Sê fiel a Deus, amando ao teu companheiro do mundo, como se fora teu filho. Não percas tempo em discutir o que não seja razoável. Deus não trava contendas com as suas criaturas e trabalha em silêncio, por toda a Criação. Vai!... Esforça-te também no silêncio e, quando convocada ao esclarecimento, fala o verbo doce ou enérgico da salvação, segundo as circunstâncias! Volta ao lar e ama ao teu companheiro como o material divino que o céu colocou em tuas mãos para que talhes uma obra de vida, sabedoria e amor!...
Joana do Cuza experimentava um brando alívio no coração. Enviando a Jesus um olhar de carinhoso agradecimento, ainda lhe ouviu as ultimas palavras:
– Vai, filha!... Sê fiel!
***
Desde esse dia, memorável para a sua existência, a mulher de Cuza experimentou na alma a claridade constante de uma resignação sempre pronta ao bom trabalho e sempre ativa para a compreensão de Deus, como se o ensinamento do Mestre estivesse agora gravado indelevelmente em sua alma, considerou que, antes de ser esposa na Terra, já era filha daquele Pai que, do Céu, lhe conhecia a generosidade e os sacrifícios. Seu espírito divisou em todos os labores uma luz sagrada e oculta.
Procurou esquecer todas as características inferiores do companheiro, para observar somente o que possuía ele de bom, desenvolvendo, nas menores oportunidades, o embrião vacilante de suas virtudes eternas. Mais tarde, o céu lhe enviou um filhinho, que veio duplicar os seus trabalhos; ela, porém, sem olvidar as recomendações de fidelidade que Jesus lhe havia feito, transformava suas dores num hino de triunfo silencioso em cada dia.
Os anos passaram e o esforço perseverante lhe multiplicou os bens da fé, na marcha laboriosa do conhecimento e da vida. As perseguições políticas desabaram sobre a existência do seu companheiro. Joana, contudo, se mantinha firme. Torturado pelas ideias odiosas de vingança, pelas dívidas insolváveis, pelas vaidades feridas, pelas moléstias que lhe verminaram o corpo, o ex-intendente de Antipas voltou ao plano espiritual, numa noite de sombras tempestuosas. Sua esposa, todavia, suportou os dissabores mais amargos, fiel aos seus ideais divinos edificados na confiança sincera. Premida pelas necessidades mais duras, a nobre dama de Cafarnaum procurou trabalho para se mantiver com o filhinho, que Deus lhe confiara! Algumas amigas lhe chamaram a atenção, tomadas de respeito humano. Joana, no entanto, buscou e esclarecê-las, alegando que Jesus, igualmente, havia trabalhado, calejando as mãos nos serrotes de uma carpintaria singela e que, submetendo-se ela a uma situação de subalternidade no mundo, se dedicara primeiramente ao Cristo, de quem se havia feito escrava devotada.
Cheia de alegria sincera, a viúva de Cuza esqueceu o conforto da nobreza material, dedicou-se aos filhos de outras mães, ocupou-se com os mais subalternos afazeres domésticos, para que seu filhinho tivesse pão. Mais tarde, quando a neve das experiências do mundo lhe alvejou os primeiros anéis da fronte, uma galera romana a conduzia em seu bojo, na qualidade de serva humilde.
***
No ano 68, quando as perseguições ao Cristianismo iam intensas, vamos encontrar, num dos espetáculos sucessivos do circo, uma velha discípula do Senhor amarrada ao poste do martírio, ao lado de um homem novo, que era seu filho.
Ante o vozerio do povo, foram ordenadas as primeiras flagelações.
– Abjura!... – Exclama um executar das ordens imperiais, de olhar cruel e sombrio.
Mas, a antiga discípula ao Senhor contempla o céu, sem uma palavra de negação ou de queixa. Então o açoite vibra sobre o rapaz seminu, que exclama, entre lágrimas: – “Repudia a Jesus, minha mãe”!...
Não vês que nos perdemos?! Abjura!... por mim que sou teu filho!...”
Pela primeira vez, dos olhos da mártir corre a fonte abundante das lágrimas. As rogativas do filho são espadas de angústia que lhe retalham o coração.
– Abjura!... Abjura!
Joana ouve aqueles gritos, recordando a existência inteira. O lar risonho e festivo, as horas de ventura, os desgostos domésticos, as emoções maternais, os fracassos do esposo, sua desesperação e sua morte, a viuvez, a desolação e as necessidades mais duras... Em seguida, ante os apelos desesperados do filhinho, recordou que Maria também fora mãe e, vendo o seu Jesus crucificado no madeiro da infâmia, soubera conformar-se com os desígnios divinos.
Acima de todas as recordações, como alegria suprema de sua vida, pareceu-lhe ouvir ainda o Mestre, em casa de Pedro, a lhe dizer: – “Vai filha! Sê fiel!” Então, possuída de força sobre humana, a viúva de Cuza contemplou a primeira vítima ensanguentada e, fixando no jovem um olhar profundo e inexprimível, na sua dor e na sua ternura, exclamou firmemente:
– Cala-te, meu filho! Jesus era puro e não desdenhou o sacrifício. Saibamos sofrer na hora dolorosa, porque, acima de todas as felicidades transitórias do mando, é preciso ser fiel a Deus!
A esse tempo, com os, aplausos delirantes do povo, os verdugos incendiavam, em derredor, achas de lenha embebidas em resina inflamável.Em poucos instantes, as labaredas lamberam-lhe o corpo envelhecido. João de Cuza contemplou, com serenidade, a massa de povo que lhe não entendia o sacrifício. Os gemidos de dor lhe morriam abafados no peito opresso. Os algozes da mártir cercaram-lhe de impropérios a fogueira:
– O teu Cristo soube apenas ensinar-te a morrer? – Perguntou um dos verdugos.
A velha discípula, concentrando a sua capacidade de resistência, teve ainda forças para murmurar:
– Não apenas a morrer, mas também a vos amar!...
Nesse instante, sentiu que a mão consoladora do Mestre lhe tocava suavemente os ombros, e lhe escutou a voz carinhosa e inesquecível:
– Joana, tem bom ânimo!... Eu aqui estou! ...



Livro: Boa Nova, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Irmão X (Humberto de Campos) , Ed FEB.

terça-feira, 26 de julho de 2016

DA MULHER

DA MULHER
Compenetrar-se do apostolado de guardiã do instituto da família e da sua elevada tarefa na condução das almas trazidas ao renascimento físico.
Todo compromisso no bem é de suma importância no mundo espiritual.
Afastar-se de aparências e fantasias, consagrando-se às conquistas morais que falam de perto à vida imperecível, sem prender-se ao convencionalismo absorvente.
O retorno à condição de desencarnado significa retorno à consciência profunda.
Afinar-se com os ensinamentos cristãos que lhe situam a alma nos serviços da maternidade e da educação, nos deveres da assistência e nas bênçãos da mediunidade santificante.
Quem foge à oportunidade de ser útil engana a si mesmo.
Sentir e compreender as obrigações relacionadas com as uniões matrimoniais do ponto de vista da vida multimilenária do Espírito, reconhecendo a necessidade das provações regenerativas que assinalam a maioria dos consórcios terrestres.
O sacrifício representa o preço da alegria real.
Opor-se a qualquer artificialismo que vise transformar o casamento numa simples ligação sexual, sem as belezas da maternidade.
Junto dos filhos apagam-se ódios, sublima-se o amor e harmonizam-se as almas para a eternidade.
Reconhecer grave delito no aborto que arroja o coração feminino à vala do infortúnio.
Sexo desvirtuado, caminho de expiação.
Preservar os valores íntimos, sopesando as próprias deliberações com prudência e realismo, em seus deveres de irmã, filha, companheira e mãe.
O trabalho da mulher é sempre a missão do amor, estendendo-se ao infinito.
“E, respondendo, disse-lhe Jesus: 
Marta, Marta, estás ansiosa e afadigada com muitas coisas, mas uma só é necessária; e Maria escolheu a boa parte, a qual não lhe será tirada.” (Lucas,10:41 e 42).



Livro: Conduta Espírita, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito André Luiz, Ed FEB.

quinta-feira, 21 de julho de 2016

A LIÇÃO DE NICODEMOS

A LIÇÃO DE NICODEMOS
Em face dos novos ensinamentos de Jesus, todos os fariseus do templo se tornavam de inexcedíveis cuidados, pelo seu extremado apego aos textos antigos. O Mestre, porém, nunca perdeu ensejo de esclarecer as situações reais difíceis com a luz da verdade que a sua palavra divina trazia ao pensamento do mundo. Grande número de doutores não conseguia ocultar o seu descontentamento, porque, não obstante suas atividades derrotistas continuavam as ações generosas de Jesus, beneficiando os aflitos e os sofredores. Discutiam-se os novos princípios no grande templo de Jerusalém, nas suas praças públicas e nas sinagogas. Os mais humildes e pobres viam no Messias o emissário de Deus, cujas mãos repartiam em abundancia os bens da paz e da consolação. As personalidades importantes temiam-no.
É que o profeta não se deixava seduzir pelas grandes promessas que lhe faziam com referência ao seu futuro material. Jamais temperava a sua palavra de verdade com as conveniências do comodismo da época. Apesar de magnânimo para com todas as faltas alheias, combatia o mal com tão intenso ardor, que para logo se fazia objeto de hostilidade para todas as intenções inconfessáveis. Mormente, em Jerusalém que, com o seu cosmopolitismo, era um expressivo retrato do mundo, as ideias do Senhor acendiam as mais apaixonadas discussões. Eram populares que se entregavam à apologia franca da doutrina de Jesus, servos que o sentiam com todo o calor do coração reconhecido, sacerdotes que o combatiam abertamente, convencionalistas que não o toleravam, indivíduos abastados que se insurgiam contra os seus ensinos.
Todavia, sem embargo das dissensões naturais que precedem o estabelecimento definitivo das ideias novas, alguns espíritos acompanhavam o Messias, tomados de vivo interesse pelos seus elevados princípios. Entre estes, figurava Nicodemos, fariseu notável pelo coração bem formado e pelos dotes da inteligência. Assim, uma noite, ao cabo de grandes preocupações e longos raciocínios, procurou a Jesus, em particular, seduzido pela magnanimidade de suas ações e pela grandeza de sua doutrina salvadora. O Messias estava acompanhado apenas de dois dos seus discípulos e recebeu a visita com a sua bondade costumeira.
Após a saudação habitual e revelando as suas ânsias de conhecimento, depois de fundas meditações, Nicodemos dirigiu-se respeitoso:
– Mestre; bem sabemos que vindes de Deus, pois somente com a luz da assistência divina poderíeis realizar o que tendes efetuado, mostrando o sinal do céu em vossas mãos.
Tenho empregado minha existência em interpretar a lei, mas desejava receber a vossa palavra sobre os recursos de que deverei lançar mão para conhecer o Reino de Deus!
O Mestre sorriu bondosamente e esclareceu:
– Primeiro que tudo, Nicodemos, não basta que tenhas vivido a interpretar a lei.
Antes de raciocinar sobre as suas disposições, deverias ter-lhe sentido os textos. Mas, em verdade devo dizer-te que ninguém conhecerá o reino do céu, sem nascer de novo.
– Como pode um homem nascer de novo, sendo velho? – interrogou o fariseu altamente surpreendido – Poderá, porventura, regressar ao ventre de sua mãe?
O Messias fixou nele os olhos calmos, consciente da gravidade do assunto em foco e acrescentou:
– Em verdade, reafirma-te ser indispensável que o homem nasça e renasça, para conhecer plenamente a luz do reino!...
– Entretanto, como pode isso ser? – Perguntou Nicodemos, perturbado.
– É mestre em Israel e ignoras estas coisas?
– inquiriu Jesus, como surpreendido – É natural que cada um cimente testifique daquilo que saiba; porém precisamos considerar que tu ensinas. Apesar disso, não aceitas os nossos testemunhos. Se falando eu de coisas terrenas sentes dificuldade em compreendê-las com os teus raciocínios sobre a lei, como poderás aceitar as minhas afirmativas quando eu disser das coisas celestiais? Seria loucura destinar os alimentos apropriados a um velho para o organismo frágil de uma criança.
Extremamente confundido, retirou-se o fariseu, ficando André e Tiago empenhados em obter do Messias o necessário esclarecimento, acerca daquela lição nova.
***
Jerusalém quase dormia sob o véu espesso da noite alta. Silêncio profundo se fizera sobre a paisagem. Jesus, no entanto, e aqueles dois discípulos continuavam presos à conversação particular que haviam entabulado. Os dois desejavam ardentemente penetrar o sentido oculto das palavras do Mestre. Como seria possível aquele renascimento?
Não obstante os seus conhecimentos, também partilhavam da perplexidade que levara Nicodemos a se retirar fundamente surpreendido.
– Por que tamanha admiração, em face destas verdades? – perguntou-lhe Jesus, bondosamente – As árvores não renascem depois de podadas? Com respeito aos homens, o processo é diferente, mas o espírito de renovação é sempre o mesmo. O corpo é uma veste. O homem é seu dono. Toda roupagem material acaba rota, porém, o homem, que é filho de Deus, encontra sempre em seu amor os elementos necessários à mudança do vestuário. A morte do corpo é essa mudança indispensável, porque a alma caminhará sempre, através de outras experiências, até que consiga a imprescindível provisão de luz para a estrada definitiva no reino de Deus, com toda a perfeição conquistada, ao longo dos rudes caminhos.
André sentiu que uma nova compreensão lhe felicitava o espírito simples e perguntou:
– Mestre, já que o corpo é como a roupa material das almas, por que não somos todos iguais no mundo?
Vejo belos jovens, junto de aleijados e paralíticos...
– Acaso não tenho ensinado – disse Jesus – que tem de chorar todo aquele que se transforma em instrumento de escândalo? Cada alma conduz consigo mesma; o inferno ou o céu que edificou no âmago da consciência.
Seria justo conceder-se uma segunda veste mais perfeita e mais bela ao espírito rebelde que estragou a primeira?
Que diríamos da sabedoria de Nosso Pai, se facultasse as possibilidades mais preciosas aos que às utilizaram na véspera para o roubo, o assassínio, a destruição?
Os que abusaram da túnica da riqueza vestirão depois as dos fâmulos e escravos mais humildes, como as mãos que feriram podem vir a ser cortadas.
– Senhor; compreendo agora o mecanismo do resgate. – Murmurou Tiago, externando a alegria do seu entendimento. – Mas, observo que, desse modo, o mundo precisará sempre do clima do escândalo e do sofrimento, desde que o devedor, para saldar seu débito, não poderá fazê-lo sem que outro lhe tome o lugar com a mesma dívida.
O Mestre apreendeu a amplitude da objeção e esclareceu os discípulos, perguntando:
– Dentro da lei de Moisés, como se verifica o processo da redenção?
Tiago meditou um instante e respondeu:
– Também na lei está escrito que o homem pagará “olho por olho, dente por dente”.
– Também tu, Tiago, estás procedendo como Nicodemos. – Replicou Jesus com generoso sorriso.
– Como todos os homens, aliás, tens raciocinado, mas não tens sentido. Ainda não ponderaste, talvez, que o primeiro mandamento da lei é uma determinação de amor. Acima do “não adulterarás”, do “não cobiçarás”, está o “amar a Deus sobre todas as coisas, de todo coração e de todo entendimento”. Como poderá alguém amar ao Pai, aborrecendo-lhe a obra?
Contudo, não estranho à exiguidade de visão espiritual com que examinaste o texto dos profetas. Todas as criaturas hão feito o mesmo. Investigando as revelações do céu com o egoísmo que lhes é próprio, organizaram a justiça como o edifício mais alto do idealismo humano. E, entretanto, coloco o amor acima da justiça do mundo e tenho ensinado que só ele cobre a multidão dos pecados. Se nos prendemos à lei de Talião, somos obrigados a reconhecer que onde existe um assassino haverá, mais tarde, um homem que necessita ser assassinado; com a lei do amor, porém, compreendemos que o verdugo e a vítima são dois irmãos, filhos de um mesmo Pai. Basta que ambos sigam isso para que a fraternidade divina afaste os fantasmas do escândalo e do sofrimento.
***
Ante as elucidações do Mestre, os dois discípulos estavam maravilhados. Aquela lição profunda esclarecia-os para sempre.
Tiago, então, aproximou-se e sugeriu a Jesus que proclamasse aquelas verdades novas na pregação do dia seguinte. O Mestre dirigiu-lhe um olhar de admiração e interrogou:
– Será que não compreendeste? Pois, se um doutor da lei saiu daqui sem que eu lhe pudesse explicar toda a verdade, como queres que proceda de modo contrario, para com a compreensão simplista do espírito popular? Alguém constrói uma casa iniciando pelo teto o trabalho? Além disso, mandarei mais tarde o Consolador, a fim de esclarecer e dilatar os meus ensinos.
Eminentemente impressionados, André e Tiago calaram as derradeiras interrogações.
Aquela palestra particular, entre o Senhor e os discípulos, permaneceria guardada na sombra leve da noite em Jerusalém; mas, a lição a Nicodemos estava dada. A lei da reencarnação estava proclamada para sempre, no Evangelho do Reino



Livro: Boa Nova, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Irmão X (Humberto de Campos) , Ed FEB.

segunda-feira, 18 de julho de 2016

SEMPRE VIVOS

SEMPRE VIVOS
"Ora, Deus não é dos mortos, mas, sim, de vivos. Por isso, vós errais muito"
Jesus
Marcos, 12:27

Considerando as convenções estabelecidas em nosso trato com os amigos encarnados, de quando em quando nos referimos à vida espiritual utilizando a palavra “morte” nessa ou naquela sentença de conversação usual. No entanto, é imprescindível entendê-la, não por cessação e sim por atividade transformadora da vida.
Espiritualmente falando, apenas conhecemos um gênero temível de morte — a da consciência denegrida no mal, torturada de remorso ou paralítica nos despenhadeiros que marginam a estrada da insensatez e do crime.
É chegada a época de reconhecermos que todos, somos vivos na Criação Eterna.
Em virtude de tardar semelhante conhecimento nos homens, é que se verificam grandes erros. Em razão disso, a Igreja Católica Romana criou, em sua teologia, um céu e um inferno artificiais; diversas coletividades das organizações evangélicas protestantes apegam-se à letra, crentes de que o corpo, vestimenta material do Espírito, ressurgirá um dia dos sepulcros, violando os princípios da Natureza, e inúmeros espiritistas nos têm como fantasmas de laboratório ou formas esvoaçantes, vagas e aéreas, errando indefinidamente.
Quem passa pela sepultura prossegue trabalhando e, aqui, quanto aí, só existe desordem para o desordeiro. Na Crosta da Terra ou além de seus círculos, permanecemos vivos invariavelmente.
Não te esqueças, pois, de que os desencarnados não são magos, nem adivinhos. São irmãos que continuam na luta de aprimoramento. Encontramos a morte tão somente nos caminhos do mal, onde as sombras impedem a visão gloriosa da vida.
Guardemos a lição do Evangelho e jamais esqueçamos que Nosso Pai é Deus dos vivos imortais.



Livro: Pão Nosso, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Emmanuel, Ed FEB.

sexta-feira, 15 de julho de 2016

CARIDADE DO ENTENDIMENTO

CARIDADE DO ENTENDIMENTO
"Agora, pois, permanecem estas três, a fé, a esperança e a caridade; porém, a maior destas é a caridade"
Paulo
I Coríntios, 13:13

Na sustentação do progresso espiritual precisamos tanto da caridade quanto do ar que nos assegura o equilíbrio orgânico.
Lembra-te de que a interdependência é o regime instituído por Deus para a estabilidade de todo o Universo e não olvide[1] a compreensão que devemos às todas as criaturas.
Compreensão que se exprima, através de tolerância e bondade incessantes, na sadia convicção de que ajudando aos outros é que poderemos encontrar o auxílio indispensável à própria segurança.
À frente de qualquer problema complexo naqueles que te rodeiam, recorda que não seria justa a imposição de teus pontos de vista para que se orientem na estrada que lhes é própria
O criador não dá cópias e cada coração obedece a sistema particular de impulsos evolutivos.
Só o amor é o clima adequado ao entrelaçamento de todos os seres da Criação e somente através dele integrar-nos-emos na sintonia excelsa da vida.
Guarda, em todas as fases do caminho, a caridade que identifica a presença do Senhor nos caminhos alheios, respeitando-lhes a configuração com que se apresentam.
Não te esqueças de que ninguém é ignorante porque o deseje e, estendendo fraternos braços aos que respiram atribulados na sombra, diminuirás a penúria que se extinguirá, por fim, no mundo, quando cada consciência ajustar-se à obrigação de servir sem mágoa e sem reclamar é que permaneceremos felizes na ascensão para Deus.



Livro: Ceifa de luz, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Emmanuel, Ed FEB.
[1] = Esqueça

EM TI PRÓPRIO

EM TI PRÓPRIO
"De maneira que cada um de nós dará conta de si mesmo a Deus".
Paulo
Romanos, 14:12.

Escutarás muita gente a falar de compreensão e talvez que, sob o reflexo condicionado, repetirás os belos conceitos que ouviste através de preleções que te angariarão simpatia e respeito.
Entretanto, se não colocares o assunto nas entranhas da alma, situando-te no lugar daqueles que precisam de entendimento, quase nada saberás de compreensão, além da certeza de que temos nela preciosa virtude.
Falarás de paciência e assinalarás muitas vozes, em torno de ti, referindo-se, no entanto, se no imo do próprio ser não tens necessidade de sofrer por algum entre amado, muito pouco perceberás acerca de calma e tolerância.
Exaltarás o amor, a bondade, a paz e a união, mas se nas profundezas do espírito não sentires, algum dia, o sofrimento a ensinar-te o valor da nota de consolação sobre a dor de que te lamentas; a significação da migalha de socorro que outrem te estenda em teus dias de carência material; a importância da desculpa de alguém a essa ou àquela falta que cometeste e o poder do gesto de pacificação da parte de algum amigo que te restituiu a harmonia, em tuas próprias vivências, ignorarás realmente o que sejam entendimento e generosidade, perdão e segurança íntima.
Seja qual a dificuldade em que te vejas, abstém de carregar o fardo das aflições e das perguntas sem remédio.
Penetra no silêncio da própria alma, escuta os pensamentos que te nascem do próprio ser e reconhecerás que a solução da vida surgirá de ti mesmo.



Livro: Ceifa de luz, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Emmanuel, Ed FEB.

quinta-feira, 14 de julho de 2016

IRRESPONSABILIDADE

IRRESPONSABILIDADE
Somos nós mesmos que fazemos os nossos caminhos e depois os denominamos de fatalidade.
Não é coerente que cada um de nós trabalhe para alcançar a própria felicidade? 
Não é lógico que devemos nos responsabilizar apenas por nossos atos? 
Não nos afirma a sabedoria do Evangelho que seríamos conhecidos, exclusivamente, pelas nossas obras?
Fazer os outros seguros e felizes é missão impossível de realizar, se acreditarmos que depende unicamente de nós a plenitude de sua concretização. Se assim admitimos, passamos, a partir então, a esperar e a cobrar retribuição; em outras palavras, a reciprocidade. Não seria mais fácil que cada um de nós conquistasse sua felicidade para que depois pudesse desfrutá-la, convivendo com alguém que também conquistou por si mesmo? Qual a razão de a ofertarmos aos outros e, por sua vez, os outros a concederem a nós? Por certo, só podemos ensinar ou partilhar o que aprendemos.
Assim disse Pedro, o apóstolo: “Não tenho ouro nem prata; mas o que tenho, isso te dou.”
Dessa maneira, vivemos constantemente colocando nossas necessidades em segundo plano e, ao mesmo tempo, nos esquecendo de que a maior de todas as responsabilidades é aquela que temos para com nós mesmos.
Os acontecimentos exteriores de nossa vida são os resultados diretos de nossas atitudes internas. A princípio, podemos relutar para assimilar e entender esse conceito, porque é melhor continuarmos a acreditar que somos vítimas indefesas de forças que não estão sob o nosso controle. Efetivamente, somos nós mesmos que fazemos os nossos caminhos e depois os denominamos de fatalidade.
“Haverá fatalidade nos acontecimentos da vida, conforme ao sentido que se dá a este vocábulo? (…) são predeterminados? E, neste caso, que vem a ser do livre-arbítrio?”, pergunta Kardec aos Semeadores da Nova Revelação. E eles respondem: “A fatalidade existe unicamente pela escolha que o Espírito fez, ao encarnar (…). Escolhendo-a, instituiu para si uma espécie de destino…”
É inevitável para todos nós o fato de que vivemos, invariavelmente, escolhendo. A condição primordial do livre-arbítrio é a escolha e, para que possamos viver, torna-se indispensável escolher sempre. Nossa existência se faz através de um processo interminável de escolhas sucessivas.
Eis aqui um fato incontestável da vida: o amadurecimento do ser humano inicia-se quando cessam suas acusações ao mundo.
Entretanto, há indivíduos que se julgam perseguidos por um destino cruel e censuram tudo e todos, menos eles mesmos. Recusam, sistematicamente, a responsabilidade por suas desventuras, atribuindo a culpa às circunstâncias e às pessoas, bem como não reconhecem a conexão existente entre os fatos exteriores e seu comportamento mental.
No íntimo, essas pessoas não definiram limites em seu mundo interior e vivem num verdadeiro emaranhado de energias desconexas. Os limites nascem das nossas decisões profundas sobre o que acreditamos ser nossos direitos pessoais.
Nossas demarcações estabelecem nosso próprio território, cercam nossas forças vitais e determinam as linhas divisórias de nosso ser individual. Há um espaço delimitado onde nós terminamos e os outros começam.
Algumas criaturas aprenderam, desde a infância, o senso dos limites com pais amadurecidos. Isso os mantém firmes e saudáveis dentro de si mesmas. Outras, porém, não. Quando atingiram a fase adulta, não sabiam como distinguir quais são e quais não são suas responsabilidades.
Muitas construíram muros de isolamento que as separaram do crescimento e da realização interior, ou ainda paredes com enormes cavidades que as tornaram suscetíveis a uma confusão de suas emoções com as de outras pessoas.
Limites é o portal dos bons relacionamentos. Têm como objetivo nos tornar firmes e conscientes de nós mesmos, a fim de sermos capazes de nos aproximar dos outros sem sufocá-los ou desrespeitá-los. Visam também evitar que sejamos constrangidos a não confiar em nós mesmos.
Ser responsável implica ter a determinação para responder pelas consequências das atitudes adotadas.
Ser responsável é assumir as experiências pessoais, para atingir uma real compreensão dos acertos e dos desenganos.
Ser responsável é decidir por si mesmo para onde ir e descobrir a razão do próprio querer.
Não existem “vítimas da fatalidade”; nós é que somos os promotores do nosso destino. Somos a causa dos efeitos que ocorrem em nossa existência.
Aceitar o princípio da responsabilidade individual e estabelecer limites descomplica nossa vida, tornando-os cada vez mais conscientes de tudo o que acontece ao nosso derredor.
Escolhendo com responsabilidade e sabedoria, poderemos transmutar, sem exceção, as amarguras em que vivemos na atualidade. A auto-responsabilidade nos proporcionará a dádiva de reconhecer que qualquer mudança de rota no itinerário de nossa “viagem cósmica” dependerá, invariavelmente, de nós.



Livro: Dores da Alma, Espírito Hammed, médium: Francisco do Espírito Santo Neto.

CARTA PATERNA


CARTA PATERNA

Meu filho; não tinhas razão em favor da cólera. Vi, perfeitamente, quando o velhinho se aproximou para servir-te.
Trazia um coração amoroso e atento que não soubeste compreender.
Deste uma ordem que o pobrezinho não ouviu tão bem, quanto desejavas. Repetiste-a e, porque novamente te perguntasse qualquer coisa, proferiste palavras feias, que lhe feriram as fibras mais íntimas.
Como foste injusto!…
Quando nasceste, o antigo servidor já vencera muitos invernos e servira a muita gente. Enfraqueceram-se-lhe os ouvidos, ante as imperiosas determinações alheias.
Nunca refletiste na neblina que lhe enevoa o olhar? Adquiriu-a trabalhando à noite, enquanto dormias despreocupado.
Sabes por que os trazem as pernas trêmulas? Devorou muitas léguas a pé, solucionando problemas dos outros.
Irritas-te, quando se demora a movimentar-se a teu mando, contudo, exiges o automóvel para a viagem de dois quilômetros. Em muitas ocasiões, queixas-te contra ele. É relaxado aos teus olhos, tem as mãos descuidadas e a roupa não muito limpa.
Entretanto, nunca imaginaste que o apagado servidor jamais encontrou oportunidades iguais às que recebeste. Além disto, não lhe ofereces o ensinamento amigo e nem tempo para cogitar das próprias necessidades espirituais.
Reclama longos dias para examinar pequenina questão, referente ao teu bem-estar; todavia, não lhe consagras nem mesmo uma hora por semana, ajudando-o a refletir…
Respondes, enfadado, quando o velho companheiro te pede alguns níqueis, mas não vacilas em despender pequenas fortunas com amigos ociosos, em noitadas alegres, nas quais te mergulhas em fantasioso contentamento.
Interrogas ingrato: – que fizeste do dinheiro que te dei? Esqueces que o servo de fronte enrugada não dispôs de tempo e recurso para calcular, com exatidão, os processos de ganhar além do necessário e não conseguiu ensejo de ilustrar o raciocínio com o refinamento que caracteriza o teu.
Ah! Meu filho, quando a impaciência te visita o espírito, recorda que o monstro da ira indesejável te bate à porta do coração. E quando a ele te entregas, imprevidente, tuas conquistas mais elevadas tremem nos alicerces.
Chego a desconhecer-te, porque a fúria dos elementos interiores te altera a individualidade aos meus olhos e eu não sei se passas a condição de criança ou de demônio!…
Se não podes conter, ainda, os movimentos impulsivos de sentimentos perturbadores chegados o instante do testemunho cala-te e espera…
A cólera nada edifica e nada restaura… Apenas semeia desconfiança e temor, ao redor de teus passos.
Não ameaces com a voz, nem te insurjas contra ninguém.
É provável que guardes alguma reclamação contra mim, teu pai, porque eu também sou ainda humano. No entanto, filho, acima de nós ambos permanece o Pai Supremo, e que seria de ti e de mim, se Deus, um dia, se encolerizasse contra nós?



Livro: Alvorada Cristã, Espírito Néio Lucio, Psicografia Francisco C. Xavier, Editora FEB.

segunda-feira, 11 de julho de 2016

DO JOVEM

DO JOVEM
Moderar as manifestações de excessivo entusiasmo, exercitando-se na ponderação quanto às lutas de cada dia, sem, contudo, deixar-se intoxicar pela circunspecção sistemática ou pela sombra do pessimismo.
O culto da temperança afasta o desequilíbrio.
Anotar a extensão das suas forças, consultando sempre os corações mais amadurecidos no aprendizado terrestre, sobre as diretrizes e os passos fundamentais da própria existência, prevenindo-se contra prováveis desvios.
Invigilância conservada, desastre certo.
Guardar persistência e uniformidade nas atitudes, sem dispersar possibilidades em múltiplas tarefas simultâneas, para que não fiquem apenas parcialmente executadas.
Inconstância e indisciplina são portas de frustração.
Abster-se do mergulho inconsciente nas atividades de caráter festivo, evitando, outrossim, o egoísmo doméstico que inspire a deserção do trabalho de ordem geral.
A imprudência constrói o desajuste, o desajuste cria o extremismo e o extremismo gera a perturbação.
Apagar intenções estranhas aos deveres de humanidade e ao aperfeiçoamento moral de si mesmo.
A insinceridade ilude, primeiramente, aquele que a promove.
Buscar infatigavelmente equilíbrio e discernimento na sublimação das próprias tendências, consolidando maturidade e observação no veículo físico, desde os primeiros dias da mocidade, com vistas à vida perene da alma.
Os compromissos assumidos pelo Espírito reencarnado têm começo no momento da concepção.
“Foge também aos desejos da mocidade; e segue a justiça, a fé, o amor e a paz com os que de coração puro, invocam o Senhor”. — Paulo. (II Timóteo 2:22)



Livro: Conduta Espírita,  Espírito Andre Luiz, Psicografia Waldo Vieira, Editora FEB.

domingo, 10 de julho de 2016

CONVITE AO BEM

CONVITE AO BEM

“Mas, quando fores convidado, vai.”
Jesus
Lucas, 14:10

Em todas as épocas, o bem constitui a fonte divina, suscetível de fornecermos valores imortais.
O homem de reflexão terá observado que todo o período infantil é conjunto de apelos ao sublime manancial.
O convite sagrado é repetido, anos a fio. Vem através dos amorosos pais humanos, dos mentores escolares, da leitura salutar, do sentimento religioso, dos amigos comuns.
Entretanto, raras inteligências atingem a juventude, de atenção fixa no chamamento elevado.
Quase toda gente ouve as requisições da natureza inferior, olvidando deveres preciosos.
Os apelos, todavia, continuam...
Aqui, é um livro amigo, revelando a verdade em silêncio; ali, é um companheiro generoso que insiste em favor das realidades luminosas da vida...
A rebeldia, porém, ainda mesmo em plena madureza do homem, costuma rir inconscientemente, passando, todavia, em marcha compulsória, na direção dos desencantos naturais, que lhe impõem mais equilibrados pensamentos.
No Evangelho de Jesus, o convite ao bem se reveste de claridades eternas.
Atendendo-o, poderemos seguir ao encontro de Nosso Pai, sem hesitações.
Se o clarim cristão já te alcançou os ouvidos, lhe aceita as clarinadas sem vacilar.
Não esperes pelo aguilhão da necessidade.
Sob a tormenta, é cada vez mais difícil a visão do porto.
A maioria dos nossos irmãos na Terra caminha para Deus, sob o ultimato das dores, mas não aguardes pelo açoite de sombras, quando podes seguir, calmamente, pelas estradas claras do amor.



Livro: Pão Nosso, Espírito Emanuel, Psicografia Francisco C. Xavier, Cap. 29, Editora FEB.

sábado, 9 de julho de 2016

O PERDÃO

O PERDÃO
As primeiras peregrinações do Cristo e de seus discípulos, em torno do lago, haviam alcançado inolvidáveis triunfos. Eram doentes atribulados que agradeciam o alívio buscado ansiosamente; trabalhadores humildes que se enchiam de santas consolações ante as promessas divinas da Boa Nova.
Aquelas atividades, entretanto, começaram a despertar a reação dos judeus rigoristas, que viam em Jesus um perigoso revolucionário. O amor que o profeta nazareno pregava vinha quebrar antigos princípios da lei judaica. Os senhores da terra observavam cuidadosamente as palestras dos escravos, que permutavam imenso júbilo, proveniente das esperanças num novo reino que não chegavam a compreender. Os mais egoístas pretendiam ver no profeta generoso um conspirador vulgar, que desejava levantar as iras populares contra a dominação de Herodes; outros presumiam na sua figura um feiticeiro incomum, que era preciso evitar.
Foi assim que a viagem do Mestre a Nazaré redundou numa excursão de grandes dificuldades, provocando de sua parte as observações quase amargas que se encontram no Evangelho, com respeito ao berço daqueles que o deveriam guardar no santuário do coração.
Não foram poucos os adversários de suas ideias renovadoras que o precederam na cidade minúscula, buscando neutralizar-lhe a ação por meio de falsas notícias e desmoralizá-lo, argumentando com informações mal alinhavadas de alguns nazarenos.
Jesus sentiu de perto a delicadeza a situação que se lhe criara com a primeira investida dos inimigos gratuitos de sua doutrina; mas, aproveitou todas as oportunidades para as melhores ilações na esfera do ensinamento.
No entanto, o mesmo não aconteceu a seus discípulos. Filipe e Simão Pedro chegaram a questionar seriamente com alguns senhores da região, trocando palavras ásperas, em torno das edificações do Messias. As gargalhadas irônicas, as apreciações menos dignas lhes acendiam no ânimo propósitos impulsivos de defesas apaixonadas. Não faltavam os que viam no Senhor um servo ativo do espírito do mal, um inimigo de Moisés, um assecla de príncipes desconhecidos, ou de traidores ao poder político de Antipas. Tamanhas foram as discussões em Nazaré, que os seus reflexos nocivos se faziam sentir fortemente sobre toda a comunidade dos discípulos. Pedro e André advogavam a causa o Mestre com expressões incisivas e sinceras. Tiago aborrecia-se com a análise dos companheiros. Levi protestava, expressando o desejo de instituir debates públicos, de maneira a evidenciar-se a superioridade dos ensinos do Messias, em confronto com os velhos textos.
Jesus compreendeu os acontecimentos e, calmamente, ordenou a retirada, afastando-se da cidade com tranquilo sorriso.
Não obstante a determinação e apesar do regresso a Cafarnaum, a maioria dos apóstolos prosseguiu em discussão, estranhando que o Mestre nada fizesse, reagindo contra as envenenadas insinuações a seu respeito.
***
Daí a alguns dias, obedecendo às circunstâncias ocorrentes naquela situação, Pedro e Filipe procuraram avistar-se com o Senhor, ansiosos pela claridade dos seus ensinos.
– Mestre; chamaram-vos servo de Satanás e reagimos prontamente! Dizia Pedro, com sinceridade ingênua.
– Observávamos que por vós mesmos nunca oporíeis a contradita – ajuntava Filipe, convicto de haver prestado excelente serviço ao Mestre bem-amado – e por isso revidamos aos ataques com a maior força de nossas expressões.
Não obstante o calor daquelas afirmativas, Jesus meditava com uma doce placidez no olhar profundo, enquanto os interlocutores o contemplavam, ansiando pela sua palavra de franqueza e de amor.
Afinal, saindo de suas reflexões silenciosas, o Mestre interrogou:
– Acaso poderemos colher uvas nos espinheiros? De modo algum me empenharia em Nazaré numa contradita estéril aos meus opositores. Contudo, procurei ensinar que a melhor réplica é sempre a do nosso próprio trabalho, do esforço útil que nos seja possível.
Nesse particular, não deixei de operar na minha esfera de ação, de modo a produzir resultados a nossa excursão à cidade vizinha, tornando-a proveitosa, sem desdenhar as palavras construtivas no instante oportuno. De que serviriam as longas discussões públicas, inçadas de doestos[1] e zombarias? Ao termo de todas elas, teríamos apenas menores probabilidades para o triunfo glorioso do amor e maiores motivos para a separatividade e odiosas dissensões. Só devemos dizer aquilo que o coração pode testificar mediante atos sinceros, porque, de outra forma, as afirmações são simples ruído sonoro de uma caixa vazia.
– Mestre – atalhou Filipe, quase com mágoa –, a verdade é que a maioria de quantos compareceu às pregações de Nazaré falava mal de vós!
– Mas, não será vaidade exigirmos que toda gente faça de nossa personalidade elevado conceito? – interrogou Jesus com energia e serenidade.
– Nas ilusões que as criaturas da Terra inventaram para a sua própria vida, nem sempre constitui bom atestado da nossa conduta o falarem todos bem de nós, indistintamente.
Agradar a todos é marchar pelo caminho largo, onde estão as mentiras da convenção. Servir a Deus é tarefa que deve estar acima de tudo e, por vezes, nesse serviço divino, é natural que desagrademos aos mesquinhos interesses humanos. Filipe sabe de algum emissário de Deus que fosse bem apreciado no seu tempo? Todos os portadores da verdade do céu são incompreendidos de seus contemporâneos. Portanto, é indispensável consideremos que o conceito justo é respeitável, mas, antes dele, necessitamos obter a aprovação legítima da consciência, dentro de nossa lealdade para com Deus.
– Mestre – obtemperou Simão Pedro, a quem as explicações da hora calavam profundamente –, nos acontecimentos mais fortes da vida, não deverá, então, utilizar as palavras enérgicas e justas?
– Em toda circunstância, convém naturalmente que se diga o necessário, porém, é também imprescindível que não se perca tempo.
Deixando transparecer que as elucidações não lhe satisfaziam plenamente, perguntou Filipe:
– Senhor, vossos esclarecimentos são indiscutíveis; entretanto, preciso acrescentar que alguns dos companheiros se revelaram insuportáveis nessa viagem a Nazaré: uns me acusaram de brigão e desordeiro; outros, de mau entendedor de vossos ensinamentos. Se os próprios irmãos da comunidade apresentam essas falhas, como há de ser o futuro do Evangelho?
O Mestre refletiu um momento e retrucou:
– Estas são perguntas que cada discípulo deve fazer a si mesmo. Mas, com respeito à comunidade, Filipe, pelo que me compete esclarecer, cumpre-me perguntar-te se já edificaste o reino de Deus no íntimo do teu espírito.
– É verdade que ainda não respondeu hesitante, o apóstolo.
– De dentro dessa realidade, podes observar que, se o nosso colégio fosse constituído de irmãos perfeitos, teria deixado de ser irrepreensível pela adesão de um amigo que ainda não houvesse conquistado a divina edificação.
Ambos os discípulos compreenderam e se puseram a meditar, enquanto o Cristo continuava:
– O que é indispensável é nunca perdermos de vista o nosso próprio trabalho, sabendo perdoar com verdadeira espontaneidade de coração. Se nos labores da vida um companheiro nos parece insuportável, é possível que também algumas vezes sejamos considerados assim. Temos que perdoar aos adversários, trabalhar pelo bem dos nossos inimigos, auxiliar o que zombam da nossa fé.
Nesse ponto de suas afirmativas, Pedro atalhou-o, dizendo:
– Mas, para perdoar não deveremos aguardar que o inimigo se arrependa? E que fazer na hipótese de o malfeitor assumir a atitude dos lobos sob a pele da ovelha?
– Pedro, o perdão não exclui a necessidade da vigilância, como o amor não prescinde da verdade. A paz é um patrimônio que cada coração está obrigado a defender, para bem trabalhar no serviço divino que lhe foi confiado. Se o nosso irmão se arrepende e procura o nosso auxílio fraterno, amparemo-lo com as energias que possamos despender; mas, em nenhuma circunstância cogites de saber se o teu irmão está arrependido. Esquece o mal e trabalha pelo bem. Quando ensinei que cada homem deve conciliar-se depressa com o adversário, busquei salientar que ninguém pode ir a Deus com um sentimento de odiosidade no coração. Não poderemos saber se o nosso adversário está disposto à conciliação; todavia, podemos garantir que nada se fará sem a nossa boa vontade e pleno esquecimento dos males recebidos. Se o irmão infeliz se arrepender, estejamos sempre dispostos a ampará-lo e, a todo o momento, precisamos e devemos olvidar o mal.
Foi quando, então, fez Simão Pedro a sua célebre pergunta:
– “Senhor, quanta vez pecará meu irmão contra mim, que lhe hei de perdoar”?
Será até sete vezes?”
Jesus respondeu-lhe, calmamente:
– Não te digo que até sete vezes, mas até setenta vezes sete.
***
Daí por diante, o Mestre sempre aproveitou as menores oportunidades para ensinar a necessidade do perdão recíproco, entre os homens, na obra sublime da redenção.
Acusado de feiticeiro, de servo de Satanás, de conspirador, Jesus demonstrou, em todas as ocasiões, o máximo de boa vontade para com os espíritos mais rasteiros de seu tempo. Sem desprezar a boa palavra, no instante oportuno, trabalhou a todas as horas pela vitória do amor, com o mais alto idealismo construtivo. E no dia inesquecível do Calvário, em frente dos seus perseguidores e verdugos, revelando aos homens ser indispensável a imediata conciliação entre o espírito e a harmonia da vida, foram estas as suas últimas palavras:
– “Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem!”.



Livro: Boa Nova, Psicografia Francisco C. Xavier, ditado pelo Espírito Irmão X (Humberto de Campos) , Ed FEB.
[2] Ação ou efeito de doestar (insultar); ação de acusar desonrosamente alguém; injúria ou insulto. http://www.dicio.com.br/doesto/